A Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro

A Brasiliana Fotográfica destaca fotografias da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro produzidas por Augusto Malta (1864 – 1957), Juan Gutierrez (c.1860 – 1897), Marc Ferrez (1843 – 1923), Revert Henrique Klumb (c.1826 – c. 1886) e S.H. Holland (1883 – 1936).

 

 

Acessando o link para as fotografias da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Apesar de haver discordâncias em torno do ano de sua fundação, os historiadores concordam que a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro foi criada em meados do século XVI e teve forte influência do padre José de Anchieta (1534 – 1597), que a teria fundado ou  ampliado. Em 1967, a data de fundação foi oficialmente fixada em 24 de março de 1582.

 

 

Permanece no mesmo endereço: rua de Santa Luzia, inicialmente nº 2 e, atualmente, nº 206. Era regida pela Santa Casa de Lisboa, criada, em fins do século XV, pelo frei espanhol Miguel de Contreiras (1431 – 1505) com o apoio da rainha Dona Leonor (1458 – 1525), esposa do rei João II de Portugal (1455 – 1495). Tinha como objetivos acolher os presos, alimentar os pobres, curar os doentes, asilar os órfãos, sustentar as viúvas, enfim, ser a casa a serviço dos mais carentes, desassistidos e abandonados.

 

 

Foi durante a gestão de José Clemente Pereira (1787 – 1854) como provedor da Santa Casa, entre 1838 a 1854, que foi construído o complexo atual – hospital e capela – que está na rua Santa Luzia, 206. Com a presença de dom Pedro II (1825 – 1891), a pedra fundamental foi lançada, em 2 de julho de 1840, e a construção foi iniciada no ano seguinte (Diário do Rio de Janeiro, 2 de julho de 1840, última coluna).

 

 

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O hospital foi inaugurado em  julho de 1852 e sua planta original, de autoria do engenheiro Domingos Monteiro (1765 – 1857), foi alterada por José Maria Jacinto Rebelo (1821 – 1871), discípulo do arquiteto Grandjean de Montigny (1776 – 1850). O frontão da Santa Casa da Misericórdia, talvez o mais grandioso do Rio de Janeiro, foi executado, em 1868, pelo artista Luigi Guidice (1826 – 1892).

 

 

Sobre a data de fundação:

“A Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro foi fundada em meados do século XVI, em data incerta, na praia de Santa Luzia no 2, atual rua de Santa Luzia no 206, onde permanece até hoje. A sua criação costuma ser atribuída por vários estudiosos ao padre José Anchieta, da Companhia de Jesus, que chegara ao Brasil na esquadra do segundo governador-geral, Duarte da Costa, em 1553. Em março de 1582, Anchieta teria acudido a esquadra espanhola comandada pelo almirante Diogo Flores Valdez com destino ao Estreito de Magalhães, que aportara no Rio de Janeiro devido a enfermidades que acometeram sua tripulação. Providenciando agasalhos e remédios, o jesuíta, para abrigar os enfermos, mandara construir um barracão de palma coberto de sapé na orla marítima do morro do Castelo, que teria dado origem à Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro e, possivelmente, ao primeiro hospital da cidade.

Houve outros estudos, contudo, que consideraram a data de fundação da Santa Casa anterior a 1582. Segundo o historiador Félix Ferreira (1899), a instituição teria sido criada em 1545 ou 1547, antes da fundação da cidade do Rio de Janeiro (1565), coincidindo com os primeiros núcleos de povoamento das margens da Baía de Guanabara. No período da União Ibérica (1580-1640), em alvará datado de 6 de outubro de 1605, o rei Dom Felipe II de Espanha e I de Portugal concedia à entidade os mesmos benefícios desfrutados pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, em vista do que alegavam seu provedor e irmãos de que já havia sessenta anos que “existia casa com hospital para enfermos, sacristia, parlatório e é uma das boas da costa, e a algumas faz vantagem notável com sempre ter sua irmandade guardado o Compromisso, fazendo muitas esmolas, casando órfãs e dando ordinárias todos os sábados, conforme a possibilidade da terra”.

Já para Gabriel Soares de Sousa no “Tratado descritivo do Brasil”, em 1587, o hospital junto ao morro do Castelo teria sido iniciativa do terceiro governador-geral, Mem de Sá, com o apoio do padre da Companhia de Jesus, Manuel da Nóbrega. Em 1567, Mem de Sá em curta visita e permanência no Rio de Janeiro, depois da expulsão dos franceses, tratou não só do povoamento da cidade instalada por seu sobrinho, Estácio de Sá, em 1565, como promoveu importantes melhoramentos, entre os quais a construção de algumas igrejas com a sua Santa Casa da Misericórdia e hospital.

Ainda sobre a data de criação da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, José Vieira Fazenda (1902) procurou conciliar as opiniões divergentes, admitindo que os primeiros povoadores tenham sido os fundadores da Misericórdia e que os irmãos desta, animados e auxiliados pelo jesuíta José de Anchieta, tenham edificado o hospital em 1582, com o propósito de nele abrigar os doentes da armada espanhola. De uma forma ou de outra, todos os que discorreram sobre o tema, concordaram que a Santa Casa surgiu ou foi ampliada nesta data, por influência de José de Anchieta.”

Site da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro

 

 

Sobre arquitetura e tombamento:

O Hospital da Santa Casa de Misericórdia foi construído no séc. XVI no Morro do Castelo.

IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
Nome atribuído: Hospital da Santa Casa de Misericórdia: prédio
Localização: R. Santa Luzia, nº 206, Centro – Rio de Janeiro – RJ
Número do Processo: 10-T-1938
Livro do Tombo Belas Artes: Inscr. nº 174, de 15/07/1938
Descrição: A cidade do Rio de Janeiro foi fundada em 1565 entre os Morros Cara de Cão e Pão de Açúcar e transferida para o antigo Morro do Castelo no ano de 1567. A Santa Casa de Misericórdia foi construída no século XVI na parte baixa, próxima ao mar e junto a uma das ladeiras que subiam para o seu cume, no mesmo local onde hoje ainda se encontra, como último vestígio do morro do Castelo. Não se sabe ao certo a data da sua construção, mas em 1582 os doentes da esquadra do Diogo Valdez foram nela acolhidos. No ano de 1734, um terceiro pavimento foi acrescentado.
Após a transferência do cemitério que existia junto à Santa Casa para o Caju, um novo prédio foi erguido para servir de hospital. A construção foi iniciada em 1840 e no ano de 1852 já estava funcionando. Seu projeto inicial, atribuído ao Tenente Coronel de Engenharia Domingos Monteiro, é, no entanto, discutido em função das alterações realizadas na fachada durante a construção pelo Arquiteto José Maria Jacinto Rabelo.
A fachada é caracterizada por linhas classicizantes. O pórtico central é composto, segundo o Arquiteto Augusto Silva Telles, por “um corpo com dupla colunata de cantaria, encimado por frontão, ornamentado com baixo relevos feitos por Luís Giudice.” No frontão do prédio, destacam-se o símbolo da Misericórdia ao centro, ladeado à esquerda pelos símbolos da Cristandade, e à direita, pelo da Medicina. A construção se divide em três alas paralelas, separadas por pátios e ligados entre si por um corpo transversal. Nas alas paralelas localizam-se as enfermarias.
No hospital, além das extensas barras de azulejos holandeses, encontrados nos corredores de circulação e nas escadas, é notável a imensa galeria de retratos dos benfeitores, na qual se destacam grande número de telas setecentistas das mais antigas do acervo carioca. O seu interior abriga uma capela, cujo projeto é atribuído ao Arquiteto Joaquim Cândido Guilhobel e decorada com trabalhos de talha de Antônio de Pádua e Castro.
Observações: O tombamento compreende as antigas enfermarias. No hospital foi instalado o Museu da Farmácia.
Fonte: Iphan.

INEPAC – Instituto Estadual do Patrimônio Cultural
Nome atribuído: Hospital Geral da Santa Casa da Misericórdia
Localização: R. Santa Luzia, nº 206, Centro – Rio de Janeiro – RJ
Número do Processo: E-18/001/549/2015
Tombamento Provisório: 25/05/2015
Inventário Inepac
Descrição: O Complexo Hospitalar da Santa Casa da Misericórdia situa-se no Centro da Cidade do Rio de Janeiro, nas proximidades de outros bens tombados pelo Estado do Rio de Janeiro: Ladeira da Misericórdia, Museu da Imagem e do Som e Prédio do Tribunal Regional do Trabalho. Originalmente, a Misericórdia se situava ao sopé do antigo Morro do Descanso, depois denominado Morro do Castelo, no local onde hoje se encontram as antigas enfermarias e a Igreja de Nossa Senhora de Bonsucesso, na Ladeira da Misericórdia. O prédio principal do Hospital Geral se destaca na paisagem por sua imponência de gosto neoclássico, com frontão triangular, onde está inserido o brasão da Ordem da Irmandade da Misericórdia. Voltado para a Rua Santa Luzia, este complexo, que ocupa quase a totalidade da quadra, se estende até a Rua Marechal Aguinaldo Caiado de Castro. Ladeando o prédio da Santa Casa, ainda se encontra um casario baixo que preserva sua imponência.
Fonte: Inepac.

 Site I Patrimônio

 

Uma curiosidade: em seu romance, A Viuvinha, de 1857, José de Alencar (1829 – 1877), comenta sobre o grande numero de suicídios ocorridos durante a construção da Santa Casa da Misericórdia:

“O Rio de Janeiro ainda se lembra da triste celebridade que, há dez anos, tinha adquirido o lugar onde está hoje construído o Hospital da Santa Casa. Houve um período em que quase todas as manhãs os operários encontravam em algum barranco, ou entre os cômoros de pedra e de areia, o cadáver de um homem que acabara de pôr termo à sua existência. 

Amantes infelizes, negociantes desgraçados, pais de família carregados de dívidas, homens ricos caídos na miséria, quase todos aí vinham, trazidos por um ímã irresistível, por uma fascinação diabólica. 

As Obras da Misericórdia, como chamavam então esse lugar, tinham a mesma reputação que o Arco das Águas Livres, de Lisboa, e a Ponte Nova, de Paris. 

Era o templo do suicídio, onde a fragilidade humana sacrificava em holocausto a esse ídolo sanguinário tantas vítimas arrancadas às suas famílias e aos seus amigos.

Essa epidemia moral, que se agravava todos os dias, começava já a inquietar alguns espíritos refletidos, alguns homens pensadores, que viam com tristeza os progressos do mal”. 

 

 

Link para o artigo O Hospital Geral da Misericórdia, de Escragnolle Dória, publicado na Revista da Semana, de 26 de novembro de 1938.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

 

CAMPOS, Ernesto de Souza. Santa Casa de Misericórdia de Santos: primeiro hospital fundado no Brasil; sua origem e evolução 1543-1943. São Paulo: Elvino Pocai, 1943

Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832 – 1930) Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

I Patrimônio

Site Alma Carioca

Site Missão das Misericórdias

Site O Rio que o rio não vê

Site Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro

Série “O Rio de Janeiro desaparecido” XIV – O Conselho Municipal do Rio de Janeiro

No 14º artigo da Série O Rio de Janeiro desaparecido, o tema é o Conselho Municipal do Rio de Janeiro, fotografado pelo alagoano Augusto Malta, em torno de 1904, em seus primeiros anos como fotógrafo oficial da Prefeitura do Rio de Janeiro, cargo que ocupou de 1903 a 1936. Localizava-se na Praça Ferreira Viana, no antigo Largo da Mãe do Bispo, hoje Praça Floriano, no centro da cidade.

 

 

O prédio, cuja pedra fundamental foi lançada, em 22 de maio de 1871, abrigou o Colégio São José e, a partir de 1895, o Conselho Municipal do Rio de Janeiro. Durante a reforma urbana empreendida pelo prefeito Francisco Pereira Passos (1836 – 1913), entre 1903 e 1906,  parte da imprensa, homens públicos e especialistas em saúde e tecnologia pressionaram o governo no sentido de condenar a arquitetura de citação portuguesa ou que viesse do período colonial. Mas o prefeito decidiu manter o prédio do Conselho Municipal, que tinha esse perfil, e, a seu lado, erguer o Teatro Municipal do Rio de Janeiro, inaugurado em 14 de julho de 1909. Segundo André Nunes de Azevedo, Pereira Passos propunha, dessa forma, um futuro que encarava o passado sem temor, sem desejo de superá-lo, de vencê-lo, mas como parte dele.

Em 1918, o edifício foi demolido para dar lugar ao prédio atual, denominado Palácio Pedro Ernesto, inaugurado em 1923, onde funciona a Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Foi projetado por Heitor de Mello (1875 – 1920), porém ele faleceu em 14 de setembro de 1920. Na época, seu sócio era o franco-suíço Francique Cuchet (18? – 19?). Com sua morte, o arquiteto cearense Archimedes Memória (1893 – 1960) e Cuchet estabeleceram contrato de sociedade em partes iguais do “Escriptorio Technico Heitor de Mello – A. Memória & F. Couchet, architectos. Foram  eles que deram continuidade ao projeto do Palácio Pedro Ernesto, iniciado por Heitor de Mello (Vida Doméstica, 21 de julho de 1923).

 

 

Na edição de O Cruzeiro, de 9 de setembro de 1950, foi publicada a matéria Biografia da cidade – Do Convento da Ajuda às luzes da Cinelândia , com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta (1864 – 1957) e do importante fotojornalista Luciano Carneiro (1926 – 1959). Contava a história da Cinelândia e as fotos antigas que ilustraram a reportagem foram produzidas por Malta, em 1911. Uma delas, abaixo reproduzida, é um registro do Conselho Municipal. Lembramos que o Convento da Ajuda foi o tema do 13º artigo da série O Rio de Janeiro desaparecido, publicado em 19 de outubro de 2021.

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

AZEVEDO, André Nunes de. A grande reforma urbana do Rio de Janeiro: Rodrigues Alves, Pereira Passos e as ideias de civilização e progresso. Rio de Janeiro ; Ed PUC, 2016.

Diário do Rio

Dunlop, Charles Julius. Legislativo Municipal in Rio Antigo. 3ª Tiragem ed. Rio de Janeiro: Editora Rio Antigo, 1963. (Composto e impresso na Gráfica Laemmert, Ltda.).

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

Wikilivros

 

Links para os outros artigos da Série O Rio de Janeiro desaparecido

 

Série O Rio de Janeiro desaparecido I Salas de cinema do Rio de Janeiro do início do século XXde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de fevereiro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido II – A Exposição Nacional de 1908 na Coleção Família Passos, de autoria de Carla Costa, historiadora do Museu da República, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 5 de abril de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido III – O Palácio Monroe, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 9 de novembro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IV - A via elevada da Perimetral, de autoria da historiadora Beatriz Kushnir, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2017.

Série O Rio de Janeiro desaparecido V – O quiosque Chopp Berrante no Passeio Público, Ferrez, Malta e Charles Dunlopde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de julho de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VI – O primeiro Palácio da Prefeitura Municipal do Rio de Janeirode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de setembro de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VII – O Morro de Santo Antônio na Casa de Oswaldo Cruzde autoria de historiador Ricardo Augusto dos Santos da Casa de Oswaldo Cruzpublicado na Brasiliana Fotográfica em 5 de fevereiro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VIII – A demolição do Morro do Castelode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 30 de abril de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IX – Estrada de Ferro Central do Brasil: estação e trilhosde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de novembro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido X – No Dia dos Namorados, um pouco da história do Pavilhão Mourisco em Botafogode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de junho de 2020.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XI – A Estrada de Ferro do Corcovado e o mirante Chapéu de Sol, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 22 de julho de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XII – o Teatro Lírico (Theatro Lyrico), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 15 de setembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIII – O Convento da Ajuda, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de outubro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XV – A Praia de Santa Luzia no primeiro dia do verão, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 21 de dezembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVI – O prédio da Academia Imperial de Belas Artes, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, publicado na Brasiliana Fotográfica em 13 de janeiro de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVII – Igreja São Pedro dos Clérigos, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 18 de março de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVIII – A Praça Onze, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de abril de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIX – A Igrejinha de Copacabana, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XX – O Pavilhão dos Estados, futuro prédio do Ministério da Agricultura, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de julho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXI – O Chafariz do Largo da Carioca, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 19 de setembro de 2022. 

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXII – A Cadeia Velha que deu lugar ao Palácio Tiradentes, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 11 de abril de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIII e Avenidas e ruas do Brasil XVII - A Praia e a Rua do Russel, na Glória, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 15 de maio de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIV – O luxuoso Palace Hotel, na Avenida Rio Branco, uma referência da vanguarda artística no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 4 de julho de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXV – O Theatro Phenix, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 5 de setembro de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXVI – Conclusão do arrasamento do Morro do Castelo por Augusto Malta, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 14 de dezembro de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXVII e Série Os arquitetos do Rio de Janeiro V – O Jockey Club e o Derby Club, na Avenida Rio Branco e o arquiteto Heitor de Mello (1875 – 1920), de autoria de Andrea c. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, em 15 de janeiro de 2024

Os 90 anos do Cristo Redentor, um dos mais importantes símbolos e pontos turísticos do Rio de Janeiro e do Brasil

Samba do avião

 

Cantado em prosa e verso, o Cristo Redentor completa, no próximo dia 12 de outubro, 90 anos e confunde-se com a própria identidade dos cariocas, aliás, dos brasileiros. É um dos mais importantes símbolos e pontos turísticos do Rio de Janeiro e do país, além de ser também um dos maiores e mais famosos monumentos em estilo art déco do mundo. A Brasiliana Fotográfica comemora o ícone nonagenário que, de certa forma, confirma a beleza e a vocação exibicionista do Rio de Janeiro, com a republicação de um artigo sobre ele, porém com mais informações e novas imagens. Quando o primeiro artigo sobre a inauguração do Cristo Redentor foi publicado, em 12 de outubro de 2015, o acervo fotográfico do portal possuia seis registros do monumento – um de autoria de Augusto Malta (1864 – 1957) e um de S. H. Holland (1883 – 1936), ambas do acervo do Instituto Moreira Salles (IMS); e quatro da LTM Firma, do acervo da Fundação Biblioteca Nacional (FBN).

O IMS e a FBN são as instituições fundadoras da Brasiliana Fotográfica e, até abril de 2016, as únicas representadas no acervo fotográfico do portal. Em 2021, o portal já conta com a parceria de mais nove instituições: o Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, o Arquivo Nacional, a Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha, a Fiocruz, a Fundação Joaquim Nabuco, o Leibniz-Institut fuer Laenderkunde, Leipzig; o Museu Aeroespacial, o Museu da República e o Museu Histórico Nacional.

 

Acessando o link para as fotografias do Cristo Redentor disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.  

 

Hoje a Brasiliana Fotográfica  traz para seus leitores, além das seis imagens publicadas em 2015, mais 17 fotografias do Cristo Redentor ou produzidas a partir dele: uma da Escola de Aviação Militar, uma de Mario Lucarell, sete do húngaro Alfredo Krausz (1902 – 1953), duas de fotógrafos ainda não identificados do Acervo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, e duas também realizadas por fotógrafos ainda não conhecidos, que pertencem à Coleção Sebastião Lacerda, sob a guarda do Instituto Moreira Salles; mais uma da LTM Firma e três estereoscopias de autoria do fotógrafo amador Guilherme Santos (1871 – 1966). Usem a ferramenta zoom e façam um passeio pelas imagens! Além dessas fotos, destacamos registros belíssimos publicados em revistas na época da inauguração da estátua.

 

 

 

 

Link para a música Alma Carioca, especialmente composta por Moacyr Luz para a celebração dos 90 anos do Cristo Redentor.

 

 

Localizado no Morro do Corcovado – os morros do Pão de Açúcar e o Morro de Santo Antônio foram cogitados para abrigá-lo – o Cristo Redentor fica a 710 metros de altitude, e a estátua tem 38 metros de altura, pesando 1.145 toneladas. Foi inaugurado, num dia chuvoso, pelo presidente Getulio Vargas (1882-1954) e por Pedro Ernesto (1884-1942), interventor do Distrito Federal. Várias celebrações ocorreram para marcar o acontecimento (Diário de Notícias, 13 de outubro de 1931O Cruzeiro, 17 de outubro de 1931; Excelsior, novembro de 1931).

 

 

 

Na edição da Fon-Fon, de 17 de outubro de 1931, que trouxe uma ampla cobertura das festividades da inauguração do Cristo Redentor com diversas e lindas fotos, publicação do poema Cristo Redentor do Corcovado, de autoria do alagoano Jorge de Lima (1893 – 1853).

 

 

 

 

Mas foi no século XIX, que o padre lazarista francês Pietre-Marie (Pedro Maria) Bos (c.1834-1916), capelão do Colégio Imaculada Conceição, em Botafogo, que chegou ao Rio de Janeiro em torno de 1859, teve a ideia de erigir na capital do Império do Brasil um monumento que exaltasse a fé cristã (A União, 30 de janeiro de 1916, quinta coluna). O padre Boss deixou a ideia registrada no prefácio do livro Imitação de Cristo, edição de 1903:

“O Corcovado! Lá se ergue o gigante de pedra alcantilado, altaneiro e triste, como interrogando o horizonte imenso… quando virá? Há tantos séculos espero. Sim, aqui está o pedestal único no mundo; quando vem a estátua colossal, imagem de quem me fez? Ai, Brasil amado! Acorda depressa, levanta naquele cume sublime a imagem de Jesus Salvador! Nem todos, por causas diversas, lerão o Livro, ao passo que em todas as línguas e linguagens a imagem dirá ao grande e ao pequeno, ao sábio e ao analfabeto…’”

 

 

Ainda no século XIX, pouco depois da princesa Isabel (1846 – 1921) ter assinado a Lei Áurea, que aboliu a escravidão no Brasil, em 13 de maio de 1888, um grupo de abolicionistas queria homenageá-la com uma estátua no alto do Morro do Corcovado. Ela declinou, em um documento de 2 de agosto de 1888:

“Manda Sua Alteza a Princesa Imperial Regente em Nome de Sua Magestade o Imperador agradecer a oferta da Commição Organizadora constituída da Sociedade Brazileira de Beneficência de Paris, da Cia. Estrada de Ferro do Cosme Velho ao Corcovado e do Jornal O Paiz, para erguer huma estátua em sua honra pela extinção da escravidão no Brasil, e faz mudar a dita homenagem e o projecto, pelo officio de 22 de julho do corrente anno, por huma estátua do Sagrado Coração de Nosso Senhor Jezus Christo, verdadeiro redentor dos homens, que se fará erguer no alto do morro do Corcovado”.

 

 

Os viscondes de Mauá, Irineu Evangelisa de Souza  (1813 – 1889), e de Santa Vitória, Manuel Afonso de Freitas Amorim (1831 – 1906), viajaram a Paris encomendando o projeto e a execução de uma estátua de bronze do Sagrado Coração de Jesus, com 15 metros de altura, mas o monumento nunca foi construído.

 

 

Voltando ao século XX. Em 1917, o engenheiro Eduardo Limoeiro, presidente da recém criada Associação Auxiliar dos Engenheiros e Industriais, sugeriu, como parte das comemorações do centenário da independência do Brasil, que ocorreria em 1922, a edificação de um monumento em forma de esfera, sobre o qual se elevaria uma grande cruz, homenageando Jesus Cristo, no alto do Morro de Santo Antônio. O projeto era do engenheiro Alberto Pacca, mas a ideia não foi em frente (Jornal do Brasil, 21 de setembro de 1917, segunda coluna).

Em 24 de fevereiro de 1921, numa sessão solene da Ação Social Nacionalista, presidida pelo Conde Afonso Celso (1860 -1938), o general Pedro Carolino Pinto de Almeida (1856 – 1922) sugeriu que fosse construido um monumento do Cristo Redentor para a comemoração do centenário da independência do Brasil. Em 20 de março de 1921, no Círculo Católico, foi realizada a primeira assembleia para estudar o projeto, cuja iniciativa foi aprovada pelo cardeal Arcoverde (1850 – 1930). Na ocasião, a ideia era que o monumento fosse de bronze e erigido no cume do Pão de Açúcar (Correio de Manhã, 21 de março de 1921, primeira coluna). Em 24 de abril, ocorreu outra reunião (O Jornal, 25 de abril de 1922, penúltima coluna) e, pela primeira vez, em 3 de maio, a comissão técnica do empreendimento, presidida pelo almirante José Carlos de Carvalho (1847 – 1934), se reuniu (Jornal do Brasil, 7 de maio de 1921, quinta coluna). O arquiteto Heitor da Silva Costa (1873-1947), José Agostinho dos Reis(18? – 19?) e Adolfo Morales de Los Rios (1858 – 1928), cujos projetos concorreram para a construção do monumento, participavam da comissão.

Um abaixo-assinado organizado pela escritora Laurita Lacerda solicitava ao presidente Epitácio Pessoa (1865 – 1942) que a estátua do Cristo Redentor fosse construída. A iniciativa foi uma reação ao despacho do ministro da Fazenda, Homero Baptista (1861-1924), que havia negado a licença necessária para a construção do monumento. O documento foi entregue, com cerca de 30 mil nomes, ao presidente, em uma audiência, no Palácio Rio Negro, em Petrópolis, em 18 de fevereiro de 1922 (O Paiz, 11 de novembro de 1921, quinta colunaRevista da Semana, 12 de novembro de 1921, última coluna; O Jornal, 19 de fevereiro de 1922, última coluna).

 

 

Houve manifestações de igrejas protestantes e de outras religiões contrárias ao apoio do governo à construção do monumento, um símbolo católico, já que o Estado era laico. Por exemplo, seguidores da igreja Batista declararam, em nota publicada em O Jornal Batista, órgão oficial da Convenção Batista Brasileira, em 22 de março de 1923, que a construção “será, a um tempo, um atestado eloquente de idolatria da igreja de Roma“.

Epitácio justificou a permissão por ter sido requerida em primeiro lugar: se um representante de qualquer outra religião tivesse solicitado algo semelhante antes, a ele teria sido dada igualmente a autorização. A decisão para a construção do monumento no Morro do Corcovado foi concedida em 1º de junho de 1922 por Homero Baptista, ministro da Fazenda (O Paiz, 2 de junho de 1922, terceira coluna).

Em setembro de 1922, foi realizada uma cerimônia no local onde o Cristo seria construído, com a presença de várias autoridades (O Paiz, 12 de setembro de 1922, terceira coluna) e, em 4 de outubro, foi lançada a pedra fundamental da obra (O Paiz, 5 de outubro de 1922). No ano seguinte, teve início uma grande campanha de arrecadação de recursos para a construção do monumento, sob a coordenação de dom Sebastião Leme (1882 – 1942), o cardeal do Rio de Janeiro. Em setembro de 1923, as comissões já estavam formadas e O Paiz publicou uma extensa matéria sobre a realização de uma semana de coleta de doações para a construção do monumento que, aliás, foi totalmente construído a partir de doações populares. Uma curiosidade: na época com sete anos, o futuro atleta e presidente da Fifa, João Havelange (1916 – 2016), ajudou a arrecadar dinheiro para a construção do Cristo durante a semana do monumento (O Paiz, 16 de março de 1923, sexta colunaO Paiz, 2 de setembro de 1923).

 

 

Em 21 de setembro de 1923, o Jornal do Brasil publicou uma matéria noticiando que, em 22 maio de 1923, o projeto do engenheiro Heitor da Silva Costa (1873-1947) para o monumento havia sido escolhido em assembleia geral da Comissão Executiva do Monumento Nacional ao Cristo Redentor, com a presença do monsenhor Macedo Costa, representando o cardeal Arcoverde, e de Cesario Alvim, representando o ministro da Viação. Os outros concorrentes foram José Agostinho dos Reis e Adolfo Morales de Los Rios. A reportagem também contou toda a história do empreendimento. A principal inspiração para o projeto de Silva Costa foi a estátua de São Carlos Borromeu, construída no século XVII, que ele havia examinado, em Arona, na Itália, durante uma viagem de estudos, em 1912 (Jornal do Commercio, 27 de julho de 1930).

 

 

 

 

A mobilização popular em torno da construção do Cristo foi grande e um filme sobre o assunto, “O monumento do Christo Redemptor”, uma produção da Botelho Film, foi exibido no cinema Odeon (Revista da Semana, 8 de setembro de 1923O Paiz, 16 de outubro de 1923, na quinta coluna sob o título “Cinemas e fitas”).

A concepção inicial para o monumento foi modificada: no projeto original, a figura de Jesus Cristo empunharia em sua mão direita um globo e na esquerda uma cruz. 

 

 

O responsável pelo desenho final do monumento, a figura de Cristo com os braços estendidos, com o corpo na vertical e disposto sobre o Corcovado que, olhado à distância por qualquer ângulo é visto como uma cruz plantada no granito, foi o italiano Carlos Oswald (1882 – 1971), na época professor de gravura e desenho do Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro, e grande amigo de Silva Costa.

 

 

 

 

Com os croquis de Oswald e suas convicções sobre o monumento a ser construído, Silva Costa foi para a Europa , em 1924 (Eu sei tudo, janeiro 1924). Esteve na Alemanha, na Itália e na França. Para colaborar no trabalho, escolheu um especialista em estatuária, o artista francês, de origem polonesa, Paul Landowsky (1875-1961), e o engenheiro francês Albert Caquot (1881 – 1976), mestre em cálculos estruturais. Silva Costa, em texto publicado em O Cruzeiro, de 10 de outubro de 1931, justificou a escolha por Landowsky.

 

 

 

 

As duas mais famosas obras parisienses de Landowsky são a estátua de Sainte Geneviève, na Ponte de Tournelle, e a fonte da Porte de Saint-Cloud. 

 

 

 

 

Colaborador de Landowsky, o escultor italiano Lelio Landucci (? – 1954) participou do processo da evolução do projeto do Cristo. Landucci veio morar no Brasil e foi o autor do primeiro livro sobre o pintor Cândido Portinari (1903 – 1962) (Diário Carioca, 1º de outubro de 1954, terceira coluna).

 

 

A obra de instalação do Cristo Redentor começou em 1926. De execução considerada complicadíssima, durou cinco anos. As peças foram transportadas de trem, pois ainda não havia estrada de rodagem até o Corcovado, só inaugurada, em 1936. Além disso, os depósitos de material, maquinário e os barracões para abrigar o pessoal envolvido na obra ficavam em um platô bem abaixo do cume, ocupado pelos andaimes. Pela primeira vez uma estátua era construída como um monumento arquitetônico e não simplesmente como uma escultura.

Silva Costa, após passar 14 meses na Europa, chegou ao Brasil trazendo uma maquete e algumas peças do monumento (Lar Catholico, 14 de agosto de 1927, primeira coluna). Um documento, datado de 14 de fevereiro de 1925, assinado por Landowsky, delegava a Silva Costa e à comissão do monumento plenos poderes para conceder as necessárias autorizações para as reproduções da imagem da maquete desse monumento.

 

 

Uma exposição com os modelos de gesso das mãos do Cristo, modeladas por Landowsky, foi realizada no Corcovado (Diário Carioca, 24 de janeiro de 1929, sexta coluna). Reza a lenda que teria usado as mãos da poetisa, atriz e declamadora Margarida Lopes de Almeida (1896 – 1979) como modelos para as mãos da estátua. Ela sempre confirmou essa história mas perto de morrer a desmentiu, deixando uma dúvida quanto a sua veracidade.

 

 

A cabeça do Cristo foi executada pelo escultor romeno Gheorghe Leonida (1892/1893 – 1942), que estudava em Paris. O molde de gesso foi recortado em 50 partes e foi remontado e concretado no sítio do arquiteto italiano Heitor Levy, em São Gonçalo (Diário da Noite, 22 de abril de 1931, última coluna). As únicas coisas que foram construídas na França foram justamente os moldes da cabeça e das mãos, porém em gesso, em tamanho natural, que foram recortadas, trazidas ao Brasil e aqui reconstruídas em concreto armado.

 

 

 

O braço direito de Heitor da Silva, Heitor Levy, de credo judaico, que quase morreu em um acidente nos aidaimes do monumento, converteu-se ao catolicismo. Teria escrito os nomes de sua família num pergaminho guardado dentro do coração interno da estátua do Cristo Redentor.

 

 

 

As obras foram visitadas por autoridades, guiadas pelo engenheiro Heitor da Silva Costa e o monsenhor Gonzaga do Carmo foi fotografado ao lado de dedos da mão da escultura (Correio da Manhã, de 29 de junho de 1929).

 

 

A convite da Sociedade Brasileira de Engenheiro, Costa Silva proferiu uma conferência sobre os trabalhos da construção do monumento, quando palestrou sobre sua história, a observação de outros monumentos, a escolha de Landowsky, a filosofia pitagoriana e a divina geometria, a técnica utilizada e finalmente, a compara com a Estátua da Liberdade, inaugurada em 1886, em Nova York – um presente da França aos Estados Unidos, cujo projeto foi do escultor francês Frédéric Auguste Bartholdi (1834 – 1904) (Jornal do Commercio, 27 de julho de 1930, primeira coluna).

 

 

 

Foi publicada uma notícia sobre a construção do Cristo Redentor no Rio de Janeiro e de um nos Alpes, na revista A Semana, de 25 de abril de 1931, com a publicação de uma fotografia da estátua alpina e de quatro do Cristo Redentor carioca: de sua construção, de uma de suas mãos, de um de seus olhos e de sua cabeça.

 

 

A estrutura do monumento é formada por quatro pilares e 12 andares em concreto armado, o que não era muito comum na época de sua construção. Era uma técnica relativamente recente, patenteada, em 1892, pelo engenheiro francês François Hennebique (1842 – 1921).

“O Cristo, com evidente propósito figurativo, foi provavelmente a primeira obra escultórica do mundo a utilizar o concreto como material de base. O diálogo entre forma e estrutura, em concreto, aí presente, pautaria, anos depois, em outtras nuances mais próprias à arquitetura, boa parte da produção modernista brasileira”.(1)

Com exceção das mãos, a estrutura da estátua é oca, o que possibilita o acesso interno através de uma escadaria metálica. O Cristo Redentor tem um coração, localizado no oitavo andar, e, em sua cabeça e braços, encontram-se para-raios. A superfície externa foi revestida com pedras-sabão, coladas por senhoras da sociedade carioca.

 

 

 

No dia da inauguração, foi o físico Guglielmo Marconi (1874-1937), inventor do telégrafo, que, da Itália, ligou os refletores da estátua. Assis Chateaubriand, diretor dos Diários Associados, enviou um telegrama a ele dizendo: “No instante em que iluminais o monumento de Jesus Cristo, os católicos brasileiros saúdam em vós a faísca do gênio latino que descobriu e construiu o novo mundo” ( O Cruzeiro, 17 de outubro de 1931).

 

 

Segundo o site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan, “o sistema não funcionou como o esperado, mas o Cristo foi iluminado graças à habilidade do engenheiro Gustavo Corção e sua equipe, atribui-se a Rinaldo Franco o ato de ter acionado o interruptor responsável pela iluminação”.

 

 

 

 

Em 1973, o conjunto paisagístico do monumento foi tombado pelo Iphan – Instituto do Patrimônio Histórico Nacional.

O carro abre-alas da Escola de Samba Beija-Flor de Nilópolis, cujo samba-enredo de 1989 era Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia, traria uma reprodução do Cristo Redentor vestido como um mendigo, mas a Arquidiocese do Rio de Janeiro conseguiu uma ordem judicial proibindo a apresentação da alegoria. O carnavalesco Joãosinho Trinta (1933 – 2011) cobriu a alegoria com um plástico preto e acrescentou uma faixa com a frase “mesmo proibido, olhai por nós“.

Em 1990, a estátua foi restaurada e, em 7 de julho de 2007, o Cristo Redentor foi eleito uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno (Jornal do Brasil, 8 de julho de 2007). Ficou em terceiro lugar, atrás da Muralha da China e da Cidade de Petra, na Jordânia.

 

 

O resultado foi divulgado pela empresa suíça promotora do concurso, a Fundação New  7 Wonders e o título foi recebido pelo técnico de futebol Luiz Felipe Scolari (1948 -) e pelo embaixador do Brasil em Portugal, Celso de Souza, no Estádio da Luz, sede do clube Benfica, em Lisboa, Portugal.

 

 

Em 2008, a bisneta de Heitor da Silva Costa, Bel Noronha, lançou o documentário De Braços abertos, sobre a história do Cristo Redentor.

 

 

Em 30 de setembro do mesmo ano, o Cristo Redentor foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan – por sua importância histórica (Portal Iphan). Em 1º de março de 2011, aniversário da cidade do Rio de Janeiro, foi inaugurada uma nova iluminação no monumento com 300 projetores de LED de última geração que deram mais cor à estátua do Cristo Redentor, com um consumo de energia bem menor, e com a possibilidade de criar diferentes efeitos e cores.

 

O Globo, 1º de março de 2011

O Globo, 1º de março de 2011

 

Desde sua inauguração, o Cristo Redentor já recebeu diversas visitas de personalidades importantes no cenário internacional como o cientista Albert Einstein (1879 – 1955), o cantor Michael Jackson (1958 – 2009), o papa João Paulo II (1920 – 2005), o Dalai Lama (1935-), a Princesa Diana (1961 – 1997), o príncipe Charles (1948-) e o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama (1961-), com sua família. Algumas pessoas que já subiram na cabeça da estátua foram a jornalista Glória Maria (1949-), a atriz Ingrid Guimarães (1972-), a apresentadora de televisão Patrícia Abravanel (1977-), o comediante Renato Aragão (1935-), a atriz Tatá Werneck (1983-) e a bisneta de Heitor Silva Costa, Bel Noronha.

 

 

Corcovado

João Gilberto 

Um cantinho e um violão
Este amor, uma canção
Pra fazer feliz a quem se ama

Muita calma pra pensar
E ter tempo pra sonhar
Da janela vê-se o Corcovado
O Redentor, que lindo

Quero a vida sempre assim
Com você perto de mim
Até o apagar da velha chama

E eu que era triste
Descrente deste mundo
Ao encontrar você eu conheci
O que é felicidade meu amor

 

Link a revista O Cruzeiro, de 10 de outubro de 1931, edição dedicada ao Cristo Redentor, com textos do Conde de Affonso Celso, de Heitor Silva Costa, de Arrojado Lisboa, de Felipe dos Santos Reis, do padre José Natuzzi, dentre outros, abordando a história, a concepção, a construção e outros aspectos do monumento. Publicação também do Cântico ao Cristo do Corcovado, de Tasso da Silveira; da história da Estrada de Ferro do Corcovado, das cartas trocadas entre o papa Pio XI  e o cardeal Sebastião Leme, da programação oficial e da lista das autoridades eclesiásticas que participariam dos eventos relacionados à inauguração do monumento.

 

 

Para saber um pouco da história do Morro do Corcovado antes do Cristo Redentor, acesse aqui o artigo Série “O Rio de Janeiro desaparecido” (11) – A Estrada de Ferro do Corcovado e o mirante Chapéu de Sol, publicado em 22 de julho de 2021, na Brasiliana Fotográfica.

 

 

A Brasiliana Fotográfica agradece a colaboração para a realização desse artigo de Roberta Mociaro Zanatta, coordenadora do Núcleo de Catalogação e Indexação do IMS e uma das responsáveis pela gestão e atualização de conteúdos do portal Brasiliana Fotográfica., e de Guilherme Dias, Conservador de Fotografias do Núcleo de Conservação e Preservação de Acervos, do IMS.

(1) KAZ, Leonel; LODDI, Nigge. Cristo Redentor História e Arte de um Símbolo do Brasil. Rio de Janeiro : Aprazível, 2008, página 75.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Agenda do Centro de Documentação da TV Globo

ALVAREZ, Rodrigo. Redentor. Rio de Janeiro : GloboLivros, 2021.

Biblioteca da Câmara Legislativa do Distrito Federal

Blog Diário do Corcovado

CERQUEIRA, Bruno da Silva Antunes de; ARGON, Maria de Fátima Moraes. Alegrias e Tristezas: Estudos Sobre a Autobiografia de D. Isabel do Brasil. Rio de Janeiro : Linotipo Digital Editora, 2020.

Conforme está relatado no livro Alegrias e Tristezas: Estudos Sobre a Autobiografia de D. Isabel do Brasil (Linotipo Digital Editora) — escrito pelo historiador e advogado Bruno da Silva Antunes de Cerqueira, fundador do Instituto Cultural D. Isabel A Redentora, e pela historiadora e arquivista Maria de Fátima Moraes Argon, pesquisadora aposentada do Museu Imperial

Coleção Nosso Século Brasil 10 Volumes. São Paulo : Abril Cultural, 1987.

Entrevista com Bel Noronha, bisneta de Heitor da Silva Costa e diretora do documentário De braços abertos, no Programa do Jô

Folha de São Paulo

Google Arts & Culture

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

KAZ, Leonel; LODDI, Nigge. Cristo Redentor História e Arte de um Símbolo do Brasil. Rio de Janeiro : Aprazível, 2008.

OSWALD, Carlos. Como me tornei pintor.  Petrópolis, RJ: Vozes, 1957.

Portal Iphan

RIBEIRO, Antônio Sérgio. Cristo Redentor: 80 anos de um símbolo. Agência de Notícias da Assembleia Legislativa de São Paulo. 

SEMENOVITCH, Jorge Scévola. Corcovado: a conquista da montanha de Deus. Rio de Janeiro : Editora Lutecia, 2010

Site Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro

Site Capital Mundial da Arquitetura – Rio 2020

Site Engenharia 360

Site Rio de Janeiro aqui

Site Riotur

Site Santuário Cristo Redentor

Site Sim São Gonçalo

Veja Rio, 5 de junho de 2017

Wikipedia

Youtube

Série “O Rio de Janeiro desaparecido” XII – O Teatro Lírico (Theatro Lyrico)

O Rio de Janeiro desaparecido. Esta é uma série diferente. Quando foi concebida, inspirada pelo livro Vestígios da paisagem carioca: 50 lugares desaparecidos do Rio de Janeiro (2019), de Isabela Mota e Patricia Pamplona, e por artigos sobre o Rio Antigo, de autoria de Charles Julius Dunlop (1908 – 1997), já haviam sido publicados na Brasiliana Fotográfica 11 artigos que deveriam pertencer à série. Então, o artigo sobre o Theatro Lyrico, com o qual o portal presta uma homenagem à arte e aos artistas é, na verdade, o 12º da série, mas é o que a inaugura com essa denominação.

Com um registro do alagoano Augusto Malta (1864 – 1957), que foi o fotógrafo oficial da Prefeitura do Rio de Janeiro, entre 1903 e 1936, vamos conhecer um pouco da história desse teatro que, em sua época, foi o centro artístico e cultural do Rio de Janeiro. Pelo palco do Lyrico passaram artistas internacionais como o maestro italiano Arturo Toscanini (1867 – 1957), que lá regeu pela primeira vez uma orquestra, os tenores italianos Enrico Caruso (1873 – 1921) e Francesco Tamagno (1850 – 1905), as atrizes francesa Sarah Bernhardt (1844 – 1923) e Gabrielle Réjane (1856 – 1922); e a italiana Eleonora Duse (1858 – 1924). Vários artistas nacionais também atuaram no Lyrico, dentre eles as cantoras Bidu Sayão (1902 – 1999) e Carmen Miranda (1909 – 1955), a pianista Guiomar Novaes (1895 – 1979) e os atores (1882 – 1932) Procópio Ferreira (1898 – 1979) e Raul Roulien (1904 – 2000).

Sob o assoalho removível da plateia, que tinha 1400 cadeiras, havia um picadeiro! O teatro contava com uma Tribuna Imperial, 86 camarotes de diferentes categorias, 252 galerias e 168 fauteuils de varandas. No total, tinha 2500 lugares. Segundo o historiador Luiz Edmundo (1878 – 1961) era o melhor teatro da cidade. A inauguração do Theatro Municipal, em 14 de julho de 1909, diminuiu a importância do Lyrico, mas devido à qualidade de sua acústica, considerada notável e superior a do Municipal, manteve fiéis os apreciadores do canto lírico. 

“O melhor teatro da cidade é o Lyrico, uma ruína dourada, mostrando uma reles entradinha de ladrilhos, cercada de espelhos, uns espelhos muito velhos, muito sujos, muitos enodoados e uns porteiros de apresentação grotesca e mal ajambrada, sorrindo debaixo de densas gaforinhas postas em caramanchão e usando, nas noites de grandes premières, luvas brancas com punhos de celluloide”.

Luiz Edmundo em O Rio de Janeiro do meu tempo

 

No livro Palco e Picadeiro – o Theatro Lyrico, seu autor, o historiador Francisco Vieira destacou o fato do teatro ser tão integrado à vida da cidade que, em dia de estreia, os bancos dos bondes eram forrados de flanela braanca para que os passageiros a caminho do teatro não sujassem seus trajes. Logo o povo apelidou os veículos de “bonde de ceroulas”. 

O Theatro Lyrico nasceu e morreu sob o signo do carnaval: seu primeiro evento foi um baile de mascarados, em fevereiro 1871, e, seu último, um ensaio de ranchos carnavalescos, em janeiro de 1932. Foi demolido entre 1933 e 1934. No artigo do Jornal do Brasil de 28 de dezembro de 1933 sobre sua demolição foi publicada a fotografia produzida por Malta, em torno de 1928. Destacamos aqui a importância da digitalização de fotografias para a pesquisa e também para a difusão e consequentemente para a própria preservação de acervos fotográficos. Além disso, as imagens, a partir de recursos tecnológicos como o zoom têm uma visibilidade muito melhor e podem ser acessadas com uma qualidade bem maior.

 

 

 

 

Um pouco da história do Lyrico 

 

bartolomeu

O açoriano Bartholomeu Corrêa da Silva (1828 – 1917) / Palco e Picadeiro – o Theatro Lyrico

 

O açoriano Bartholomeu Corrêa da Silva (1828 – 1917), nascido na Ilha Graciosa, em junho de 1928, deixou Portugal aos 14 anos, veio para o Brasil, estabeleceu-se em Campos dos Goytacazes e depois, já com sua mãe e duas irmãs, foi para São Fidélis, onde adquiriu um armazém. O diretor de um circo com cerca de 10 componentes chegou à cidade e alimentava sua trupe com comida e bebida da loja de Bartholomeu. Porém, o diretor fugiu e deixou uma dívida e a trupe para trás. Assim Bartolomeu tornou-se dono de um circo. Começava a história do Theatro Lyrico!

Bartholomeu decidiu então deixar São Fidélis e apresentou sua Companhia Gymnastica Equestre, em Niterói  (Correio Mercantil, 14 de março de 1856, terceira coluna).

 

 

No mesmo ano, já no Rio de Janeiro, a capital do Império, a Companhia Equestre instalou-se, provisoriamente, no Campo da Aclamação (Correio Mercantil, 1º de maio de 1856). No ano seguinte, voltou ao local (Correio Mercantil, 31 de maio de 1857, segunda coluna).

 

 

Em setembro de 1857, o Circo Olympico volante foi armado em São Cristóvão (Correio Mercantil, 12 de setembro de 1857).

 

 

O artista e então administrador do Teatro São Pedro de Alcântara, João Caetano (1808 – 1863), convidou Bartholomeu para realizar um espetáculo. O contrato foi assinado em 15 de dezembro de 1857.

 

 

 

Em 1858, o Circo Olympico passou pela rua Nova do Conde, no Catumbi, e também pela rua São Clemente, em Botafogo (Correio Mercantil, 6 de janeiro e 23 de março de 1858).

 

 

 

Finalmente estabeleceu-se, na rua da Guarda Velha, atual Largo da Carioca, na época, o coração do Rio de Janeiro, uma localização privilegiada (Correio Mercantil21 de agosto e 25 de agosto de 1858).

 

 

 

Em 1863, Bartholomeu cercou o terreno da rua da Guarda Velha com um gradil e inaugurou, ao lado do circo, no ano seguinte, uma cervejaria, a Jardim Concerto, com produção própria, onde seria hoje a rua Senador Dantas esquina com a avenida Chile. O empreendimento foi um sucesso.

 

 

Aos poucos a lona do circo foi substituída por um circo de madeira, tornando-se uma casa de espetáculos circenses e teatrais. Famílias, inclusive a de dom Pedro II (1825 – 1891), frequentavam o circo e foi o imperador que propôs a Bartholomeu que construisse um teatro nos moldes dos melhores que existiam na Europa. Então Bartholomeu encomendou um projeto em que, com a retirada do piso de madeira da plateia, o teatro se transformava em circo equestre. Para isso contou com a ajuda do engenheiro Bittencourt da Silva. Segundo o historiador Francisco Vieira:

“Retirando-se o assoalho do teatro, em cima do qual as cadeiras da plateia eram cuidadosamente dispostas, tinha-se de volta o picadeiro. Logo se percebeu a perfeição da acústica da sala. Provavelmente devido ao fato de que essa tampa de assoalho, de madeira fina e resistente, quando colocada sobre os cavaletes, criava uma caixa de ressonância em associação com o madeirame do teto. Era uma acústica de caixa de violino.”

A excelência dessa acústica ficou mundialmente conhecida.

Os últimos espetáculos do circo, apresentados pela Companhia Chiarini, aconteceram em comemoração à vitória do Brasil na Guerra do Paraguai (Diário do Rio de Janeiro, 25 de março e 26 de abril de 1870).

Em 2 de fevereiro de 1871, o Theatro Dom Pedro II foi aberto com uma apresentação de exercícios equestres e gimnásticos da companhia de Bartholomeu, que se repetiu ao longo de fevereiro (Diário do Rio de Janeiro, 2 de fevereiro de 1871, quinta coluna; 12 de fevereiro, quinta coluna, de 1871). Ainda no mesmo mês, foram realizados no salão da frente, logo antes da plateia, dois bailes de carnaval, em 19 e 21 de fevereiro, que marcaram a inauguração oficial do teatro (Jornal do Commercio, 12 de fevereiro, primeira coluna19 de fevereiro, última coluna, de 1871). O casal imperial não compareceu ao baile de abertura, mas às vésperas de sua realização suas majestades visitaram o teatro e elogiaram o prédio e sua decoração.

No seu livro, Memórias, o escritor português Raul Brandão (1867 – 1930) escreveu uma história contada a ele pelo caricaturista, escultor e ceramista português Rafael Bordalo Pinheiro (1846 – 1905), que morou alguns anos no Rio de Janeiro, durante o século XIX:

“O imperador do Brasil, logo que chegava ao theatro, mettia-se no camarote, descalçava as botas e calçava com regalo, uns chinelos. Uma noite o Raphael, que estava no Rio, foi pé ante pé, meteu a mão pela cortina e robou-lhe as botas. O pobre homem não se desconcertou: sahiu de chinelos, atravessou em chinelos a multidão, saudando para a direita, para esquerda, desceu até ao pateo e meteu-se, em chonelos, na carruagem”.

Terá sido verdade? Ou terá sido uma história inventada por Bordalo Pinheiro?

 

 

 

Com a presença de dom Pedro II e da imperariz Teresa Cristina (1822 – 1889), em 20 de junho de 1871, foi iniciada a primeira temporada lírica do Theatro D. Pedro com a apresentação da ópera Guilherme Tell, de Rossini, com os tenores Ballarini e Lelmi e a mezzo-soprano Amelia Escalante, dentre outros, sob a direção do maestro Ângelo Agostini, homônimo do famoso jornalista e ilustrador ítalo-brasileiro (Jornal do Commercio, 13 de junho de 1871). A programação da temporada da companhia italiana, com óperas de Ângelo Agostini (? -?), Carlos Gomes (1836 – 1896), Charles Gounod (1818 – 1893), Daniel Auber (1782 – 1871), Errico Petrella (1813 – 1877), Friedrich Flotow (1812 – 1883), Fromental Halevy (1799 – 1862), Giacomo Meyerbeer (1791 – 1864), Gioachino Rossini (1792 – 1868), Giovanni Pacini (1796 – 1867), Giuseppe Verdi (1813 – 1901) e Saverio Mercadante (1795-1870), foi publicada no Diário do Rio de Janeiro de 19 de março de 1871. Na mesma edição, em sua coluna “Revista do Domingo”, Luis Guimarães Jr. (1847 – 1898), um dos dez membros eleitos para se completar o quadro de fundadores da Academia Brasileira de Letras, comentou a vinda da Companhia Italiana ao Rio de Janeiro (Diário do Rio de Janeiro, 19 de março de 1871, sexta coluna). O teatro foi desde o início prestigiado pela elite já que o canto lírico representava o ápice da cultura europeia, da civilidade. Porém, Bartholomeu seguiu apresentando espetáculos para o grande público, garantindo a presença da cultura popular em seu teatro. Também cedia gratuitamente o Lyrico para a realização de festas beneficentes como as realizadas para as viúvas dos soldados da Guerra do Paraguai e para a Beneficência Portuguesa.

 

 

 

 

A décima segunda récita da temporada, em 18 de julho de 1871, homenageou o aniversário da sagração de dom Pedro II e contou com a  presença da princesa Isabel (1846 – 1921) e de seu marido, o conde D´Eu (1842 – 1922). Na ocasião, a princesa era a regente porque dom Pedro II estava, pela primeira vez, em viagem à Europa, para onde havia embarcado em 25 de maio de 1871. Em 31 de março de 1872, retornou ao Rio de Janeiro (Diário do Rio de Janeiro, 1º de abril de 1872), trazendo o duque de Saxe, viúvo de de sua filha Leopoldina, e seus dois netos, Pedro Augusto (1866 – 1934) e Augusto Leopoldo (1867 – 1922), que seriam educados no Brasil.

 

 

Em setembro de 1875,  o Theatro D. Pedro II passou a se chamar, por decreto, Imperial Theatro D. Pedro II (A Reforma, 7 de setembro de 1875, primeira colunaJornal do Commercio, 7 de setembro de 1875, primeira coluna).

 

imperial

 

Em 25 de março de 1876, véspera da partida do casal imperial para uma viagem aos Estados Unidos, foi realizado um espetáculo de gala no Imperial Theatro D. Pedro II. Na ocasião, o ator Francisco Xavier da Silva Lisboa recitou uma saudação de despedida aos imperadores (Diário do Rio de Janeiro, 27 de março de 1876, penúltima coluna).

Entre os anos de 1876 e 1886, o teatro foi administrado pelo maestro italiano Ângelo Ferrari (1835 – 1897) e conheceu uma fase áurea, com a apresentação de grandes óperas e dos maiores nomes do bel canto da época. Alguns dos espetáculos foram a Fosca, de Carlos Gomes (1836 – 1896), 1877 (Gazeta de Notícias, 25 de julho de 1877); Eurico, do maestro português Miguel Ãngelo Pereira (1843 – 1901), baseada no livro homônimo do poeta Alexandre Herculano (1810 – 1877), em 1878 (Revista Illustrada, 2 de novembro de 1878, terceira coluna); e Aída, de Giuseppe Verdi (1813 – 1901), em 1879 (Gazeta de Notícias, 15 de novembro de 1879, primeira coluna). Tenores famosos como o espanhol Julien Gayarre (1844 – 1890) (Gazeta de Notícias, 22 de outubro de 1876) e o italiano Francesco Tamagno (1850 – 1905) (Revista Musical, 15 de novembro de 1879, primeira coluna) apresentaram-se no teatro assim como as cantoras líricas Maria Durand (1846 – ?) (Gazeta de Notícias, 15 de novembro de 1879, primeira coluna) e Marianni (Diário do Rio de Janeiro, 27 de outubro de 1878, terceira coluna). Em 1888, o ator francês da Comedie Française, Benoit Constant Coquelin (1841 – 1909), e a atriz francesa Jane Hading (1859 – 1941) foram os grandes sucessos (Diário de Notícias, 30 de maio de 1888, última coluna).

Foi por ocasião das comemorações do tricentenário do poeta Luis de Camões (1524-1580), organizadas pelo Real Gabinete de Leitura, que a peça de Machado de Assis (1839 – 1908), Tu, só tu, puro amor, estreou no Imperial Theatro D. Pedro II, em 10 de junho de 1880 (Gazeta de Notícias, 11 e 12 de junho de 1880, terceira coluna). Machado fez citações sobre o teatro em algumas de suas obras, como no livro Esaú e Jacó (1904) e em contos como  D. Jucunda (1889). Outros autores também o mencionaram: Lima Barreto (1881 – 1922) no conto Uma noite no Lírico, publicado em seu livro Histórias e Sonhos (1920); e Rubem Fonseca (1925 – 2020), em Agosto (1990), quando o personagem Emilio, o velho e doente professor de música do comissário Mattos, diz: “Nem Gigli nem Scotti põem mais os pés aqui…Não, não, minha cabeça não anda boa, o Scotti morreu há muito tempo, você não chegou a vê-lo, mas eu o vi, com esses olhos que a terra há de comer, cantando o Falstaff no Teatro Lírico, que eles demoliram, um teatro lindo com uma acústica melhor do que o Scala de Milão”. Antonio Scotti (1866 – 1936) foi um barítono italiano.

No dia 30 de junho de 1886, o maestro italiano Arturo Toscanini (1867 – 1957) regeu pela primeira vez uma orquestra, apresentando Aída, de Giuseppe Verdi (1813 – 1901), no Theatro Lyrico. Toscanini regeu a ópera de cor, sem partitura, e recebeu os maiores elogios do severo crítico Oscar Guanabarino (1851 – 1937).

 

Oscar Guanabarino / O Rio de Janeiro do meu tempo, de Luiz Edmundo

Oscar Guanabarino / O Rio de Janeiro do meu tempo, de Luiz Edmundo

 

 

Substituiu na última hora o maestro brasileiro Leopoldo Miguez (1850 – 1902), futuro autor do Hino da Proclamação da República, porque os artistas italianos não aceitaram a ideia de serem dirigidos por um estrangeiro. Miguez estava no lugar do regente italiano Claudio Rossi, que havia ficado doente (L´Italia, 1º de julho de 1886, última coluna; O Paiz, 1º de julho, quarta coluna 4 de julho, quarta coluna, 1886).

 

 

A cantora que fazia o papel de Aída, a russa Nadina Bulicioff (1858 – 1921), comprou a liberdade de sete escravizados com os presentes que recebeu de seus admiradores. Entregou as cartas de alforrias em pleno palco, em 10 de agosto, em um ato da campanha abolicionista organizado por José do Patrocínio (1854 – 1905) (O Paiz, 11 de agosto de 1886, sexta coluna).

 

 

A ópera Lo Schiavo, de Carlos Gomes (1836 – 1896), dedicada à princesa Isabel (1846 – 1921), estreou em 27 de setembro de 1889, sem a presença da família imperial, de luto devido à morte de dom Augusto de Portugal (1847 – 1889). Mas na récita do dia 2 de outubro, no intervalo da ópera, o compositor recebeu das mãos do imperador Pedro II a Ordem do Rosa (Diário de Notícias, 28 de setembro, quinta coluna3 de outubro de 1889, penúltima coluna).

Devido à proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, o camarote real foi demontado, os símbolos do império foram eliminados e o Theatro Imperial Dom Pedro II passou a chamar-se Theatro Lyrico (O Paiz, 3 de dezembro de 1889, terceira coluna). Em janeiro do ano seguinte, uma reunião para a escolha do Hino da Proclamação da República aconteceu no teatro com a presença do presidente Deodoro da Fonseca (1827 – 1892). A música de Leopoldo Miguez, que concorreu com Alberto Nepomuceno (1864 – 1920), Francisco Braga (1868 – 1945), futuro compositor do Hino da Bandeira (1905); e Jerônimo Queiroz, foi a escolhida. O Hino Nacional permaneceria sendo o composto por Francisco Manoel da Silva (1795 – 1865) (O Paiz, 21 de janeiro de 1890, penúltima coluna; Jornal do Brasil, 31 de dezembro de 1933). Entre fevereiro e março, foram realizados no teatro dois bailes mascarados e uma reunião operária (O Paiz, 13 de fevereiro de 1890O Paiz, 17 de fevereiro de 1890O Paiz, 2 de março de 1890, primeira coluna).

Passou por uma reforma e foi reinaugurado em abril de 1890 com a apresentação da Grande e Luxuosa Companhia Equestre, acrobatica, gymnastica e comica do Polytheama Argentino de Buenos Aires, do empresário Luiz Gucci, representado por Alfredo Cattaneo (O Paiz, 23 de abril de 1890, primeira coluna).

 

 

Em 28 de março de 1895, Bartholomeu tomou posse definitiva do terreno do teatro.

 

Planta do Teatro Lírico

Planta geral do Teatro Lírico

 

O tango Tupã, uma homenagem da maestrina Chiquinha Gonzaga (1847 – 1935) ao jornalista e médico Lopes Trovão (1848-1925), autor da frase que se referia a ela: “Aquela Chiquinha é o diabo!”, foi executada pela Banda dos Meninos Desvalidos, regida por Luiz Moreira, em uma récita em benefício à compositora no Lyrico, em 20 de abril de 1891 (Gazeta de Notícias, 20 de abril de 1891, primeira coluna).

Vamos destacar na primeira década do século XX , a estreia no Rio de Janeiro, do Cinematographo Lumière Aperfeiçoado realizado pela empresa Evert, em 26 de novembro de 1904; a apresentação das atrizes de renome internacional Gabrielle Réjane (1856 – 1922), Sarah Bernhardt (1844 – 1923) e a italiana Eleonora Duse (1858 – 1924); e do tenor italiano Enrico Caruso (1873 – 1921). São nomes que se confundem com as artes nas quais atuaram.

 

 

Gabrielle Réjane esteve no Brasil três vezes. A primeira, em 1895. Em 1902, estreou no Lyrico na peça Zaza, escrita especialmente para ela por Pierre Berton (1842 – 1912) (Gazeta de Notícias, 1º de julho de 1903, última coluna). Fundou sua própria companhia teatral, em Paris, em 1906, e o escritor Marcel Proust (1871 – 1922) era seu grande amigo e admirador. Notabilizou-se por suas performances nas peças Madame Sans-Gêne, de Victorien Sardou (1831 – 1908); M Cousine, de Henri Meilhac (1830 – 1897), além da já citada Zaza. Apresentou-se no Theatro Municipal do Rio de Janeiro um dia depois de sua inauguração (O Paiz, 14 de julho, última coluna16 de julho, primeira coluna de 1909).

 

 

Identificado como célebre tenor, o italiano Enrico Caruso estreou no Lyrico, em 9 de setembro de 1903, na ópera Rigoletto (1851), de Giuseppe Verdi (1813 – 1901), que foi reapresentada em 18 de setembro. Também atuou em Manon Lescaut (1893) e na Tosca (1900), ambas de Giacomo Puccini (1858 – 1924); e em Iris (1898), de Pietro Mascagni (1863 – 1945) (Correio da Manhã,  8 de setembro, 18 de setembro, 19 de setembro e 25 de setembro de 1903; Jornal do Brasil, 26 de setembro de 1926, terceira coluna). Esteve de novo no Brasil, em 1917, quando se apresentou no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

 

 

Sarah Bernhardt fez em julho de 1905 sua última turnê ao Rio de Janeiro. Já havia estado na cidade em 1886, quando se apresentou no Teatro São Pedro de Alcântara e sua atuação em Fedra, de Jean Racine (1639 – 1699) arrebatou a plateia; e, em 1893, quando suas performances aconteceram no Theatro Lyrico (Gazeta de Notícias, 10 de junho de 1893, última coluna). Foi também no Lyrico que se apresentou entre 13 e 17 de outubro de 1905, nas peças La Sorcière (1904), de Victorien Sardou (1831 – 1908); Adrienne Lecouvrier (1849), de Ernest Legouvé (1807 – 1903) e Eugène Scribe (1791 – 1861); A Dama das Camélias (1852), de Alexandre Dumas Filho (1824 – 1895); Angelo (1835)de Victor Hugo (1802 – 1885), e Hamlet (c. 1600)de William Shakespeare (1564 – 1616). Partiu do Rio de Janeiro em 18 de outubro de 1905 (Gazeta de Notícias, 19 de outubro de 1905, quinta coluna).

 

 

Reza a lenda que ela teria se acidentado durante essa última turnê quando representava a peça A Tosca, de Sardou, cuja estreia foi estrelada por ela, em 27 de novembro de 1887, em Paris, tendo sido, em 1900, adaptada para a ópera homônima, por Giacomo Puccini (1858 – 1924). A queda teria ocasionado, posteriomente, a amputação da perna da atriz. Porém não há registro na imprensa de sua atuação na referida peça nessa sua última temporada carioca. Havia encenado A Tosca em sua turnê, no Rio de Janeiro, em 1893 (Gazeta de Notícias, 10 de junho , terceira coluna; 16 de junho, última coluna, de 1893).

 

 

Eleonora Duse ou La Duse, como era conhecida, foi uma verdadeira diva do teatro e destacou-se na interpretação de papéis escritos, muitas vezes, especialmente para ela pelo dramaturgo italiano Gabrielle D´Annunzio (1863 – 1938), com quem teve um romance; e de peças do norueguês Henrik Ibsen (1828 – 1906). Esteve no Rio de Janeiro, em 1885, quando se apresentou no Theatro São Pedro de Alcântara (Jornal do Commercio, 29 de junho de 1885, última coluna; A Semana, 17 de julho de 1885Diario do Brazil, 7 de agosto de 1885, primeira coluna), e entre junho e julho de 1907, em uma temporada no Lyrico. Após sua última performance, realizada em 16 de julho na peça Rosmersholm (1886), de Ibsen, foi homenageada e um escudo de mármore com a seguinte inscrição foi inaugurado:

 

 

Um fato curioso: foi no Lyrico, numa homenagem ao aviador Santos Dumont (1873 – 1932), que o jornalista e abolicionista José do Patrocínio (1854 – 1905), quando saudava o inventor, sofreu uma hemoptise durante seu discurso, tendo falecido pouco tempo depois, em 29 de janeiro de 1905 (Site Academia Brasileira de Letras).

Em 15 de setembro de 1911, houve um incêndio no edifício da Imprensa Nacional, vizinho ao teatro, o que suscitou boatos em torno da possível demolição do Lyrico. Um dos mais respeitados críticos de artes da época, o implacável Oscar Guanabarino (1851 – 1937), escreveu um artigo no qual se opunha veementemente a essa hipótese e chamava o Lyrico de melhor teatro dessa cidade (O Paiz, 16 de setembro, penúltima coluna; 7 de novembro, última coluna, de 1911).

 

 

O comendador Bartholomeu, título que recebeu  do rei dom Carlos de Portugal, faleceu em 27 de dezembro de 1917, e o Lyrico, após uma ruidosa disputa entre sua neta Margarida Chaves Lopes, pra quem deixouo teatro em testamento, e seus sobrinhos, foi herdado por ela, que era filha de Emilia (1859 – 1881), filha adotiva de Bartholomeu, e do jornalista Henrique Chaves (1849 – 1910), português e um dos fundadores da Gazeta de Notícias. Emilia havia morrido tragicamente, atingida por um coice de um cavalo, em novembro de 1881, no pátio que ficava na saída lateral do teatro. Margarida era casada com César Lopes Ferreira, com quem tinha dois filhos: João Henrique e Maria Emilia. Moravam no teatro assim como Batholomeu até sua morte (A Noite, 27 de dezembro de 1917, terceira coluna;  Gazeta de Notícias, 23 de maio de 1918, penúltima coluna).

Em 16 de fevereiro de 1919, foi realizado no Lyrico o primeiro concurso de músicas de carnaval. Os números foram executados pela Banda do Batalhão Naval e a vencedora foi o maxixe Prove e beba Vermutim, de Abdon Lyra (1887 – 1962) (Gazeta de Notícias, 17 de fevereiro de 1919, penúltima coluna).

 

 

O Lyrico também foi palco de eventos políticos. Destacamos aqui a convenção da campanha civilista, em agosto de 1909 (O Paiz23 de agosto, quinta coluna). 24 de agosto, segunda coluna, de 1909).

 

 

E também, em 20 de março de 1919, o evento no qual Ruy Barbosa (1879 – 1923), durante sua campanha presidencial, vencida, em 13 de abril, por seu concorrente, Epitácio Pessoa (1865 – 1942), leu a conferência A Questão Social e Política no Brasil, que se tornou famosa (O Imparcial, 21 de março de 1919, quarta coluna).

 

 

Trecho da conferência A Questão Social e Política no Brasil 

 O Brasil não é isso

“Mas, senhores, se é isso o que eles vêem, será isto, realmente, o que nós somos? Não seria o povo brasileiro mais do que esse espécimen do caboclo mal desasnado, que não se sabe ter de pé, nem mesmo se senta, conjunto de todos os estigmas de calaçaria e da estupidez, cujo voto se compre com um rolete de fumo, uma andaina de sarjão e uma vez d’aguardente? Não valerá realmente mais o povo brasileiro do que os conventilhos de advogados administrativos, as quadrilhas de corretores políticos e vendilhões parlamentares, por cujas mãos corre, barateada, a representação da sua soberania?

Deverão, com efeito, as outras nações, a cujo grande conselho comparecemos, medir o nosso valor pelo dessa troça de escaladores do poder, que o julgam ter conquistado, com a submissão de todos, porque, em um lance de roleta viciada, empalmaram a sorte e varreram a mesa?

Não. Não se engane o estrangeiro. Não nos enganemos nós mesmos. Não! O Brasil não é isso. Não! O Brasil não é o sócio de clube, de jogo e de pândega dos vivedores, que se apoderaram da sua fortuna, e o querem tratar como a libertinagem trata as companheiras momentâneas da sua luxúria.

Não! O Brasil não é esse ajuntamento coletício de criaturas taradas, sobre que possa correr, sem a menor impressão, o sopro das aspirações, que nesta hora agitam a humanidade toda.

Não! O Brasil não é essa nacionalidade fria, deliqüescente, cadaverizada, que receba na testa, sem estremecer, o carimbo de uma camarilha, como a messalina recebe no braço a tatuagem do amante, ou o calceta, no dorso, a flor-de-lis do verdugo.

Não! O Brasil não aceita a cova, que lhe estão cavando os cavadores do Tesouro, a cova onde o acabariam de roer até aos ossos os tatus-canastras da politicalha. Nada, nada disso é o Brasil”.

Seguiram-se apresentações de Guiomar Novaes (1895 – 1979) (O Paiz, 11 de setembro de 1920, terceira coluna) e de vários concertos de Arthur Rubinstein (1887 – 1982) (Correio da Manhã, 20 de maio de 1920, quinta coluna), em 1920; e, no ano do Centenário da Indenpendência do Brasil, em 1922, o grande sucesso foi a companhia francesa Ba-Ta-Clan, de Madame Rasimi (1874 – 1954) (O Paiz, 6 de agosto de 1922, penúltima coluna). Os Oitos Batutas, a seu convite, haviam apresentado no Theatro Lyrico o repertório dos shows que haviam realizado em Paris. “Não há dúvida nenhuma: mais uma vez os versos do trovador popular se justificam… ”A Europa continua a curvar-se ante o Brasil” (O Paiz, 23 de agosto de 1922, quinta coluna; e 27 de agosto, penúltima coluna, de 1922).

No ano seguinte, apresentaram-se no teatro o pianista russo Alexander Borovsky (1889 – 1968) (Correio da Manhã, 18 de maio de 1923, segunda coluna) e a cantora e atriz francesa Mistinguett (1873 – 1956) (Fon-Fon, 18 de agosto de 1923).

 

 

Em 1926, houve a apresentação da pianista Magdalena Tagliaferro (1893 – 1986) (Revista da Semana, 3 de julho de 1926, terceira coluna).

 

 

Filippo Tomazzo Marinetti (1876 – 1944), principal teórico e fundador do futurismo italiano, fez duas conferência do Lyrico, em 15 e 18 de maio de 1926, apresentado por Graça Aranha (1868 – 1931). Foi vaiado pelo público e diversas caricaturas dele foram publicadas pela imprensa carioca (Gazeta de Notícias, 16 de maio19 de maio de 1926; Fon-Fon, 12 de junho de 1926).

Em 15 de novembro, ainda em 1926, sob a direção do maestro e compositor Heitor Villa-Lobos (1887 – 1959),  realização do espetáculo de gala Musica Typica Brasileira, com um coro de 200 vozes, em homenagem ao Governo da República (O Paiz, 14 de novembro de 1926).

 

 

Foi promovido no Lyrico, em janeiro de 1930, o concurso carnavalesco da Casa Edison, primeira empresa fonográfica do Brasil, fundada pelo tcheco Frederico (Fred) Figner (1866 – 1947), primeiro produtor fonográfico do Brasil. A música vencedora foi Dá nela, de Ary Barroso (1903 – 1964), seu primeiro grande sucesso e também o hit do carnaval de 1930. O cantor oficial do evento foi o popular Francisco Alves (1898 – 1952) e a orquestra era a Pan-Americana (O Malho, 25 de janeiro; 1º de fevereiro de 1930). No mesmo ano, a temporada lírica foi inaugurada pelo famoso pianista Alexandre Brailowsky (O Malho, 17 de maio de 1930).

 

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Ainda em 1930, a cantora Carmen Miranda (1909 – 1955) lotou o teatro. Na mesma noite, apresentaram-se os atores Procópio Ferreira (1898 – 1979), Raul Roulien (1904 – 2000) e o jornalista e poeta Álvaro Moreyra (1888 – 1964), dentre outros (A Noite, 20 de junho de 1930, terceira coluna).

 

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Fon-Fon, 14 de junho de 1930

 

Mas a crise financeira atingiu o Brasil, as instalações do Lyrico estavam velhas e muito dinheiro seria necessário para restaurá-lo. A última companhia que manteve um contrato com o teatro foi a A. Sonschein, de Cinematorgaphia, Theatros e Diversões. Em 23 de janeiro de 1932, a declamadora, atriz e cantora argentina, nascida na Bielorússia, Berta Singerman (1901 -1998), realizou seu 50º recital no Theatro Lyrico.

 

 

Em 29 de janeiro de 1932, houve no teatro o ensaio dos ranchos carnavalescos Flor do Abacate, Arrepiados e Deixa Falar (O Jornal, 31 de janeiro de 1932, quarta colunaDiário de Notícias, 3 de fevereiro de 1932, quarta coluna). Foi o último evento realizado no velho casarão da rua da Guarda. Estava marcado para o dia 31 de janeiro, um festival para a escolha do melhor samba e da melhor marchinha do carnaval de 1932, porém foi adiado devido a um problema de saúde da cantora Zaira Cavalcanti (1913-1981). Não há registro de que tenha sido realizado, pelo menos não no Lyrico (O Jornal, 30 de janeiro de 1932, segunda colunaCorreio da Manhã, 31 de janeiro de 1932, segunda colunaDiário de Notícias, 2 de fevereiro de 1932, segunda coluna).

O teatro, em 1932, foi a leilão público e adquirido pelo diretor presidente da Caixa Econômica Federal, Solano Carneiro da Cunha (O Jornal, 14 de setembro, quinta coluna;  29 de setembro, última coluna 29 de outubro, primeira coluna, de 1932). Na ocasião, segundo o livro Palco e Picadeiro – o Theatro Lyrico, o diretor do Instituto Nacional de Música, o professor Guilherme Fontainha (1887 – 1970), pediu a cessão das placas comemorativas que estavam no interior do Lyrico, que  foram então alocadas no Teatro João Caetano e na Escola Nacional de Música.

 

 

O prédio do teatro estava condenado por engenheiros e foi demolido entre 27 de dezembro de 1933 e 1934. Houve um desabamento durante sua demolição (Jornal do Brasil, 28 de dezembro de 193329 de dezembro de 1933, penúltima coluna6 de maio, quarta coluna20 de maio, quinta coluna19 de dezembro, quinta coluna, de 1934; O Paiz, 3 de janeiro, penúltima coluna3 de abril, penúltima coluna de 1934; O Jornal, 28 de janeiro de 1934).

 

 

Suas colunas de madeira foram vendidas aos irmãos e luthiers Benvenuto Pascole (1892 – 1956) e Guido Pascole (1905 – 1987), cuja fábrica de violinos ficava em São Paulo, e ao maestro Livolsi Bartholomeu. Foram utilizadas na fabricação desses instrumentos. O jornal A Noite promoveu um concurso para a entrega do violino fabricado com madeiras do Lyrico (A Noite, 2 de abril, 23 de abril10 de setembro17 de setembro, 22 de outubro e 15 de dezembro de 1934). Já no século XXI, o bombeiro e luthier Davi Lopes construiu instrumentos musicais com restos de madeira remanescentes do incêndio do Museu Nacional, ocorrido em 2 de setembro de 2018. Até agosto de 2021, Davi havia confeccionado com os destroços do museu dois violões, um bandolim, um cavaquinho e um violino, que seriam entregues ao Museu Nacional/UFRJ (Rota Cult, 27 de agosto de 2021).

 

 

Algumas das peças do  Lyrico foram a leilão e outras como, por exemplo, duas poltronas e um medalhão comemorativo da vista do presidente argentino, Julio Argentino Roca (1843 – 1914), ao Brasil, foram doadas ao Museu Histórico Nacional por Cesar Lopes, como já mencionado, marido de Margarida, a neta de Bartholomeu. No local do antigo teatro foi instalado um estacionamento (A Noite, 13 de novembro, quarta coluna).

 

tradição1tradição2tradição3                                                                  Revista da Semana, 7 de abril de 1934

 

O Theatro Lyrico em artigos e crônicas

 

O Theatro Lyrico está presente em artigos e crônicas de dramaturgos, escritores, historiadores e políticos, dentre eles Coelho Neto (1864 – 1934), João do Rio (1881 – 1921), Oscar Lopes (1882 – 1938), cunhado da antiga proprietária, Margarida; e Ruy Barbosa (1849 – 1923).

 

 

“Foi condenado à morte o Lyrico. No dia em que os pedreiros entrarem com seus ferros a atacar o casarão que foi tudo nesta cidade, desde circo até praça de manifestações políticas, os que vêm do passado, se o coração se lhes não esterilizaram, sofrerão produndamente com a perda da antigualha, que foi o centro da elegância e a “ágora” em dias que se perderam na grande noite dos tempos…Abate-se o Lyrico, mas que não o substituam por alguma joça ridícula que em vez de tornar o sítio mais formoso, o enfeia e faça mais forte a saudade do velho theatro, indubitavelmente o melhor que possuímos, não só para os espetáculos lyricos, como para as representações dramáticas”.

Trecho do artigo O Lyrico, de Coelho Neto,

publicado no Jornal do Brasil, 18 de setembro de 1932

 

 

 

“Flanar é ser vagabundo e refletir, é ser basbaque e comentar, ter o vírus da observação ligado ao da vadiagem. Flanar é ir por aí, de manhã, de dia, à noite, meter-se nas rodas da populaça, admirar o menino da gaitinha ali à esquina, seguir com os garotos o lutador do Cassino vestido de turco, gozar nas praças os ajuntamentos defronte das lanternas mágicas, conversar com os cantores de modinha das alfurjas da Saúde, depois de ter ouvido dilettanti, de casaca, aplaudirem o maior tenor do Lírico numa ópera velha e má; é ver os bonecos pintados a giz nos muros das casas, após ter acompanhado um pintor afamado até a sua grande tela paga pelo Estado; é estar sem fazer nada e achar absolutamente necessário ir até um sítio lôbrego, para deixar de lá ir, levado pela primeira impressão, por um dito que faz sorrir, um perfil que interessa, um par jovem cujo riso de amor causa inveja…”

                                                                                            A alma encantadora das ruas (1908), de João do Rio

 

 

 

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Relíquia Perdida, de Oscar Lopes, publicado no Jornal do Brasil, em 6 de agosto de 1933

 

 

 

“…Mas aqui estamos num recinto consagrado à flor do espírito e da graça. Como uma corbelha imensa, em camadas superpostas de flores, sorri toda uma sociedade inumerável de rosas, de violetas, de carbúnculos, à luz quase meridiana da eletricidade…a música vai entronar sua magia naquela atmosfera de templo de beleza. Desse feitiço dizem que já se moveu as pedras, mas que, hoje mesmo, na decadência de seu poder, amansa feras, e ensinar a bailar as serpentes…Mas no santuário de Mozart, de Mayerbeer e de Wagner não estruja a vozeria, não chocalhe a pilhéria deslavada…”

 Trecho do artigo de Ruy Barbosa, O Direito da Vaia, publicado no jornal A Imprensa, do qual era diretor, em 17 de agosto de 1900, em torno da polêmica sobre a vaia iniciada devido às manifestações dos frequentadores do Lyrico

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

GERSON, Brasil. História das Ruas do Rio. Rio de Janeiro: Bem-Te-Vi, 2013.

EDMUNDO, Luiz. O Rio de Janeiro do meu tempo. Rio de Janeiro:Editora: Imprensa Nacional, 1938.

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

PERNY, Mônica Menezes. As máscaras de carnaval no cenário carioca: uma contribuição à Memória Social. 2015. 92f. Dissertação (Mestrado em Memória Social) – Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.

SATIN, Ionara. Machado de Assis e I cantanti d’opera italiani: transferências culturais. Olho d’água, São José do Rio Preto, 10(2): p. 1–285, Jun.–Dez./2018.

Site Academia Brasileira de Letras

Site Acervo Digital Chiquinha Gonzaga

Site Panis & Circus – o site do circo

Site Teatros do Centro Histórico do Rio de Janeiro

VENCELAU, Maria da Gloria Leitão; SANDO, Rafael. The Pascoli Brothers: Violin Making and Immigration in 20th – Century Brazil, 2019.

VIEIRA, Francisco. Palco e Picadeiro – o Theatro Lyrico. Rio de Janeiro : 19 Design e Editora Ltda, 2015.

SAMPAIO, Daniel. Um circo lírico: conheça a história do Theatro Imperial Dom Pedro II. Veja Rio.

 

 

Links para os outros artigos da Série O Rio de Janeiro desaparecido

 

Série O Rio de Janeiro desaparecido I Salas de cinema do Rio de Janeiro do início do século XXde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de fevereiro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido II – A Exposição Nacional de 1908 na Coleção Família Passos, de autoria de Carla Costa, historiadora do Museu da República, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 5 de abril de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido III – O Palácio Monroe, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 9 de novembro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IV - A via elevada da Perimetral, de autoria da historiadora Beatriz Kushnir, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2017.

Série O Rio de Janeiro desaparecido V – O quiosque Chopp Berrante no Passeio Público, Ferrez, Malta e Charles Dunlopde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de julho de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VI – O primeiro Palácio da Prefeitura Municipal do Rio de Janeirode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de setembro de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VII – O Morro de Santo Antônio na Casa de Oswaldo Cruzde autoria de historiador Ricardo Augusto dos Santos da Casa de Oswaldo Cruzpublicado na Brasiliana Fotográfica em 5 de fevereiro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VIII – A demolição do Morro do Castelode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 30 de abril de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IX – Estrada de Ferro Central do Brasil: estação e trilhosde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de novembro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido X – No Dia dos Namorados, um pouco da história do Pavilhão Mourisco em Botafogode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de junho de 2020.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XI – A Estrada de Ferro do Corcovado e o mirante Chapéu de Sol, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 22 de julho de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIII – O Convento da Ajuda, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de outubro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIV – O Conselho Municipal, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 19 de novembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XV – A Praia de Santa Luzia no primeiro dia do verão, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 21 de dezembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVI – O prédio da Academia Imperial de Belas Artes, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, publicado na Brasiliana Fotográfica em 13 de janeiro de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVII – Igreja São Pedro dos Clérigos, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 18 de março de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVIII – A Praça Onze, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de abril de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIX – A Igrejinha de Copacabana, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XX – O Pavilhão dos Estados, futuro prédio do Ministério da Agricultura, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de julho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXI – O Chafariz do Largo da Carioca, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 19 de setembro de 2022. 

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXII – A Cadeia Velha que deu lugar ao Palácio Tiradentes, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 11 de abril de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIII e Avenidas e ruas do Brasil XVII A Praia e a Rua do Russel, na Glória, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 15 de maio de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIV – O luxuoso Palace Hotel, na Avenida Rio Branco, uma referência da vanguarda artística no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 4 de julho de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXV – O Theatro Phenix, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 5 de setembro de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXVI – Conclusão do arrasamento do Morro do Castelo por Augusto Malta, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 14 de dezembro de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXVII e Série Os arquitetos do Rio de Janeiro V – O Jockey Club e o Derby Club, na Avenida Rio Branco e o arquiteto Heitor de Mello (1875 – 1920), de autoria de Andrea c. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, em 15 de janeiro de 2024

 

Outros artigos publicados na Brasiliana Fotográfica sobre teatros e cinemas

 

Série O Rio de Janeiro desaparecido I Salas de cinema do Rio de Janeiro do início do século XXpublicado em 26 de fevereiro de 2016.

Os teatros do Brasil, publicado em 21 de março de 2016

A inauguração do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, publicado em 14 de julho de 2017

Cinema no Brasil – a primeira sessão e um pouco da história do Cinema Odeon, publicado em 8 de julho de 2021

O Theatro de Santa Isabel, publicado em 28 de outubro de 2021

O Teatro Amazonas (Theatro Amazonas), em Manaus, a “Paris dos Trópicos”, publicado em 28 de dezembro de 2021

O Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, no Dia Mundial do Teatro, publicado em 27 de março de 2023

Dia do Cinema Brasileiro, publicado em 19 de junho de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXV – O Theatro Phenix, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado em 5 de setembro de 2023

O Theatro da Paz, em Belém do Pará, inaugurado em 15 de fevereiro de 1878, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado em 15 de fevereiro de 2024

Cinema no Brasil – a primeira sessão e um pouco da história do Cinema Odeon

Um “aparelho que projeta sobre uma tela colocada ao fundo da sala diversos espetáculos e cenas animadas, por meio de uma série enorme de fotografias“. Assim o Jornal do Commercio descreveu o omniógrafo, após a primeira sessão pública de cinema no Brasil, que aconteceu às 14h, do dia 8 de julho de 1896, no Rio de Janeiro, em uma sala especialmente preparada para as projeções do aparelho, na rua do Ouvidor (Jornal do Commercio, 9 de julho de 1896, quarta coluna). A exibição ocorreu poucos meses após a projeção inaugural dos filmes dos irmãos Auguste (1862 – 1954) e Louis-Jean Lumière (1864 – 1948), em Paris, no dia 28 de dezembro de 1895, no Grand Café do Boulevard des Capucines.

 

 

Diversos fotógrafos não ficaram indiferentes à nova invenção. Alguns exemplos já abordados pela Brasiliana Fotográfica são Benjamin Abrahão Calil Botto (1901 – 1938), Jorge Kfuri (1893 – 1965)João Stamato (1886 – 1951)Marc Ferrez (1843 – 1923) e seus filhos e Walter Garbe (18? – 19?).

 

Acessando o link para as fotografias dos cinemas disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Nesse artigo, a Brasiliana Fotográfica homenageia a sétima arte e destaca a imagem do Cinema Odeon produzida pelo fotógrafo alagoano Augusto Malta (1864 – 1957), que foi, de 1903 a 1936, o fotógrafo oficial da prefeitura do Rio de Janeiro. Acessando a fotografia no acervo do portal, o leitor poderá magnificá-la, verificar todos os dados referentes a ela e explorar todos os seus detalhes, como, por exemplo, os pedestres, os carros, a iluminação pública, a presença de uma agência da Sul-América Seguros no prédio, a arquitetura da fachada e ônibus que aparecem no registro. Basta clicar aqui ou na própria imagem. A preservaçao digital de imagens possibilita, a partir de recursos tecnológicos como o zoom, que as fotografias tenham outra visibilidade e possam ser acessadas em sua qualidade plena.

 

 

A sala de cinema Odeon já existia na década de 10, na então avenida Central, atual Rio Branco, nº 137, esquina com a rua Sete de Setembro, quando, entre 1909 e 1913, o pianista Ernesto Nazareth (1863 – 1934) tocava na sala de espera, tendo merecido um elogio do também pianista e compositor Henrique Oswald (1852 – 1931) que o ouviu no Cinema Odeon: “É admirável esse moço. Que música ele faz! Eu mesmo seria incapaz de interpretá-la com aquela mestria, aquele prodígio de ritmo. E aqui, perdido nesta indiferença…”. Nazareth havia dedicado o tango Batuque (1901) a Oswald.

Nazareth retornou ao cinema, entre 1913 e 1918, como pianista da orquestra de Eduardo Andreozzi. Villa-Lobos era, na ocasião, o violoncelista. Darius Milhaud (1892 – 1974), que passou uma temporada no Brasil, tambem o ouviu tocar no Odeon e, posteriormente, escreveu sobre ele em sua autobiografia Notes san musique. Foi também no Odeon que o pianista polonês Arthur Rubinstein (1887-1982) o ouviu tocar, tendo ficado impressionado com sua performance. Sua composição, o tango Odeon, publicado em 1909 pela Casa Mozart (E. Bevilacqua & Cia.) foi dedicado “à distinta empresa Zambelli & Cia.”, proprietária do Cinema Odeon. A primeira gravação foi realizada por ele com Pedro Alcântara (1866 – 1929) ao flautim, em 1912. Não foi, na época, uma peça de especial destaque, mas tornou-se um de seus maiores sucessos na segunda metade do século XX.

 

 

Voltando ao Cinema Odeon, o atual prédio, fotografado por Malta, foi inaugurado em 3 de abril em 1926, na Praça Floriano, nº 7, no auge da presença de salas de cinema na Cinelândia, no centro do Rio (Jornal do Commercio, 2 de abril de 1926, quarta coluna; O Paiz, 4 de abril de 1926, segunda coluna). Passou por reformas em fins do século XX e, sob a administração do Grupo Estação, foi fechado em 2014, devido a dívidas. Reaberto, em 2015, como Centro Cultural Luiz Severiano Ribeiro – Cine Odeon passou a ser, além de sala de cinema, um espaço para cursos, palestras e espetáculos. O Cine Odeon mantém viva a tradição dos cinemas de rua do Rio de Janeiro.

 

 

” O ODEON é parte da memória cultural do Rio de Janeiro e representa uma época em que o cinema e o Centro da cidade se confundiam e se completavam. Sua história acompanha as mudanças da cidade ao seu redor ao longo dos seus 90 anos e continua a encantar o público, combinando com maestria a tradição e a renovação, o clássico e o contemporâneo, sem nunca perder a força da sua identidade“.

 

 

 

Link para o site Ernesto Nazareth 150 anos, do Instituto Moreira Salles.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

Site Cine Odeon

Site Ernesto Nazareth 150 Anos – Instituto Moreira Salles

Site Musica Brasilis

Youtube

 

Outros artigos publicados na Brasiliana Fotográfica sobre teatros e cinemas

 

Série O Rio de Janeiro desaparecido I Salas de cinema do Rio de Janeiro do início do século XXpublicado em 26 de fevereiro de 2016.

Os teatros do Brasil, publicado em 21 de março de 2016

A inauguração do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, publicado em 14 de julho de 2017

Série “O Rio de Janeiro desaparecido” XII – O Teatro Lírico (Theatro Lyrico), publicado em 16 de setembro de 2021

O Theatro de Santa Isabel, publicado em 28 de outubro de 2021

O Teatro Amazonas (Theatro Amazonas), em Manaus, a “Paris dos Trópicos”, publicado em 28 de dezembro de 2021

O Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, no Dia Mundial do Teatro, publicado em 27 de março de 2023

Dia do Cinema Brasileiro, publicado em 19 de junho de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXV – O Theatro Phenix, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado em 5 de setembro de 2023

O Theatro da Paz, em Belém do Pará, inaugurado em 15 de fevereiro de 1878, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado em 15 de fevereiro de 2024

A Floresta da Tijuca na Coleção Família Passos

Nesse artigo, o cientista político Paulo Celso Corrêa, do Museu da República, uma das instituições parceiras da Brasiliana Fotográfica, nos convida a um passeio pela Floresta da Tijuca nos primeiros anos do século XX, a partir de visitas que o ex-prefeito do Distrito Federal, Francisco Franco Pereira Passos (1836-1913), fazia ali com sua família e convidados. A Floresta da Tijuca é uma das principais áreas verdes urbanas do mundo, com 33 km2 e 3.953 hectares. Desde 1961, integra o Parque Nacional que reúne as demais florestas do Maciço da Tijuca, com abrangência sobre as zonas oeste, norte e sul da cidade do Rio de Janeiro.

 

A Floresta da Tijuca na Coleção Família Passos

Paulo Celso Corrêa*

 

O patrimônio natural e histórico da Floresta da Tijuca, produto e testemunha da história da ocupação humana na região, inspirou a produção de diversos registros fotográficos ao longo dos séculos XIX e XX, alguns dos quais já mostrados aqui no portal Brasiliana Fotográfica, no artigo A Floresta da Tijuca no Dia Mundial do Meio Ambiente, publicada em 5 de junho de 2019.

As fotos a seguir ampliam o escopo desses registros ao retratar diferentes aspectos da Floresta da Tijuca durante as visitas que o ex-prefeito do Distrito Federal, Francisco Franco Pereira Passos (1836-1913), fazia ali com sua família e convidados. As fotos são de autoria de Augusto Malta (1864 – 1957), foram produzidas entre 1904 e 1906, e pertencem à Coleção Família Passos do Arquivo Histórico do Museu da República.

 

 

A Floresta da Tijuca é o resultado de uma grande obra de reflorestamento iniciada em 1861 pelos seus primeiros administradores, o major Manuel Gomes Archer (1821 – 1907) e o Barão d’Escragnolle (1821 – 1888). Desde fins do século XVIII, a vegetação original que cobria o Maciço da Tijuca havia sido devastada pelas plantações de café e pelas queimadas para produção de carvão. Com isso, as fontes de água potável da região, que abasteciam a cidade, ficaram ameaçadas de secar. A recuperação da floresta começou com a desapropriação das fazendas de café e o plantio de sementes e mudas de árvores nativas e exóticas. O projeto do paisagista francês Auguste Glaziou (1833 – 1906) transformou a floresta num parque, com a abertura de estradas cavalgáveis, fontes, lagos, pontes e áreas de lazer como o mirante do Excelsior, a gruta Paulo e Virgínia e a Vista do Almirante.

Tão logo o verde voltou a tomar conta dos altos tijucanos, as fazendas de café deram lugar às chácaras de nobres e burgueses, atraídos pelo sossego e clima fresco semelhante ao de Petrópolis. A Floresta da Tijuca se tornou o lugar favorito de quem, a exemplo dos integrantes da Família Real brasileira, buscava “passeios pitorescos e pic-nics restauradores” como os prometidos em um anúncio do Almanak Laemmert, de 1897:

 

 

As ações tomadas pela gestão de Francisco Pereira Passos na prefeitura do Distrito Federal entre 1902 e 1906 buscaram tornar a Floresta da Tijuca melhor sinalizada, transitável e atrativa aos praticantes do que se chamava à época de “excursionismo” – o hábito de sair de casa, na cidade, para apreciar a natureza, fazendo passeios e piqueniques. Antes, como engenheiro, Passos já havia trabalhado em outro projeto relacionado ao aproveitamento das florestas e montanhas do Maciço da Tijuca para fins recreativos e turísticos: a construção da estrada de ferro ligando o Cosme Velho ao Corcovado, inaugurada em 1885.

As primeiras iniciativas da reforma urbana de Passos para a Floresta da Tijuca foram a reconstrução, em saibro, da estrada que ligava a rua Conde de Bonfim ao Alto da Boa Vista e, neste, a criação de uma praça – atual praça Afonso Viseu – com jardim projetado pelo paisagista francês Paul Villon (1841 – 1905). Nela foi construído um coreto de música oferecido pela Companhia Ferro-Carril de São Cristóvão, que operava a linha de bonde do Largo de São Francisco até o Alto da Boa Vista. O quiosque ali existente foi demolido e substituído por um restaurante de arquitetura em estilo norueguês, mais afinado aos critérios burgueses de higiene e bom-gosto. Um dos traços da reforma Passos foi o combate aos quiosques que, servindo comidas e bebidas a trabalhadores, desocupados e demais integrantes das camadas pobres da sociedade, eram qualificados como focos de desordem e sujeira. Agindo de tal modo, o poder público assegurava então que a Floresta da Tijuca continuasse a ser um espaço moldado ao gosto das classes dominantes e que, na esteira das transformações urbanas promovidas na capital federal, fosse capaz de atrair visitantes e turistas. O coreto, o jardim e o restaurante aparecem nesses dois postais, que reproduzem fotos de Augusto Malta.

 

 

 

A inauguração da praça aconteceu em 12 de outubro de 1903 e contou com a presença do presidente Rodrigues Alves, conforme noticiou o Jornal do Brasil na matéria Alto da Boa Vista, publicada no dia seguinte. Na mesma ocasião, foram inauguradas a Mesa do Imperador reformada e o novo pavilhão oriental da Vista Chinesa.

No lugar conhecido como Mesa do Imperador, onde se supõe que a Família Real fazia suas refeições quando passeava pela Tijuca, a prefeitura fez construir um novo caramanchão e grades rústicas para melhor abrigar os piqueniques. A seguir, a foto de Augusto Malta mostra a Mesa do Imperador com essas novidades, em 1903; e o cartão postal (sem data) registra Passos e um grupo majoritariamente feminino, que inclui sua esposa Maria Rita, posando diante de uma placa na qual se lê o nome do lugar, a sua altitude e a sigla PM de “Prefeitura Municipal”.

 

 

 

Mais adiante se chega à Vista Chinesa, lugar assim chamado desde meados do século XIX em alusão aos trabalhadores chineses que cultivavam chá nas antigas fazendas da região. Na gestão de Pereira Passos, foi erguido ali um novo pavilhão em forma de pagode (torre típica dos templos budistas asiáticos), com estrutura de argamassa imitando bambu e uma mesa de piquenique. O projeto foi de autoria do arquiteto Luiz Rey. Desse mirante, inaugurado em 1903, se podia ver o Corcovado (ainda sem o Cristo Redentor), o Pão de Açúcar, a Baía de Guanabara, a Lagoa Rodrigo de Freitas e um pouco de Niterói. A foto seguinte mostra o pavilhão ainda em um estágio primário de construção.

 

 

As fotos abaixo registram uma visita de Passos à Tijuca, realizada em 19 de abril de 1906, com a finalidade de verificar os reparos feitos nas estradas da região, danificadas após fortes chuvas. A visita foi noticiada na seção “Prefeitura” do Jornal do Brasil de 20 de abril de 1904, na sétima coluna. Também integravam a comitiva Jerônimo Coelho, diretor municipal de Obras e Viação, e Manuel Maria Del Castilho, superintendente do Serviço de Limpeza Pública e Particular. As fotos de Malta mostram o grupo na Estrada da Vista Chinesa, em meio a um corredor de bambus; e na Estrada do Pica-Pau, destacando a presença da Pedra da Gávea ao fundo e alguns aspectos da comunidade local, como um armazém de secos e molhados e uma escola pública.

 

 

 

 

 

Nas fotos a seguir, datadas de 8 de julho de 1906, Passos e um grupo de homens aparecem em passeio à Mesa do Imperador, à Vista Chinesa e ao Rio das Furnas. Na foto abaixo, Malta destacou a Mesa do Imperador com as inovações inauguradas três anos antes. Pereira Passos aparece no canto direito, conversando com dois homens sentados na cerca rústica.

 

 

Posicionado no pavilhão da Vista Chinesa, Augusto Malta fotografou Passos e seus convivas, observados ao fundo por um adulto e uma criança descalços, provavelmente trabalhadores encarregados de manter a estrada em boas condições. O homem à direita de Pereira Passos segura um binóculo, instrumento necessário à melhor contemplação da paisagem oferecida pelo mirante. Na imagem é possível ver a traseira de um automóvel, veículo cada vez mais presente nas ruas das principais cidades brasileiras a partir dos primeiros anos do século XX. O carro, ainda privilégio daqueles com bastante dinheiro para pagar pela sua importação, facilitava subir as estradas da Floresta da Tijuca; por outro lado, também contribuía para este novo acontecimento da vida urbana, o acidente automobilístico, como o que aconteceu nas proximidades da Vista Chinesa, conforme noticiado pela Revista da Semana de 16 de junho de 1907.

 

 

O mesmo grupo de homens aparece noutra foto, produzida no mesmo passeio, à beira do Rio das Furnas.

 

 

Já o cartão postal abaixo foi feito a partir de foto de Augusto Malta do dia 14 de junho de 1904, durante a excursão oferecida pela prefeitura aos delegados brasileiros da Convenção Sanitária Internacional entre o Brasil, a Argentina e o Uruguai, encerrada no dia anterior. No canto esquerdo da imagem está a esposa do prefeito, Maria Rita Passos,  na Vista Chinesa. A convenção teve a finalidade de unificar protocolos de combate e prevenção à epidemias entre os três países. O sanitarista Oswaldo Cruz (1872 – 1917), então Diretor-Geral de Saúde Pública do Distrito Federal, integrava a delegação brasileira, mas não participou do passeio tijucano. Desde o ano anterior, Cruz vinha aplicando uma série de novas e polêmicas medidas para o combate à febre amarela e à peste bubônica, como os batalhões de mata-mosquitos e a compra de ratos. Naquele momento a cidade passava por um grave surto de varíola, o que em breve levaria o governo federal a propor a lei de vacinação obrigatória contra a doença, episódio que culminaria na Revolta da Vacina, em novembro de 1904.

 

 

Abaixo, os participantes da excursão posam para foto na escadaria do Hotel White, antigo Palacete do Conde de Boa Vista. O Jornal do Brasil do dia 15 de junho deu notícia do acontecimento na matéria No Alto da Boa Vista.

 

 

Situado no Alto da Boa Vista, o Hotel White aparece em várias outras fotos dessa série. Isso porque as recepções oferecidas aos figurões da política, dos negócios e da cultura que visitavam a cidade do Rio de Janeiro costumavam incluir passeios à Floresta da Tijuca e refeições num dos hotéis de luxo existentes na região. O palacete neoclássico que servia como edifício principal do Hotel White foi construído em meados do século XIX para o Conde de Itamaraty, sob projeto do arquiteto José Maria Jacinto Rebelo (1821 – 1871), responsável também por parte do Palácio do Itamaraty, no centro do Rio. Posteriormente, o hotel foi renomeado em homenagem ao primeiro proprietário, como se vê no anúncio publicado na revista Careta de 24 de janeiro de 1914. O palacete é tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural desde 1979.

 

 

As fotos abaixo foram produzidas por Augusto Malta no jardim do Hotel White, em 17 de dezembro de 1905. Fazem parte de um pequeno álbum que reúne fotos descontraídas do engenheiro Francisco Oliveira Passos (1878 – 1958), filho do prefeito e então consultor técnico da prefeitura, posando e fumando com um grupo de homens, dentre os quais o escritor e diplomata Graça Aranha (1868 – 1931) e o diretor da Limpeza Pública, Manoel Maria Del Castilho (1856 – 1911). A fotografia do grupo no coreto da praça do Alto da Boa Vista foi depois transformada em postal, enviado a Oliveira Passos pelo próprio Malta no Natal de 1905.

 

 

 

As fotos abaixo, também no Hotel White, mostram cenas da visita de Elihu Root (1845 – 1937), Secretário de Estado dos Estados Unidos, à Floresta da Tijuca. Em agosto de 1906, Root veio ao Rio de Janeiro participar da Terceira Conferência Pan Americana, iniciada em 25 de julho no Palácio Monroe, com a participação de representantes de dezenove países da América. Root chegava ao Brasil como representante da política externa do “Corolário Roosevelt”, oficializada pelo presidente estadunidense Theodore Roosevelt (1858 – 1919), em 1904, que justificava as intervenções militares “preventivas” dos Estados Unidos em outros países no caso de perturbação da ordem e desrespeito aos contratos. O Brasil, no entanto, não se via ameaçado pelo chamado “Grande Porrete”. A política externa brasileira dirigida pelo Barão do Rio Branco (1845 – 1912) considerava o poderio do país norte-americano um fator de proteção contra o intervencionismo europeu e um aliado na promoção dos interesses brasileiros no sul do continente.

As esperanças do governo brasileiro manifestaram-se no entusiasmo com que Root foi recebido no país. Sua despedida da capital federal, no dia 3 de agosto de 1906, foi marcada por um passeio à Floresta da Tijuca, organizado por Pereira Passos e por Joaquim Nabuco (1849 – 1910), embaixador nos Estados Unidos e chefe da delegação brasileira na Conferência. Na primeira foto aparecem Nabuco, Maria Rita Passos e as senhoritas Teixeira Castro num dos automóveis da excursão, que passou pelo Mirante Excelsior, Gruta Paulo e Virgínia, Vista Chinesa, Estrada de Furnas e pelas Furnas de Agassiz. O encontro incluiu um almoço no Hotel White (Jornal do Brasil, 4 de agossto de 1906, sétima coluna).

 

 

 

A vinda de Root, primeira viagem oficial de um secretário de Estado dos Estados Unidos ao exterior, foi interpretada pelos entusiastas da modernidade republicana como indício da inclusão do Brasil no seleto grupo dos países “civilizados”. O mesmo se deu com a chegada ao Rio da turnê internacional de uma prestigiosa atriz do teatro europeu, a italiana Tina Di Lorenzo (1872 – 1930). Ela veio ao Rio com sua companhia teatral apresentar um repertório de peças famosas que incluía Romeu e Julieta, de Shakespeare; Casa Paterna, de Hermann Sudermann e A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas, dentre outros sucessos. E, como de costume, ela também foi convidada pelos Passos a conhecer a Floresta da Tijuca, junto de seu marido, o também ator teatral Armando Falconi (1871 – 1954) (Revista da Semana, 3 de junho de 1906).

Nas fotos a seguir, o grupo aparece fotografado diante das Furnas de Agassiz, conjunto de grutas e cavernas cujo nome faz referência ao naturalista suíço Louis Agassiz (1807 – 1873), que as estudou quando viajou pelo Brasil entre 1865 e 1866. Tina e o marido posam juntos diante da gruta principal das Furnas, formada por um conjunto de rochas superpostas. Noutra foto é possível ver os carros que levaram o grupo até o local e, na paisagem ao fundo, a Pedra da Gávea. Outro local visitado durante o passeio foi a Gruta de Paulo e Virgínia, batizada em referência ao romance francês Paulo e Virgínia, de Bernardin de Saint Pierre, muito famoso durante o século XIX (O Malho, 30 de junho de 1906).

 

 

 

 

 

* Paulo Celso Liberato Corrêa é cientista político do Arquivo Histórico e Institucional do Museu da República.

 

Fontes: 

ABREU, Alzira Alves de (coord.). Dicionário Histórico-Biográfico da Primeira República (1889-1930). Rio de Janeiro: Editora FGV, 2015.

AGASSIZ, Elizabeth Carey & AGASSIZ, Louis. Viagem ao Brasil 1865-1866. Brasília: Senado Federal, 2000.

CRULS, Gastão. Aparência do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1965.

GERSON, Brasil. História das ruas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora Bem-te-vi, 2015.

SEVCENKO, Nicolau. A revolta da vacina. São Paulo: Editora Scipione, 1993.

Cronologia de Augusto Malta (1864 – 1957)

 Cronologia de Augusto Malta (1864 – 1957)

1864 – Em 14 de maio, Augusto Cesar Malta de Campos nasceu em Mata Grande, Alagoas, filho do escrivão Claudino Dias de Campos e Blandina Vieira Malta de Campos. Foi batizado em 5 de junho, na matriz de Nossa Senhora de Mata Grande.

1886 – Deixou de morar com o padre Antonio Marques de Castilho, com quem havia ido residir por decisão de seu pai, que queria que ele seguisse a carreira religiosa. Alistou-se no Exército, no Recife. Pretendia seguir a carreira militar, mas, posteriormente, quando cumpriu o prazo de tempo de serviço, foi dispensado.

1887 - Serviu no Exército como cadete sargento. Tornou-se republicano e participou com estudantes de encontros revolucionários.

1888 – Em maio, participou, ainda no Recife, de manifestações a favor da abolição da escravatura.

No fim desse ano, chegou ao Rio de Janeiro. Seu primeiro emprego na cidade foi o de auxiliar de escrita da Casa Leandro Martins, localizada na rua dos Ourives, atual rua Miguel Couto.

1889 - Foi promovido a guarda-livros.

Participou dos acontecimentos de 15 de novembro de 1889, quando foi proclamada a República no Brasil e, no dia seguinte, foi um dos signatários do termo de juramento lido na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, dando posse ao governo provisório republicano.

1890 – Por volta desse ano, Augusto Malta visitou a família, em Alagoas, e trouxe, para o Rio de Janeiro, seus irmãos Alfredo e Joaquim Pópolo. Seus irmãos Fernando e Teófilo vieram para o Rio um pouco depois.

Casou-se com sua prima distante, a alagoana Laura Oliveira Campos. O casal teve cinco filhos: Luthgardes (1896-?), Arethusa (1898-1913), Callisthene (1900-1919), Aristocléa (1903-1934), afilhada do prefeito Pereira Passos; e Aristógiton (1904-1954). Todas as filhas do casal morreram de tuberculose.

Durante a década de 1890, abriu casas comerciais, mas não foi bem sucedido. Fundou uma loja de secos e molhados, a Casa Ouvidor, na rua de mesmo nome, mas teve que fechá-la. Depois, instalou outra loja de secos e molhados, na rua Larga de São Joaquim, atual avenida Marechal Floriano, que também não prosperou. Começou, então, a vender tecidos finos.

1900 – Em agosto, foi criado, entre os sócios do Congresso Commercial, o Grupo de Velocemen com o objetivo de organizar passeios ciclísticos pela cidade. Augusto Malta foi aclamado secretário da agremiação (Semana Sportiva, 25 de agosto de 1900, na seção “Velocipedia”).  Foi noticiado o passeio ciclístico inaugural do grêmio velocipédico (Semana Sportiva, 29 de setembro de 1900, na seção “Velocipedia”).

Um dos clientes de Malta, um aspirante da Marinha, propôs que ele trocasse a bicicleta, que usava para entregar encomendas de tecidos, por uma máquina fotográfica. No início, Malta não aceitou, mas dias depois concordou com a troca. Continuou a vender fazendas, a pé, e começou, então, a se interessar por fotografia. Aos domingos, saía para tirar fotografias com um amigo, também fotógrafo amador.

1903 – Foi apresentado pelo empreiteiro Antônio Alves da Silva Júnior, fornecedor da Prefeitura do Rio de Janeiro, que já havia visto suas fotografias, ao prefeito, Francisco Pereira Passos (1836-1913), que promovia uma grande reforma urbana na cidade, que ficou conhecida como o “bota-abaixo”. Ele precisava de um fotógrafo para registrar as obras e os imóveis a serem desapropriados para posteriores pagamentos de indenizações. Em 27 de junho, pelo Decreto Municipal 445, Augusto Malta foi nomeado fotógrafo da Prefeitura do Distrito Federal. O cargo foi criado para ele e era subordinado à Diretoria Geral de Obras e Viação da Prefeitura. Trabalhou durante 33 anos para a Prefeitura do Rio de Janeiro.

1904 – Fotografou a comemoração do Dia do Trabalho, promovida por Domingo Rodrigues Pacheco e Antônio Alves da Silva Júnior, proprietários das pedreiras situadas à rua Conselheiro Bento Lisboa (Correio da Manhã, 02 de maio de 1904, sob o título “Um almoço”). Este último foi quem apresentou Malta a Pereira Passos.

Malta um dos fundadores da Sociedade Cartophila Emanuel Hermann, uma associação incentivadora da divulgação de cartões-postais.

Foi realizada no escritório do jornal Correio da Manhã uma exposição com as fotos que Malta produziu da Batalha de Flores, e de outras de sua autoria (Correio da Manhã, 29 de setembro de 1904, quarta coluna).

1905 – O então prefeito Pereira Passos, na Mensagem enviada ao Conselho Municipal, chamava atenção para a importância do trabalho realizado no laboratório fotográfico da Diretoria de Obras e Viação pela verificação que permitirá aos vindouros da transformação que operam na cidade com os melhoramentos ora em execução.

No dia 7 de novembro, ocorreu um incêndio de grandes proporções no Centro do Rio de Janeiro, entre as ruas do Lavradio, da Relação, dos Inválidos e do Rezende. O laboratório e a residência de Malta, localizados na rua do Lavradio, nº 96, foram atingidos. Ele e a família conseguiram escapar apenas com a roupa do corpo (O Paiz, 8 de novembro de 1905, sob o título “Pavoroso Incêndio). Na ocasião, foram destruídos cerca de quinhentos clichês da coleção de Malta de pontos demolidos ou desaparecidos da cidade do Rio de Janeiro, devido à reforma urbana promovida pela Prefeitura.

Foi contratado pela The Rio de Janeiro Tramway, Light and Power Company Limited – que ficaria popularmente conhecida como Light. Ao longo dos anos, prestando serviços para a empresa, Malta fotografou as atividades modernizadoras da Light no Rio de Janeiro, como a implantação dos bondes elétricos e da iluminação pública.

1906 – Faleceu sua esposa, Laura Oliveira Campos. Augusto Malta passou a viver maritalmente com Celina Augusta Verschueren (1884 – 19?), que trabalhava desde os 15 anos como babá dos filhos de Malta e Laura. Com Celina, Malta teve mais quatro filhos: Dirce (1907 – ?), Eglé (1909 – ?), Uriel (1910 – 1994) e Amaltéa (1912 – 2007).

Fotografou a Conferência Internacional Pan Americana, inaugurada, no Rio de Janeiro, em 23 de julho. Durante o evento, conheceu Joaquim Nabuco, na época representante do Brasil nos Estados Unidos. Tornaram-se amigos.

Em setembro, feriu sua mão esquerda fazendo experimentos com a câmara escura (Correio da Manhã, 12 de setembro de 1906,a primeira coluna, abaixo de “Assistência à Infância”).

Obteve a carta patente de major da Guarda Nacional assinada pelo então presidente da República, Afonso Pena (1847-1909). 

Foi identificado como major, além de fotógrafo da Prefeitura, quando fez uma visita ao ministro da Justiça e Negócios Interiores, Felix Gaspar de Barros e Almeida (1865 – 1907), que foi fotografado por ele (Correio da Manhã, 26 de setembro de 1906, na seção “Do Maranhão”, na sexta coluna).

1907 – Participou com fotografias que documentavam as transformações do Rio de Janeiro da Terceira Exposição do Photo-Club e primeira do Salão Livre de Belas Artes, promovida pelo Photo-Club. A mostra, realizada no Museu Commercial, na avenida Central, contava com 170 fotografias e 142 pinturas (Gazeta de Notícias, 13 de agosto de 1907, sob o título “Nossos Artistas”). Ganhou o terceiro prêmio na categoria de profissionais. O júri não considerou nenhum dos trabalhos merecedores do 1º e 2º lugares (O Paiz, 28 de agosto de 1907, abaixo da propaganda “Retalhos e Saldos”).

Malta apareceu em duas fotos da revista O Malho. Na primeira, de 3 de agosto de 1907, foi fotografado durante a queima das listas e cadernetas que serviram para o recenseamento feito pelo ex-prefeito Pereira Passos. Na edição de 10 de agosto, foi fotografado participando da inauguração oficial, pela Light and Power, do serviço de distribuição de energia elétrica, produzida por motor hidraúlico, no Rio de Janeiro.

1908 – Colaborou com fotografias na revista Exposição Nacional, edição especial da Revista da Época, fundada por Carlos Vianna.

1909 –  A Prefeitura, através da Diretoria de Estatística, ilustrou o guia La ville de Rio de Janeiro et ses environs com algumas de suas fotografias.

Foi extinto o cargo de Malta, que ficou adido à Subdiretoria de Serviços da Carta Cadastral, na Diretoria de Obras e Viação. Prestou, então, serviços particulares de fotografia para o ex-prefeito Pereira Passos.

Malta encontrou os equipamentos fotográficos que haviam sido roubados de sua casa (A Notícia, 26 de agosto de 1909, sob o título “Apprehensão de Furto“).

Passou a ser sócio efetivo do Centro Alagoano (O Século, 7 de outubro de 1909, sob o título “Centro Alagoano“).

Com o prefeito do Rio de Janeiro, Serzedelo Correa (1858-1932), visitou a Villa Ipanema e participou da inauguração da área de diversões da Brahma (O Paiz, 29 de novembro de 1909, sob o título “Villa Ipanema”).

1910 - Criou o Centro Fotográfico de Propaganda no Brasil.

Por ordem do prefeito Serzedelo Correa, foi posto à disposição da comissão de inspeção escolar (Gazeta de Notícias, 6 de agosto de 1910, na seção “Prefeitura“).

1911 – Em junho, fotografou o presidente da República, Hermes da Fonseca (1855 – 1923).

Foi autorizado pelo prefeito do Rio de Janeiro, Bento Ribeiro (1856-1921), a organizar a galeria dos ex-prefeitos (Gazeta de Notícias, 10 de julho de 1911, na seção “Prefeitura“).

Em outubro, lançou, em edição de autor, o Álbum geral do Brasil, primeiro fascículo de uma coleção de fotos do Rio de Janeiro e de outras cidades brasileiras.

1913 – O prefeito Bento Ribeiro recriou o cargo de fotógrafo oficial da Prefeitura e Malta foi reconduzido à sua antiga posição.

1914 - No Palácio da Guanabara, retratou o presidente da República, Wenceslau Brás (1868-1966) (Gazeta de Notícias, 14 de dezembro de 1914, última notícia da terceira coluna).

1919 – Foi inaugurada a nova sede do Centro Alagoano, sob a direção de Augusto Malta, na rua São José nº 34 (Gazeta de Notícias, 9 de março de 1919).

Com uma nota ilustrada com foto, foi noticiado o aniversário de Augusto Malta (Gazeta de Notícias 14 de maio de 1919).

1922 - Pela primeira vez, devido ao acúmulo de trabalho ocasionado pela Exposição do Centenário da Independência, Malta contratou um ajudante – seu irmão, Teófilo.

1925 – Quando prestava um serviço para a Sul América, uma explosão ocasionada pelo flash de sua máquina fotográfica dilacerou um de seus dedos. Malta foi operado e ficou internado no Hospital da Ordem Terceira da Penitência. Seu filho, Aristógiton, começou a auxiliá-lo na Prefeitura.

1930 – Ao longo dessa década, suas fotos ilustraram artigos de Ulysses de Aguiar, um dos pseudônimos de Luiz Gastão d’ Escragnolle Dória (1869-1948), na Revista da Semana, e também de outros autores (Revista da Semana, 2 de fevereiro de 1935, 2 de março de 193527 de julho de 193522 de outubro de 1938).

Em 13 de maio, foi inaugurada, na Associação Brasileira de Imprensa, uma exposição individual de fotografias de Augusto Malta, “O Rio de Janeiro Antigo”.

1931 -1932 –  A Diretoria Geral de Obras e Viação foi substituída pela Diretoria Geral de Engenharia e Malta começou a organizar o arquivo histórico e fotográfico dos serviços executados. Começou então a fornecer ao Arquivo Público as fotografias relativas ao desenvolvimento da cidade ou de cerimônias realizadas.

1936 – Malta deu uma entrevista sobre a extinção dos quiosques no Rio de Janeiro (Correio da Manhã, 10 de janeiro de 1936). Uma semana depois, um leitor contestou a entrevista (Correio da Manhã, 17 de janeiro de 1936, na última coluna, sob o título “Os velhos kiosques do Rio de Janeiro”).

Foi concedida a ele, pela Associação Brasileira de Imprensa, a carteira de jornalista profissional (Diário Carioca, 4 de abril de 1936).

O jornal O Globo de 1° de agosto, publicou uma matéria sobre a elegância de Malta e comentou o fato dele ter lançado a moda dos óculos de aro de tartaruga. Comentou, também, que ele sempre usava um panamá de fita preta. Sempre sem colete, ao pescoço esvoaçava e ainda esvoaça como borboleta uma gravata de laço preto.

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O Globo, 1º de agosto de 1936

O Globo, 1º de agosto de 1936

 

 

Em 25 de agosto, Augusto Malta aposentou-se da Prefeitura e foi substituído por seu filho, Aristógiton, a partir de 9 de setembro do mesmo ano. Posteriormente, seu outro filho, Uriel, passou a trabalhar com o irmão. Augusto Malta continuou a trabalhar como fotógrafo.

Foi um dos colaboradores da homenagem que o Diário de Notícias publicou na ocasião do centenário do ex-prefeito Pereira Passos (Diário de Notícias, 29 de agosto de 1936). Com a publicação de uma foto de Malta, o suplemento do jornal A Noite agradeceu a Malta por ter facilitado singularmente o trabalho de reminiscência fotográfica da remodelação da cidade em uma matéria publicada pelo periódico na ocasião do centenário de Pereira Passos (A Noite, 1º de setembro de 1936).

Malta foi um dos homenageados por serviços prestados ao Centro Alagoano, na ocasião da comemoração do 119º aniversário da emancipação de Alagoas e do 49º aniversário da associação (A Offensiva, 16 de setembro de 1936, na última coluna, sob o título “Emancipação política do Estado de Alagoas”).

1937 - Participou, como escrutinador, das eleições da Associação Brasileira de Imprensa (Correio da Manhã, 4 de maio de 1937, na terceira coluna).

1938 – Foi publicada uma reportagem sobre Augusto Malta. Nela, Malta comentou ter produzido a foto do Barão de Rio Branco (1845 – 1912) de costas por sugestão do escultor Rodolfo Bernardelli (1852 – 1931) (Diário da Noite, 13 de janeiro de 1938).

O jornal Diário da Noite sugeriu que a Prefeitura adquirisse o arquivo fotográfico de Malta (Diário da Noite, 2 de março de 1938, na última coluna, sob o título “Uma suggestão do Diário de Noite”).

Tornou-se sócio honorário do Centro Carioca (O Imparcial, 29 de junho de 1938, sob o título “A grande Assembléa Geral do Centro Carioca”).

Foi lançado o livro O Rio de Janeiro de meu tempo, de Luiz Edmundo, ilustrado com fotos de diversos fotógrafos, dentre eles, Malta (O Jornal, de 28 de agosto de 1938).

O presidente da República, Getulio Vargas (1882 – 1954), visitou a “Feira de Amostras”,  uma exposição de diversas secretarias da Prefeitura do Rio de Janeiro. Um dos stands de maior sucesso foi o da Secretaria de Viação, Trabalho e Obras Públicas, que expôs fotos de Augusto Malta e de seu filho, Aristógiton (A Noite, 31 de outubro de 1938, sob o título “A evolução do Rio através da fotografia”).

1939 – O Diário da Noite publicou uma fotografia de autoria de Malta, de 1907, em que o escritor Machado de Assis foi retratado tendo uma síncope e sendo socorrido por populares no Cais Pharoux (Diário da Noite, 21 de junho de 1939).

1940 – Durante essa década, suas fotos ilustram vários artigos de Luiz Gastão d’ Escragnolle Dória (1869-1948) na Revista da Semana.

Foi morar em Niterói e anunciou a venda de alguns de seus quadros (Correio da Manhã, 8 de fevereiro de 1940, na primeira coluna, sob o título “Photographias do Rio Antigo”).

1941 – Vende para a Biblioteca Nacional 280 fotos distribuídas em vários álbuns.

Na coluna assinada por Roberto Macedo, intitulada “Notas Históricas – A Primeira Posse Republicana”,  no Correio da Manhã, Augusto Malta foi citado como um dos signatários do termo de juramento lido na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, em 16 de novembro de 1889, dando posse ao governo provisório republicano (Correio da Manhã, 24 de outubro de 1941, sétima coluna).

1942 – Vendeu fotografias para o Museu Paulista.

Foi a uma missa de Ação de Graças pelo restabelecimento da saúde do presidente do Brasil, Getulio Vargas (1882-1954), realizada na igreja Nossa Senhora da Glória do Outeiro (O Jornal,  27  de agosto de 1942).

Sofreu uma intervenção cirúrgica (O Jornal, 26 de setembro de 1942, na seção “Notas Mundanas”).

1943 – Malta apoiou a iniciativa de presentear-se os condutores de bondes no Natal (Gazeta de Notícias, 24 de novembro de 1943).

Em reportagem sobre o Barão do Rio Branco (1845 – 1912), foram publicadas várias fotos de autoria de Augusto Malta (Illustração Brasileira, outubro de 1943)

1944 – Malta foi roubado por uma ladra na barca entre o Rio de Janeiro e Niterói (Correio da Manhã10 de fevereiro de 1944, na seção “O Dia Policial”).

Na edição de natal da Revista da Semana, de 16 de dezembro de 1944, foi descrito como um nortista tipo perfeito da classificação conhecida: braquicéfalo, altura mediana, maxilares salientes, olhos amendoados como os de um mongol. Na verdade, visto de perfil, parece-se com um soldado de Chiang-Kai-Chek, que tivesse abandonado a farda… Há cinquenta anos usa uma gravata borboleta, dessas preferidas pelos pintores e poetas do século passado.

1945 – Malta foi comparado a Marc Ferrez (Boletim da Sociedade de Geographia do Rio de Janeiro, 1945): A documentação fotográfica e de gravuras era, como se vê, abundante e valiosa, oriunda de desenhos de Rugendas e outros, e de fotografias de Marc Ferrez, que desempenhou no Império a função que mais tarde seria, no Rio, exercida por Augusto Malta, fotógrafo da Prefeitura: de documentador pela imagem dos principais acontecimentos de seu tempo”. 

No Jornal do Brasil, de 11 de fevereiro de 1945, Malta é comparado a José de Alencar, no artigo “A velha e nobre Tijuca”, de Everardo Backheuser: “José de Alencar em Sonhos d´Ouro foi para a Tijuca das cercanias da Guerra do Paraguai o que Augusto Malta representa para o Rio de Janeiro do tempo de Pereira Passos. Cada qual ao seu modo gravou de maneira indelével as recordações do “quadro geográfico” da respectiva era. Graças a Malta, eu e outros temos podido documentar asserções sobre a geografia carioca do princípio do século. José de Alencar vai me servir para ilustrar com exemplos fatos da geografia da Tijuca daqueles afastados tempos. Em artigos posteriores, Backheuser voltou a elogiar o trabalho de Malta.

1946 - Foi noticiado que Augusto Malta teve sua carteira roubada em um bonde no Rio de Janeiro (O Fluminense, 21 de agosto de 1946, sob o título “Cuidado com os batedores de carteiras”).

1947 - Em seu aniversário, foi homenageado pelos jornalistas credenciados junto ao gabinete do prefeito (A Noite, 14 de maio de 1947, na coluna “Sociedade”).

1948 – Publicação da reportagem Centenário de Rodrigues Alves, com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta (O Cruzeiro, 17 de julho de 1948).

Publicação da reportagem Biografia da cidade – Largo da Carioca, com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta e Ângelo Regato (O Cruzeiro, 16 de outubro de 1948).

1949 – Publicação da reportagem Centenário de Joaquim Nabuco, com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta, identificado como o fotógrafo mais antigo do Brasil (O Cruzeiro, 20 de agosto de 1949).

Publicação da reportagem Rui na intimidade, com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta e Aristogiton Malta (O Cruzeiro, 12 de novembro de 1949).

1950 – Foi internado na Ordem Terceira da Penitência (A Manhã, 19 de janeiro de 1950, na seção “Mundo Social”).

Publicação da reportagem Banho de mar – 1915, com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta (O Cruzeiro, 22 de abril de 1950).

Por ocasião de seu aniversário, foi saudado como o mais velho repórter fotógrafo do Brasil (A Manhã, 13 de maio de 1950, na seção “Mundo Social“).

Na edição de O Cruzeiro, de 9 de setembro de 1950foi publicada a matéria Biografia da cidade – Do Convento da Ajuda às luzes da Cinelândia , com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta e Luciano Carneiro. Contava a história da Cinelândia e as  fotos antigas que ilustraram a reportagem foram produzidas por Malta, em 1911. São do Convento da Ajuda, de sua demolição e do terreno que ocupava, após a demolição; e do edifício do antigo Conselho Municipal. As fotografias abaixo estavam entre as que foram publicadas na reportagem.

 

 

 

 

1951 – Publicação da reportagem Biografia da Cidade – O Flamengo e suas ressacas, com texto de Raymundo Athayde e fotos de Augusto Malta (O Cruzeiro, 12 de maio de 1951).

1952 – Ao longo desse ano, a coluna “Transformações da Cidade”, do jornal Correio da Manhã, foi ilustrada com fotos de Malta.

Também a partir desse ano até 1955, a coluna “Rio Antigo”, de Charles Julius Dunlop (1908 – 1997), no mesmo jornal, foi, muitas vezes, ilustrada por fotos de Malta. Charles Dunlop e Malta haviam se conhecido na época em que Malta prestava serviços para a Light, empresa na qual Dunlop começou a trabalhar na década de 20.

1953 – Foi publicada uma fotografia dos arquivos de Augusto Malta sobre os banhos a fantasia do carnaval carioca (Diário da Noite, 14 de fevereiro de 1953).

Para ilustrar uma matéria sobre Ipanema, foi publicada uma foto do bairro, produzida por Malta, em 1907 (Diário de Notícias, 27 de março de 1953).

Foi publicado o artigo O Jubileu do Bota Abaixo, sobre a radical reforma urbana promovida pelo prefeito Pereira Passos no Rio de Janeiro, de autoria do acadêmico Pedro Calmon, com fotos de Augusto Malta (Revista da Semana, 8 de agosto de 1953).

Como parte das comemorações da Quinzena do Jornalismo, foi um dos 35 decanos da imprensa premiados pelo Sindicato dos Jornalistas com o diploma de honra (Diário Carioca, 21 de novembro de 1953, sob o título “Jornalistas Veteranos”).

1955 - Foi publicada uma foto de jornaleiros em torno de um quiosque, de autoria de Augusto Malta,  sob o título de “O Rio da Velha Guarda” (Diário da Noite, 8 de março de 1955).

Na série “Rio de Amanhã”, escrita por Almir de Andrade, foi publicada uma foto de Ipanema de autoria de Malta (Diário de Notícias, 1º de maio de 1955).

No mesmo ano, foram publicadas pelo Diário de Notícias fotos antigas de Copacabana, do Lido e do Leblon, também de autoria de Malta.

Reportagem sobre o lançamento do livro Rio Antigo, do pesquisador Charles Dunlop. Publicado pela Editora Gráfica Laemmert Ltda, conta a história do Rio com fotos de Malta, Marc Ferrez (1843 – 1923), George Leuzinger (1813 – 1892) e E.A. Mortimer (18? – 19?) (Revista da Semana, 5 de novembro de 1955).

1957 – Foi publicada uma reportagem sobre o arquivo de fotografias de Augusto Malta, na coluna “Letras Vivas” (Diário da Noite, 30 de março de 1957).

Foi lançado o segundo fascículo da publicação Rio Antigo, do pesquisador Charles Dunlop, com ilustrações de Ângelo Agostini (1843 – 1910), reproduzidas da Revista Illustrada, e com fotos de Malta, Marc Ferrez (1843 – 1923)George Leuzinger (1813 – 1892)  e E.A. Mortimer (18? – 19?) (Careta, 4 de maio de 1957, sob o título “Documentário Militar no Rio Antigo”).

Em 30 de junho, morte de Augusto Malta, no Hospital da Ordem Terceira da Penitência, devido a uma insuficiência cardíaca. Foi sepultado no dia seguinte, no Cemitério do Caju (Correio da Manhã, 2 de julho de 1957, na seção “Prefeitura”).

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

As doenças do Rio de Janeiro no início do século XX e a Revolta da Vacina em 1904

No início do século XX, no Rio de Janeiro, providências em torno do combate de diversas doenças já provocavam grandes polêmicas. A campanha de combate à varíola resultou, em novembro de 1904, em uma revolta popular e militar, a Revolta da Vacina ou Quebra-Lampiões – um protesto contra a lei que tornava obrigatória a vacinação em massa contra a doença, instituída pelo prefeito Pereira Passos e colocada em prática pelo então Diretor Geral de Saúde Pública, Oswaldo Cruz, contratado para o cargo para combater a varíola, assim como a peste bubônica e a febre amarela, que grassavam na cidade. Vamos contar um pouco dessa história.

 

 

Em 30 de dezembro de 1902, por decreto, Francisco Pereira Passos (1836 – 1913) foi nomeado prefeito do então Distrito Federal, o Rio de Janeiro, pelo presidente Rodrigues Alves (1848 – 1919), que prometia marcar seu governo pela modernização e pelo saneamento. Assumiu no mesmo dia (Gazeta de Notícias, 31 de dezembro de 1902, na sexta coluna), sucedendo Carlos Leite Ribeiro (1858 – 1945). Ocupou o cargo até 16 de novembro de 1906, quando foi sucedido por Francisco Marcelino de Sousa Aguiar (1855 – 1935) (O Paiz, 17 de novembro de 1906, na sexta coluna). Durante seu mandato, o prefeito Pereira Passos realizou uma significativa reforma urbana na cidade.

Para saneá-la e modernizá-la realizou diversas demolições, conhecidas popularmente como a política do “bota-abaixo”, que contribuiu fortemente para o surgimento do Rio de Janeiro da Belle Époque, sendo a abertura da Avenida Central dos seus maiores símbolos, festejada em uma crônica de Olavo Bilac (1865 – 1918) (Kosmos, março de 1904) . Essas transformações foram definidas por Alberto Figueiredo Pimentel (1869-1914), autor da seção “Binóculo”, da Gazeta de Notícias, com a máxima “O Rio civiliza-se”, que se tornou o slogan da reforma urbana carioca. Foi também Pereira Passos que contratou, em 1903, o primeiro fotógrafo oficial da prefeitura, Augusto Malta (1864 – 1957), justamente para documentar todas essas inúmeras e radicais mudanças na cidade.

 

 

Mas as reformas urbanas não eram o bastante para mudar o perfil do Rio de Janeiro, na época uma cidade bastante insalubre, assolada por doenças e sem saneamento básico, certamente obstáculos para o estabelecimento de uma sociedade moderna e cosmopolita nos moldes das capitais europeias. Lembramos do caso do cruzador italiano Lombardia que aportou na cidade, em novembro de 1895, e teve grande parte de sua tripulação infectada pela febre amarela. O capitão-de-fragata e comandante do navio, Olivari, e outros tripulantes, faleceram da doença (O Paiz, 28 de novembro de 1895, quinta coluna; O Paiz, 15 de fevereiro de 1896, quarta coluna; O Paiz, 17 de fevereiro de 1896, quinta coluna; O Paiz, 25 de fevereiro, sexta coluna; O Paiz, 29 de fevereiro de 1896, sexta colunaO Paiz, 1º de março de 1896, penúltima coluna; O Paiz, 9 de março de 1896, quarta colunaO Paiz, 10 de abril de 1896, penúltima coluna).

O Rio de Janeiro era inclusive conhecido internacionalmente como “túmulo dos estrangeiros”, possivelmente devido a versos sobre o verão carioca atribuídos ao escritor suíço Ludwig Ferdinand Schmid (1823-1888), que havia sido cônsul no Rio de Janeiro na década de 1860:

Oh! sombra, sobre a imagem encantada / Cores escuras pousam sobre os campos e florestas / O mal da natureza paira, poderoso / Sobre a florida superfície tropical /O poder supremo/ Deste Império não é de nenhum Herodes / No entanto é a terra da morte diária / Túmulo insaciável do estrangeiro”.

Pereira Passos assumiu a prefeitura de uma cidade que no fim do Império tinha uma população de cerca de 500 mil habitantes e que atingira cerca de 700 mil pessoas em 1904. Ele aliou a reforma urbanística e arquitetônica da cidade – que incluiria a construção de um novo porto, de novas avenidas, o aterramento de praias, o desmonte de morros, a derrubada de casas e cortiços e o embelezamento de praças e jardins, que não deixou de ter seu lado excludente e criticado, deslocando parte da população do centro para o subúrbio e também contribuindo para o surgimento das favelas – a uma nova política higienista. Para implementar medidas sanitárias arrojadas foi nomeado pelo presidente Rodrigues Alves para a direção geral de Saúde Pública o jovem médico Oswaldo Cruz (1872 – 1917), que tomou posse em 23 de março de 1903. Ficou no cargo até 1909.

 

Oswaldo Cruz havia estudado microbiologia, soroterapia e imunologia no Instituto Pasteur, e medicina legal no Instituto de Toxicologia, na França, entre 1897 e 1898. Quando voltou ao Brasil, tomou posse, em 24 de agosto de 1899, na Academia Nacional de Medicina, e, em 1900, assumiu a direção técnica do Instituto Soroterápico Federal, o qual passou a dirigir em 1902.

 

 

Os principais problemas que Oswaldo Cruz teve que enfrentar como Diretor Geral de Saúde Pública foram a febre amarela, a peste bubônica e a varíola. Um de seus colaboradores foi o sanitarista Belisário Penna (1868 – 1939).

 

 

A febre amarela

 

 

Em 1902, a febre amarela havia sido responsável pela morte de cerca de mil pessoas no Rio de Janeiro. Oswaldo Cruz era adepto da teoria do médico cubano Carlos Finlay (1833 – 1915) sobre a transmissão da febre amarela pelos mosquitos Stegomyia fasciata. Para exterminá-los, em abril de 1903, iniciou a campanha de combate à doença. Em 15 de abril, foi criado o Serviço de Profilaxia Específica da Febre Amarela (O Paiz, 18 de abril de 1903, sexta coluna; 22 de abril de 1903, quarta coluna; 25 de abril, quinta coluna; e 29 de abril, quarta coluna).

 

 

 

A execução dessa profilaxia foi regulamentada pelas “Instruções para o Serviço de Profilaxia Específica de Febre-Amarela” nos primeiros dias de maio de 1903, do ministro da Justiça e Negócios Interiores, J.J. Seabra (1855 – 1942) (O Paiz, 7 de maio de 1903, penúltima coluna).

 

 

Foram criadas as brigadas sanitárias, que “eram constituídas por 1 inspetor do serviço, responsável por toda a execução das atividades e nomeado por decreto; 10 médicos que o auxiliam, destacados dentre os inspetores sanitários pelo diretor geral de saúde pública, mediante indicação do inspetor do serviço; 70 auxiliares acadêmicos e 9 chefes de turma, nomeados pelo diretor geral de saúde pública; 1 administrador do serviço, 1 almoxarife e 1 escrituario-arquivista, nomeados por portaria do Ministro; 200 capatazes, 18 guardas de saúde de primeira classe e 18 de segunda classe, 18 carpinteiros e pedreiros, bombeiros, cocheiros, nomeados pelo inspetor do serviço; e quantos mais trabalhadores fossem necessários” (BRASIL, 1905).

 

 

Guardas “mata-mosquitos” visitavam casas nas diversas regiões da cidade, muitas vezes acompanhados por soldados da polícia. A cidade foi dividida em distritos sanitários, sob jurisdição das delegacias de Saúde, que recebiam notificações dos enfermos, aplicavam multas e intimavam os donos de imóveis considerados insalubres a reformá-los ou até mesmo a demoli-los. Providenciava-se a remoção de pessoas infectadas para hospitais, o isolamento domiciliar dos enfermos assim como a desinfecção dos ambientes. Ao mesmo tempo, Oswaldo Cruz fazia circular na imprensa os folhetos Conselhos ao Povo, de divulgação das medidas adotadas.

 

 

A doença foi perdendo a força e, em 1907, Oswaldo Cruz escreveu ao presidente Afonso Pena (1847 – 1909): “graças à firmeza e vontade do governo, a febre amarela já não mais devasta sob a forma epidêmica a capital da República”. Nesse mesmo ano, a delegação brasileira de cientistas de Maguinhos, liderada por Oswaldo Cruz, recebeu a medalha de ouro no XIV Congresso Internacional de Higiene e Demografia de Berlim.

 

 

Acessando o link para as fotografias relativas à febre amarela disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

Aline Lopes de Lacerda, historiadora e chefe do Departamento de Arquivo e Documentação da COC/Fiocruz,  escreveu o artigo Febre amarela: imagens da produção da vacina no início do século XX, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 25 de março de 2018. Cristiane d’Avila, jornalista do Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz, escreveu Vacinação no Brasil, uma história centenária, publicado em 17 de agosto de 2018. Ricardo Augusto dos Santos, pesquisador titular da Fundação Oswaldo Cruz, escreveu o artigo O sanitarista Belisário Penna (1868-1939), um dos protagonistas da história da saúde pública no Brasil, também publicado no portal, em 28 de setembro de 2018. A Fiocruz é uma das instituições parceiras da Brasiliana Fotográfica.

 

A peste bubônica

 

 

A peste bubônica, doença transmitida pela picada de pulgas infectadas por ratos contaminados pela bactéria Yersinia pestis, o bacilo descoberto pelo suíço Alexandre Yersin (1863 – 1943) e pelo japonês Shibasaburo Sato (1852 – 1931), em 1894, chegou ao Brasil, pelo porto de Santos, em 1900. Foi combatida por Oswaldo Cruz e as medidas contra a peste bubônica não encontraram resistência da população. Foi intensificada a limpeza urbana e a notificação dos doentes era compulsória, o que ajudava no isolamento e no tratamento dos mesmos com o soro fabricado no Instituto Soroterápico Federal. Foi também promovida a vacinação de pessoas residentes nas áreas mais atingidas e uma abrangente campanha de desratização foi realizada: os funcionários destacados para a função tinham que recolher 150 ratos por mês, pelos quais recebiam 60 mil-réis.

A Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP) passou a comprar ratos: para cada animal morto apresentado, pagava-se a quantia de duzentos réis, o que ocasionou o surgimento da profissão de “ratoeiro” – compravam ratos a baixo preço ou até mesmo os criavam em casa e os revendiam para a DGSP. A “guerra aos ratos” virou motivo de piada, de críticas (Revista da Semana, 21 de agosto de 1904Kosmos, outubro 1904) e até uma música sobre o tema, a polca Rato, rato, composta por Casemiro da Rocha (1880 – 1912), integrante da banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, com letra de Claudino Costa, foi um grande sucesso no carnaval de 1904. Foi gravada na Casa Edison.

 

 

O fato é que as mortes por peste bubônica que, em 1903, atingiram o índice de 48,74 mortes para cada 100 mil habitantes, caíram vertiginosamente e quando Oswaldo Cruz deixou a Diretoria Geral de Saúde Pública, em 1909, esse índice chegou ao seu mais baixo patamar: 1,73.

 

A varíola e a Guerra da Vacina

 

 

Até meados de 1904, as internações causadas pela varíola já chegavam a 1800 no Hospital São Sebastião. Oswaldo Cruz pretendeu controlar a doença com a vacinação em massa da população. Pediu que fosse enviado ao Congresso Nacional um projeto de lei para resgatar a obrigatoriedade da vacinação e revacinação antivariólica. A vacinação já estava contemplada em uma lei em vigor desde 1837, mas que nunca havia sido cumprida.

 

 

 

A medida enfrentou a oposição liderada pelo senador paraense Lauro Sodré (1858 – 1944), líder do Partido Republicano Federal, e pelos deputados pernambucano Barbosa Lima (1862 – 1931) e gaúcho Alfredo Varela (1864 – 1943), todos contra o governo do presidente Rodrigues Alves, do Partido Conservador. O Apostolado Positivista do Brasil, liderado por Raimundo Teixeira Mendes (1855 – 1927), também se opôs à lei.

 

 

 

 

Jornais e políticos lançaram uma campanha contra a medida, incitando a desobediência à lei, que eles classificavam como despótica e ameaçadora, já que estranhos tocariam nas pessoas no caso da vacinação, além de entrarem nas casas para desinfecção. Além disso, a vacina, que consistia no líquido de pústulas de vacas doentes, era rejeitada pelas camadas populares – havia um boato de que os vacinados adquiriam feições bovinas…

 

 

 

Finalmente, foi promulgada, em 31 de outubro de 1904, uma lei que tornou a vacinação e a revacinação contra a varíola obrigatória.

 

Lei n° 1.261, de 31 de outubro de 1904

 

Torna obrigatorias, em toda a Republica, a vaccinação e a revaccinação contra a variola.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
Faço saber que o Congresso Nacional decretou e eu sancciono a lei seguinte:

     Art. 1º A vaccinação e revaccinação contra a variola são obrigatorias em toda a Republica.

     Art. 2º Fica o Governo autorizado a regulamental-a sob as seguintes bases:

     a) A vaccinação será praticada até o sexto mez de idade, excepto nos casos provados de molestia, em que poderá ser feita mais tarde;

     b) A revaccinação terá logar sete annos após a vaccinação e será repetida por septennios;

     c) As pessoas que tiverem mais de seis mezes de idade serão vaccinadas, excepto si provarem de modo cabal terem soffrido esta operação com proveito dentro dos ultimos seis annos;

     d) Todos os officiaes e soldados das classes armadas da Republica deverão ser vaccinados e revaccinados, ficando os commandantes responsaveis pelo cumprimento desta;

     e) O Governo lançara mão, afim de que sejam fielmente cumpridas as disposições desta lei, da medida estabelecida na primeira parte da lettra f do § 3º do art. 1º do decreto n. 1151, de 5 de janeiro de 1904;

     f) Todos os serviços que se relacionem com a presente lei serão postos em pratica no Districto Federal e fiscalizados pelo Ministerio da Justiça e Negocios Interiores, por intermedio da Directoria Geral de Saude Publica.

     Art. 3º Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 31 de outubro de 1904, 16º da Republica.

FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES ALVES.
J. J. Seabra.

 

 

 

 

Em um encontro presidido pelo senador Lauro Sodré, no Centro das Classes Operárias, em 5 de novembro de 1904, foi fundada a Liga Contra a Vacina Obrigatória (O Paiz, 6 de novembro de 1904, penúltima coluna). O descontentamento popular se agravou quando, no dia 9 de novembro de 1904, o governo divulgou seu plano de regulamentação da aplicação da vacina obrigatória contra a varíola (Gazeta de Notícias, 10 de novembro de 1904, quinta coluna). Nos dias 10 e 11, no Largo de São Francisco, estudantes contrários à lei se reuniram e, no dia 13 de novembro, acirrou-se a rebelião popular, que ficou conhecida como Revolta da Vacina, marcada por diversos distúrbios urbanos em várias regiões da cidade, embates com a polícia e prisões. Mais de 20 bondes da Companhia Carris Urbanos e muitos lampiões da iluminação pública foram destruídos, daí o apelido Quebra Lampiões atribuído ao movimento (Gazeta de Notícias, 14 de novembro de 1904; e Jornal do Brasil, 14 de novembro de 1904).

 

 

 

Paralelamente à revolta popular, aconteceu um movimento militar orquestrado pelos generais Silvestre Travassos (? – 1904) e Olímpio da Silveira (1887 – 1935), Lauro Sodré, Barbosa Lima, o major Gomes de Castro e o capitão Augusto Mendes de Moraes, que se reuniram no dia 14 de novembro de 1904, no Clube Militar. Tinham por objetivo derrubar o governo de Rodrigues Alves, que foi aconselhado a ir para um navio de guerra, onde teria mais segurança – ele recusou.

Houve no mesmo dia uma tentativa fracassada de levante na Escola de Tática do Realengo, sufocada pelo então diretor da instituição, general Hermes da Fonseca (1855 – 1923), futuro presidente do Brasil. O comandante da Escola Militar de Realengo, o general Alípio Costallat (c. 1853 – 1933), foi deposto pelo general Travassos que liderou, durante a noite, a marcha dos alunos em direção ao Palácio do Catete. Os revoltosos trocaram tiros com uma brigada de ataque enviada pelo governo, na rua da Passagem, em Botafogo. O tiroteio, de cerca de meia hora, matou um aluno da Escola Militar, Silvestre Cavalcanti, e um sargento da tropa legalista, chamado Camargo. O general Travassos ficou gravemente ferido e faleceu oito dias depois. A Escola Militar, bombardeada durante a noite por navios de guerra posicionados na baía de Guanabara, foi ocupada pelo ministro da Guerra, o marechal Francisco de Paula Argollo (1847 – 1930) e pelo ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, Lauro Müller (1863 – 1926). Seus alunos foram presos, expulsos da Escola e levados para portos na região Sul do país. Obviamente, o desfile comemorativo dos 15 anos da Proclamação da República foi cancelado (Gazeta de Notícias, 15 de novembro de 1904Jornal do Brasil, 15 de novembro de 1904; Gazeta de Notícias, 16 de novembro de 1904; Jornal do Brasil, 16 de novembro de 1904).

No dia 16 de novembro, foi decretado o estado de sítio e revogada a obrigatoriedade da vacinação. Com isso, o movimento popular arrefeceu, os serviços voltaram a funcionar e a cidade se apazigou. Saldo do movimento: 945 prisões, 461 deportações, 110 feridos e 30 mortos (Gazeta de Notícias, 17 de novembro de 1904 e 18 de novembro de 1904).

 

 

Segundo o historiador Jaime Larry Benchimol: Todos saíram perdendo. Os revoltosos foram castigados pelo governo e pela varíola. A vacinação vinha crescendo e despencou, depois da tentativa de torná-la obrigatória. A ação do governo foi desastrada e desastrosa, porque interrompeu um movimento ascendente de adesão à vacina”.

Apenas nove pessoas morreram por varíola em 1906 no Rio de Janeiro. Porém, dois anos depois, em 1908, uma violenta epidemia da doença ocorreu na cidade, causando mais de 6.500 casos.

 

 

Link para músicas sobre Oswaldo Cruz e também sobre as campanhas de combate à febre amarela, à peste bubônica e à vacinação obrigatória contra a varíola, publicadas na Biblioteca Virtual Oswaldo Cruz

 

Retrospectiva das pandemias do século XX e XXI

 

O mundo, ao longo dos séculos XX e XXI, enfrentou cinco pandemias: a Gripe Espanhola, em 1918, tema de uma recente publicação da Brasiliana Fotográfica, E o ex e futuro presidente do Brasil morreu de gripe…a Gripe Espanhola de 1918; a Gripe Asiática, em 1957; a Gripe de Hong Kong, em 1968, a identificação de um novo vírus da influenza do tipo A pandêmico que desencadeou a Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional, decretada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2009; e cerca de 11 anos depois, em 11 de abril de 2020, a OMS declarou uma pandemia do novo coronavírus, chamado de Sars-Cov-2, causador da Covid-19, surgido na cidade de Wuhan, na China, em fins de 2019.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

 

BENCHIMOL, Jaime Larry. Pereira Passos: um Haussmann Tropical. A renovação urbana na cidade do Rio de Janeiro no início do século XX. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Departamento Geral de Documentação e Informação Cultural, 1992.

BENCHIMOL, Jaime Larry. Reforma urbana e Revolta da Vacina na cidade do Rio de Janeiro. In: Jorge Ferreira e Lucilia de Almeida Neves Delgado (org.) O Brasil Republicano. O tempo do liberalismo excludente. Da proclamação da República à Revolução de 1930. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.

BIBEL, David J.; CHEN, T.H. Diagnosis of Plague: an Analysis of the Yersin-Kitasato Controversy. American Society for Microbiology, 1976.

Biblioteca Virtual Oswaldo Cruz

BRASIL. Ministério da Justiça. Relatório 1904 – 1905. Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1905.

CARVALHO, José Murilo de: Os Bestializados – O Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo : Companhia das Letras, 1987.

COSTA, Zouraide; ELKHOURY, Ana; FLANNERY, Brendan; ROMANO, Alessandro. Evolução histórica da vigilância epidemiológica e do controle da febre amarela no Brasil, 2011.

CURY, Bruno da Silva Mussa. Combatendo ratos, mosquitos e pessoas: Oswaldo Cruz e a saúde pública na reforma da capital do Brasil (1902-1904). / Bruno da Silva Mussa Curry. – 2012. 160 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Programa de Pós-graduação em História, Rio de Janeiro, 2012.

Dicionário Cravo Alvim

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

Ministério da Saúde

MOURELLE, Thiago. A revolta da vacina. Arquivo Nacional: Que República é essa?, 21 de janeiro de 2020.

Nosso Século. São Paulo : Abril Cultural, 1980.

Portal Fiocruz – A trajetória do médico dedicado à ciência

Portal Fiocruz  – A Revolta da Vacina

Projeto Memória – Fundação Banco do Brasil

ROCHA, Oswaldo; CARVALHO, Lia de Aquino. A era das demolições Habitações Populares. Rio de Janeiro : Biblioteca Carioca, 1986

SEVCENKO, Nicolau. A Revolta da Vacina: mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo: Cosac Naify, 2010.

Site CPDOC

Site Multirio

Ressaca no Rio de Janeiro invade o porão da casa do fotógrafo Marc Ferrez, em 1913

Há muito tempo as águas de março castigam o Rio de Janeiro. Nas primeiras décadas do século XX, ocorreram várias ressacas na cidade e a Brasiliana Fotográfica destaca duas fotografias produzidas por Augusto Malta (1864 – 1957) e Carlos Bippus (18? – 19?), em 1913, quando, em março, aconteceu uma delas. Um dos bairros mais afetados foi o Flamengo e o porão da casa onde a família de Marc Ferrez (1843 – 1921) morava, na rua Dois de Dezembro – antiga rua Christovão Colombo -, foi inundado destruindo boa parte da tiragem do Álbum da Avenida Central*, um dos mais ambiciosos projetos da carreira do fotógrafo, monumental como a obra de engenharia que representava (O Paiz, 9 de março de 1913; Correio da Manhã, 9 de março de 1913). Cerca de um mês depois da enchente, Ferrez e sua mulher, a francesa Marie Lefebvre (c. 1849 – 1914), embarcaram para a Europa no paquete holandês Zeelandia (O Paiz, 17 de abril de 1913, na quarta coluna) e, no primeiro semestre de 1914, quando retornaram ao Rio de Janeiro, alugaram uma casa na rua Voluntários da Pátria 50, em Botafogo. Terá sido para fugir de possíveis novas ressacas?

 

 

Acessando o link para as fotografias de ressacas ocorridas no Rio de Janeiro no início do século XX disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

 

 

 *O Álbum da Avenida Central

 

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Ferrez iniciou pouco antes da inauguração da avenida Central, em 15 de novembro de 1905 (Jornal do Brasil, 16 de novembro de 1905, última coluna), a produção do Álbum da Avenida Central importante registro da reforma da principal via da então capital federal, onde ele contrapôs reproduções das plantas às fotografias das fachadas de cada edifício documentado. Esse tipo de fotografia foi fundamental para a construção e para a difusão de uma nova imagem do Rio de Janeiro, uma imagem associada aos ideais de civilização e progressoEle havia sido contratado pela Comissão Construtora da Avenida Central, que era coordenada por Paulo de Frontin (1860 – 1933), presidente do Clube de Engenharia. O álbum original foi lançado em 1907. As fotos foram realizadas em negativos de grande formato. As dos projetos arquitetônicos foram impressas em zincografia e, as das fachadas de todos os edifícios, em colotipia.

Na época de sua inauguração, a avenida Central tinha 1.800 metros de extensão e 33 metros de largura. Cerca de 300 casas coloniais foram demolidas para a construção dos novos edifícios, cujas fachadas foram escolhidas por concurso. Alguns dos jurados foram o prefeito Pereira Passos (1836 – 1913), responsável pela significativa reforma urbana carioca – o “bota-abaixo” -, que contribuiu para o surgimento do Rio de Janeiro da Belle Époque; o engenheiro Paulo de Frontin (1860 – 1933), Lauro Muller (1863 – 1926), ministro da Viação e Obras Públicas; e Oswaldo Cruz (1872 – 1917), diretor-geral da Saúde Pública. Além de edifícios do governo, ergueram-se, na avenida, jornais, clubes, hotéis e sedes de empresas. O calçamento, em mosaico português, foi feito por artesãos vindos de Portugal. Passear pela avenida Central era passear pela espinha dorsal do mundo das compras e do lazer dos elegantes, dos negócios e da cultura. Alguns remanescentes da primeira geração de prédios da avenida são o Teatro Municipal, o Clube Naval, a Biblioteca Nacional, o Museu Nacional de Belas Artes e o Centro Cultural da Justiça Federal.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

BARROS, Mariana Gonçalves Monteiro de. Marc Ferrez e o Rio de Janeiro do seu tempo. Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-graduação em História Social da Cultura do Departamento de História da PUC-Rio, Rio de Janeiro, setembro de 2006.

CERON, Ileana Pradilla Ceron. Marc Ferrez – uma cronologia da vida e da obra. São Paulo : Instituto Moreira Salles, 2018.

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

ERMAKOFF, George. Rio de Janeiro 1840 – 1900 Uma crônica fotográfica. Rio de Janeiro: G. Ermakoff Casa Editorial, 2006.

FERREZ, Gilberto. O Rio Antigo do fotógrafo Marc Ferrez: paisagens e tipos humanos do Rio de Janeiro, 1865-1918. Rio de Janeiro: João Fortes Engenharia/Editora Ex-Libris, 1984.

KOSSOY, Boris. Dicionário histórico-fotográfico brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2002. 408 p., il. p&b.

Rio / Marc Ferrez – São Paulo : IMS; Göttingen: Steidl, 2015

TURAZZI, Maria Inez. Cronologia. In O Brasil de Marc Ferrez – São Paulo : Instituto Moreira Salles, 2005.

 

Publicações da Brasiliana Fotográfica em torno da obra do fotógrafo Marc Ferrez 

 

O Rio de Janeiro de Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 30 de junho de 2015

Obras para o abastecimento no Rio de Janeiro por Marc Ferrez , de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 25 de janeiro de 2016

O brilhante cronista visual Marc Ferrez (7/12/1843 – 12/01/1923), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 7 de dezembro de 2016

Do natural ao construído: O Rio de Janeiro na fotografia de Marc Ferrez, de autoria de Sérgio Burgi, um dos curadores da Brasiliana Fotográfica, publicada em 19 de dezembro de 2016

No primeiro dia da primavera, as cores de Marc Ferrez (1843 – 1923), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 22 de setembro de 2017

Marc Ferrez , a Comissão Geológica do Império (1875 – 1878) e a Exposição Antropológica Brasileira no Museu Nacional (1882), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica,  publicada em 29 de junho de 2018

Série “O Rio de Janeiro desaparecido” V – O quiosque Chopp Berrante no Passeio Público, Ferrez, Malta e Charles Dunlop, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 20 de julho de 2018

Uma homenagem aos 175 anos de Marc Ferrez (7 de dezembro de 1843 – 12 de janeiro de 1923), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 7 de dezembro de 2018 

Pereira Passos e Marc Ferrez: engenharia e fotografia para o desenvolvimento das ferrovias, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 5 de abril de 2019

Fotografia e ciência: eclipse solar, Marc Ferrez e Albert Einstein, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 

Os 180 anos da invenção do daguerreótipo – Os álbuns da Comissão Geológica do Império com fotografias de Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 19 de agosto de 2019

Celebrando o fotógrafo Marc Ferrez (1843 – 1923), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 4 de dezembro de 2019

Uma homenagem da Casa Granado ao imperial sob as lentes de Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicada em 7 de fevereiro de 2020

Petrópolis, a Cidade Imperial, pelos fotógrafos Marc Ferrez e Revert Henrique Klumb, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 16 de março de 2020

Bambus, por Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 5 de junho de 2020

O Baile da Ilha Fiscal: registro raro realizado por Marc Ferrez e retrato de Aurélio de Figueiredo diante de sua obra, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 9 de novembro de 2020

O Palácio de Cristal fotografado por Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 2 de fevereiro de 2021

A Estrada de Ferro do Paraná, de Paranaguá a Curitiba, pelos fotógrafos Arthur Wischral (1894 – 1982) e Marc Ferrez (1843 – 1923), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 22 de março de 2021

Dia dos Pais – Julio e Luciano, os filhos do fotógrafo Marc Ferrez, e outras famílias, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 6 de agosto de 2021

No Dia da Árvore, mangueiras fotografadas por Ferrez e Leuzinger, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 21 de setembro de 2021

Retratos de Pauline Caroline Lefebvre, sogra do fotógrafo Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 28 de abril de 2022

A Serra dos Órgãos: uma foto aérea e imagens realizadas pelos mestres Ferrez, Leuzinger e Klumb, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 30 de junho de 2022

O centenário da morte do fotógrafo Marc Ferrez (1843 – 1923), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 12 de janeiro de 2023

O Observatório Nacional pelas lentes de Marc Ferrez, amigo de vários cientistas, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 29 de maio de 2023

No Dia Mundial do Meio Ambiente, a potente imagem da Cachoeira de Paulo Afonso, por Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 5 de junho de 2023

A Fonte Adriano Ramos Pinto por Guilherme Santos e Marc Ferrez, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 18 de julho de 2023

Os 180 anos de nascimento do fotógrafo Marc Ferrez (1843 – 1923), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 7 de dezembro de 2023

 

 

O Campo de Santana

No centro do Rio de Janeiro, a praça que hoje é tema da Brasiliana Fotográfica já teve diversos nomes ao longo de sua história: Campo de Santana, Campo da Honra, Praça do Curro, Campo da Aclamação e Praça da República – este último, até hoje, sua denominação oficial. Mas ficou mesmo conhecida como Campo de Santana, palco de celebrações e de importantes acontecimentos da história do Brasil como a aclamação de dom João VI como como rei de Portugal, Brasil e Algarves (1818), a aclamação de Pedro I como imperador do Brasil (1822), as comemorações populares de coroação de D. Pedro II (1841), festas do Império do Divino Espírito Santo promovidas pela Irmandade de Santana, festejos pelo fim da Guerra do Paraguai (1870), um baile em celebração da Abolição da Escravatura (1888) e a Proclamação da República (1889).

Também na região foram construídos prédios como a Estação de Ferro Central do Brasilo primeiro Palácio da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, a primeira sede do Museu Nacional e a Casa da Moeda – atual sede do Arquivo Nacional. O portal traz imagens do Campo de Santana e de algumas dessas construções produzidas por Augusto MaltaJorge KfuriJuan GutierrezMarc Ferrez, Uriel Malta e também por fotógrafos ainda não identificados.

 

 

Acessando o link para as fotografias do Campo de Santana e de alguns prédios em seu entorno disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

 

Até meados do século XVIII, o Campo de Santana era deserto e abandonado, tendo sido escolhido para o despejo de detritos, fato que perdurou até a gestão do vice-rei Conde Resende (1790 a 1801), que ordenou o aterro e o saneamento do campo. A partir daí, surgiu a praça, edificações e novas delineações urbanas. Foi o botânico e arquiteto paisagista francês Auguste Glaziou (1833 – 1906), que tinha vindo para o Brasil – segundo a maioria das fontes, a convite de dom Pedro II -, o responsável pelo embelezamento da praça, iniciado nos primeiros anos da década de 1870 (Jornal do Commercio, 2 de maio de 1872, terceira coluna; e Diário do Rio de Janeiro, 24 de dezembro de 1873, primeira coluna) com a a construção de jardins românticos, cascatas, pontes e grutas. A inauguração da obra aconteceu em 7 de setembro de 1880 com a presença do imperador. Na ocasião, Glaziou foi condecorado com a Ordem de Cristo (Gazeta de Notícias, 7 de setembro de 1880, primeira coluna; e Gazeta de Notícias, 8 de setembro, primeira coluna).

 

 

Auguste Glaziou, por Auguste Petit

Glaziou nasceu na cidade de Lannion, na Bretanha, em 30 de agosto de 1828. Formado em Engenharia, estudou Botânica no Museu de História Natural de Paris e participou da reforma do Jardim Público da cidade de Bordeaux. Chegou ao Rio de Janeiro em 1858, onde permaneceu até 1897, quando se aposentou e voltou para a França, onde faleceu em 30 de março de 1906. Durante sua estadia no Brasil, foi Diretor dos Parques e Jardins da Casa Imperial e Inspetor dos Jardins Municipais, além de ter integrado a Associação Brasileira de Aclimação, tendo trabalhado em obras de melhoramentos no Jardim Botânico, na Quinta da Boa Vista, na Floresta da Tijuca e no Passeio Público. Também realizou obras nos jardins da residência das princesas imperiais, da família do Barão de Nova Friburgo, do Barão de Mauá, no Rio de Janeiro, e de Tavares Guerra, em Petrópolis, dentre outros.

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

COARACY, Vivaldo. Coleção Rio 4 séculos, volume 3. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1965.

GERSON, Brasil. História das Ruas do Rio. Rio de Janeiro: Bem-Te-Vi, 2013.

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

Site da Casa de Rui Barbosa

Site da MultiRio

Site do Museu Nacional