As doenças do Rio de Janeiro no início do século XX e a Revolta da Vacina em 1904

No início do século XX, no Rio de Janeiro, providências em torno do combate de diversas doenças já provocavam grandes polêmicas. A campanha de combate à varíola resultou, em novembro de 1904, em uma revolta popular e militar, a Revolta da Vacina ou Quebra-Lampiões – um protesto contra a lei que tornava obrigatória a vacinação em massa contra a doença, instituída pelo prefeito Pereira Passos e colocada em prática pelo então Diretor Geral de Saúde Pública, Oswaldo Cruz, contratado para o cargo para combater a varíola, assim como a peste bubônica e a febre amarela, que grassavam na cidade. Vamos contar um pouco dessa história.

 

 

Em 30 de dezembro de 1902, por decreto, Francisco Pereira Passos (1836 – 1913) foi nomeado prefeito do então Distrito Federal, o Rio de Janeiro, pelo presidente Rodrigues Alves (1848 – 1919), que prometia marcar seu governo pela modernização e pelo saneamento. Assumiu no mesmo dia (Gazeta de Notícias, 31 de dezembro de 1902, na sexta coluna), sucedendo Carlos Leite Ribeiro (1858 – 1945). Ocupou o cargo até 16 de novembro de 1906, quando foi sucedido por Francisco Marcelino de Sousa Aguiar (1855 – 1935) (O Paiz, 17 de novembro de 1906, na sexta coluna). Durante seu mandato, o prefeito Pereira Passos realizou uma significativa reforma urbana na cidade.

Para saneá-la e modernizá-la realizou diversas demolições, conhecidas popularmente como a política do “bota-abaixo”, que contribuiu fortemente para o surgimento do Rio de Janeiro da Belle Époque, sendo a abertura da Avenida Central dos seus maiores símbolos, festejada em uma crônica de Olavo Bilac (1865 – 1918) (Kosmos, março de 1904) . Essas transformações foram definidas por Alberto Figueiredo Pimentel (1869-1914), autor da seção “Binóculo”, da Gazeta de Notícias, com a máxima “O Rio civiliza-se”, que se tornou o slogan da reforma urbana carioca. Foi também Pereira Passos que contratou, em 1903, o primeiro fotógrafo oficial da prefeitura, Augusto Malta (1864 – 1957), justamente para documentar todas essas inúmeras e radicais mudanças na cidade.

 

 

Mas as reformas urbanas não eram o bastante para mudar o perfil do Rio de Janeiro, na época uma cidade bastante insalubre, assolada por doenças e sem saneamento básico, certamente obstáculos para o estabelecimento de uma sociedade moderna e cosmopolita nos moldes das capitais europeias. Lembramos do caso do cruzador italiano Lombardia que aportou na cidade, em novembro de 1895, e teve grande parte de sua tripulação infectada pela febre amarela. O capitão-de-fragata e comandante do navio, Olivari, e outros tripulantes, faleceram da doença (O Paiz, 28 de novembro de 1895, quinta coluna; O Paiz, 15 de fevereiro de 1896, quarta coluna; O Paiz, 17 de fevereiro de 1896, quinta coluna; O Paiz, 25 de fevereiro, sexta coluna; O Paiz, 29 de fevereiro de 1896, sexta colunaO Paiz, 1º de março de 1896, penúltima coluna; O Paiz, 9 de março de 1896, quarta colunaO Paiz, 10 de abril de 1896, penúltima coluna).

O Rio de Janeiro era inclusive conhecido internacionalmente como “túmulo dos estrangeiros”, possivelmente devido a versos sobre o verão carioca atribuídos ao escritor suíço Ludwig Ferdinand Schmid (1823-1888), que havia sido cônsul no Rio de Janeiro na década de 1860:

Oh! sombra, sobre a imagem encantada / Cores escuras pousam sobre os campos e florestas / O mal da natureza paira, poderoso / Sobre a florida superfície tropical /O poder supremo/ Deste Império não é de nenhum Herodes / No entanto é a terra da morte diária / Túmulo insaciável do estrangeiro”.

Pereira Passos assumiu a prefeitura de uma cidade que no fim do Império tinha uma população de cerca de 500 mil habitantes e que atingira cerca de 700 mil pessoas em 1904. Ele aliou a reforma urbanística e arquitetônica da cidade – que incluiria a construção de um novo porto, de novas avenidas, o aterramento de praias, o desmonte de morros, a derrubada de casas e cortiços e o embelezamento de praças e jardins, que não deixou de ter seu lado excludente e criticado, deslocando parte da população do centro para o subúrbio e também contribuindo para o surgimento das favelas – a uma nova política higienista. Para implementar medidas sanitárias arrojadas foi nomeado pelo presidente Rodrigues Alves para a direção geral de Saúde Pública o jovem médico Oswaldo Cruz (1872 – 1917), que tomou posse em 23 de março de 1903. Ficou no cargo até 1909.

 

Oswaldo Cruz havia estudado microbiologia, soroterapia e imunologia no Instituto Pasteur, e medicina legal no Instituto de Toxicologia, na França, entre 1897 e 1898. Quando voltou ao Brasil, tomou posse, em 24 de agosto de 1899, na Academia Nacional de Medicina, e, em 1900, assumiu a direção técnica do Instituto Soroterápico Federal, o qual passou a dirigir em 1902.

 

 

Os principais problemas que Oswaldo Cruz teve que enfrentar como Diretor Geral de Saúde Pública foram a febre amarela, a peste bubônica e a varíola. Um de seus colaboradores foi o sanitarista Belisário Penna (1868 – 1939).

 

 

A febre amarela

 

 

Em 1902, a febre amarela havia sido responsável pela morte de cerca de mil pessoas no Rio de Janeiro. Oswaldo Cruz era adepto da teoria do médico cubano Carlos Finlay (1833 – 1915) sobre a transmissão da febre amarela pelos mosquitos Stegomyia fasciata. Para exterminá-los, em abril de 1903, iniciou a campanha de combate à doença. Em 15 de abril, foi criado o Serviço de Profilaxia Específica da Febre Amarela (O Paiz, 18 de abril de 1903, sexta coluna; 22 de abril de 1903, quarta coluna; 25 de abril, quinta coluna; e 29 de abril, quarta coluna).

 

 

 

A execução dessa profilaxia foi regulamentada pelas “Instruções para o Serviço de Profilaxia Específica de Febre-Amarela” nos primeiros dias de maio de 1903, do ministro da Justiça e Negócios Interiores, J.J. Seabra (1855 – 1942) (O Paiz, 7 de maio de 1903, penúltima coluna).

 

 

Foram criadas as brigadas sanitárias, que “eram constituídas por 1 inspetor do serviço, responsável por toda a execução das atividades e nomeado por decreto; 10 médicos que o auxiliam, destacados dentre os inspetores sanitários pelo diretor geral de saúde pública, mediante indicação do inspetor do serviço; 70 auxiliares acadêmicos e 9 chefes de turma, nomeados pelo diretor geral de saúde pública; 1 administrador do serviço, 1 almoxarife e 1 escrituario-arquivista, nomeados por portaria do Ministro; 200 capatazes, 18 guardas de saúde de primeira classe e 18 de segunda classe, 18 carpinteiros e pedreiros, bombeiros, cocheiros, nomeados pelo inspetor do serviço; e quantos mais trabalhadores fossem necessários” (BRASIL, 1905).

 

 

Guardas “mata-mosquitos” visitavam casas nas diversas regiões da cidade, muitas vezes acompanhados por soldados da polícia. A cidade foi dividida em distritos sanitários, sob jurisdição das delegacias de Saúde, que recebiam notificações dos enfermos, aplicavam multas e intimavam os donos de imóveis considerados insalubres a reformá-los ou até mesmo a demoli-los. Providenciava-se a remoção de pessoas infectadas para hospitais, o isolamento domiciliar dos enfermos assim como a desinfecção dos ambientes. Ao mesmo tempo, Oswaldo Cruz fazia circular na imprensa os folhetos Conselhos ao Povo, de divulgação das medidas adotadas.

 

 

A doença foi perdendo a força e, em 1907, Oswaldo Cruz escreveu ao presidente Afonso Pena (1847 – 1909): “graças à firmeza e vontade do governo, a febre amarela já não mais devasta sob a forma epidêmica a capital da República”. Nesse mesmo ano, a delegação brasileira de cientistas de Maguinhos, liderada por Oswaldo Cruz, recebeu a medalha de ouro no XIV Congresso Internacional de Higiene e Demografia de Berlim.

 

 

Acessando o link para as fotografias relativas à febre amarela disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

Aline Lopes de Lacerda, historiadora e chefe do Departamento de Arquivo e Documentação da COC/Fiocruz,  escreveu o artigo Febre amarela: imagens da produção da vacina no início do século XX, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 25 de março de 2018. Cristiane d’Avila, jornalista do Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz, escreveu Vacinação no Brasil, uma história centenária, publicado em 17 de agosto de 2018. Ricardo Augusto dos Santos, pesquisador titular da Fundação Oswaldo Cruz, escreveu o artigo O sanitarista Belisário Penna (1868-1939), um dos protagonistas da história da saúde pública no Brasil, também publicado no portal, em 28 de setembro de 2018. A Fiocruz é uma das instituições parceiras da Brasiliana Fotográfica.

 

A peste bubônica

 

 

A peste bubônica, doença transmitida pela picada de pulgas infectadas por ratos contaminados pela bactéria Yersinia pestis, o bacilo descoberto pelo suíço Alexandre Yersin (1863 – 1943) e pelo japonês Shibasaburo Sato (1852 – 1931), em 1894, chegou ao Brasil, pelo porto de Santos, em 1900. Foi combatida por Oswaldo Cruz e as medidas contra a peste bubônica não encontraram resistência da população. Foi intensificada a limpeza urbana e a notificação dos doentes era compulsória, o que ajudava no isolamento e no tratamento dos mesmos com o soro fabricado no Instituto Soroterápico Federal. Foi também promovida a vacinação de pessoas residentes nas áreas mais atingidas e uma abrangente campanha de desratização foi realizada: os funcionários destacados para a função tinham que recolher 150 ratos por mês, pelos quais recebiam 60 mil-réis.

A Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP) passou a comprar ratos: para cada animal morto apresentado, pagava-se a quantia de duzentos réis, o que ocasionou o surgimento da profissão de “ratoeiro” – compravam ratos a baixo preço ou até mesmo os criavam em casa e os revendiam para a DGSP. A “guerra aos ratos” virou motivo de piada, de críticas (Revista da Semana, 21 de agosto de 1904Kosmos, outubro 1904) e até uma música sobre o tema, a polca Rato, rato, composta por Casemiro da Rocha (1880 – 1912), integrante da banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, com letra de Claudino Costa, foi um grande sucesso no carnaval de 1904. Foi gravada na Casa Edison.

 

 

O fato é que as mortes por peste bubônica que, em 1903, atingiram o índice de 48,74 mortes para cada 100 mil habitantes, caíram vertiginosamente e quando Oswaldo Cruz deixou a Diretoria Geral de Saúde Pública, em 1909, esse índice chegou ao seu mais baixo patamar: 1,73.

 

A varíola e a Guerra da Vacina

 

 

Até meados de 1904, as internações causadas pela varíola já chegavam a 1800 no Hospital São Sebastião. Oswaldo Cruz pretendeu controlar a doença com a vacinação em massa da população. Pediu que fosse enviado ao Congresso Nacional um projeto de lei para resgatar a obrigatoriedade da vacinação e revacinação antivariólica. A vacinação já estava contemplada em uma lei em vigor desde 1837, mas que nunca havia sido cumprida.

 

 

 

A medida enfrentou a oposição liderada pelo senador paraense Lauro Sodré (1858 – 1944), líder do Partido Republicano Federal, e pelos deputados pernambucano Barbosa Lima (1862 – 1931) e gaúcho Alfredo Varela (1864 – 1943), todos contra o governo do presidente Rodrigues Alves, do Partido Conservador. O Apostolado Positivista do Brasil, liderado por Raimundo Teixeira Mendes (1855 – 1927), também se opôs à lei.

 

 

 

 

Jornais e políticos lançaram uma campanha contra a medida, incitando a desobediência à lei, que eles classificavam como despótica e ameaçadora, já que estranhos tocariam nas pessoas no caso da vacinação, além de entrarem nas casas para desinfecção. Além disso, a vacina, que consistia no líquido de pústulas de vacas doentes, era rejeitada pelas camadas populares – havia um boato de que os vacinados adquiriam feições bovinas…

 

 

 

Finalmente, foi promulgada, em 31 de outubro de 1904, uma lei que tornou a vacinação e a revacinação contra a varíola obrigatória.

 

Lei n° 1.261, de 31 de outubro de 1904

 

Torna obrigatorias, em toda a Republica, a vaccinação e a revaccinação contra a variola.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
Faço saber que o Congresso Nacional decretou e eu sancciono a lei seguinte:

     Art. 1º A vaccinação e revaccinação contra a variola são obrigatorias em toda a Republica.

     Art. 2º Fica o Governo autorizado a regulamental-a sob as seguintes bases:

     a) A vaccinação será praticada até o sexto mez de idade, excepto nos casos provados de molestia, em que poderá ser feita mais tarde;

     b) A revaccinação terá logar sete annos após a vaccinação e será repetida por septennios;

     c) As pessoas que tiverem mais de seis mezes de idade serão vaccinadas, excepto si provarem de modo cabal terem soffrido esta operação com proveito dentro dos ultimos seis annos;

     d) Todos os officiaes e soldados das classes armadas da Republica deverão ser vaccinados e revaccinados, ficando os commandantes responsaveis pelo cumprimento desta;

     e) O Governo lançara mão, afim de que sejam fielmente cumpridas as disposições desta lei, da medida estabelecida na primeira parte da lettra f do § 3º do art. 1º do decreto n. 1151, de 5 de janeiro de 1904;

     f) Todos os serviços que se relacionem com a presente lei serão postos em pratica no Districto Federal e fiscalizados pelo Ministerio da Justiça e Negocios Interiores, por intermedio da Directoria Geral de Saude Publica.

     Art. 3º Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 31 de outubro de 1904, 16º da Republica.

FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES ALVES.
J. J. Seabra.

 

 

 

 

Em um encontro presidido pelo senador Lauro Sodré, no Centro das Classes Operárias, em 5 de novembro de 1904, foi fundada a Liga Contra a Vacina Obrigatória (O Paiz, 6 de novembro de 1904, penúltima coluna). O descontentamento popular se agravou quando, no dia 9 de novembro de 1904, o governo divulgou seu plano de regulamentação da aplicação da vacina obrigatória contra a varíola (Gazeta de Notícias, 10 de novembro de 1904, quinta coluna). Nos dias 10 e 11, no Largo de São Francisco, estudantes contrários à lei se reuniram e, no dia 13 de novembro, acirrou-se a rebelião popular, que ficou conhecida como Revolta da Vacina, marcada por diversos distúrbios urbanos em várias regiões da cidade, embates com a polícia e prisões. Mais de 20 bondes da Companhia Carris Urbanos e muitos lampiões da iluminação pública foram destruídos, daí o apelido Quebra Lampiões atribuído ao movimento (Gazeta de Notícias, 14 de novembro de 1904; e Jornal do Brasil, 14 de novembro de 1904).

 

 

 

Paralelamente à revolta popular, aconteceu um movimento militar orquestrado pelos generais Silvestre Travassos (? – 1904) e Olímpio da Silveira (1887 – 1935), Lauro Sodré, Barbosa Lima, o major Gomes de Castro e o capitão Augusto Mendes de Moraes, que se reuniram no dia 14 de novembro de 1904, no Clube Militar. Tinham por objetivo derrubar o governo de Rodrigues Alves, que foi aconselhado a ir para um navio de guerra, onde teria mais segurança – ele recusou.

Houve no mesmo dia uma tentativa fracassada de levante na Escola de Tática do Realengo, sufocada pelo então diretor da instituição, general Hermes da Fonseca (1855 – 1923), futuro presidente do Brasil. O comandante da Escola Militar de Realengo, o general Alípio Costallat (c. 1853 – 1933), foi deposto pelo general Travassos que liderou, durante a noite, a marcha dos alunos em direção ao Palácio do Catete. Os revoltosos trocaram tiros com uma brigada de ataque enviada pelo governo, na rua da Passagem, em Botafogo. O tiroteio, de cerca de meia hora, matou um aluno da Escola Militar, Silvestre Cavalcanti, e um sargento da tropa legalista, chamado Camargo. O general Travassos ficou gravemente ferido e faleceu oito dias depois. A Escola Militar, bombardeada durante a noite por navios de guerra posicionados na baía de Guanabara, foi ocupada pelo ministro da Guerra, o marechal Francisco de Paula Argollo (1847 – 1930) e pelo ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas, Lauro Müller (1863 – 1926). Seus alunos foram presos, expulsos da Escola e levados para portos na região Sul do país. Obviamente, o desfile comemorativo dos 15 anos da Proclamação da República foi cancelado (Gazeta de Notícias, 15 de novembro de 1904Jornal do Brasil, 15 de novembro de 1904; Gazeta de Notícias, 16 de novembro de 1904; Jornal do Brasil, 16 de novembro de 1904).

No dia 16 de novembro, foi decretado o estado de sítio e revogada a obrigatoriedade da vacinação. Com isso, o movimento popular arrefeceu, os serviços voltaram a funcionar e a cidade se apazigou. Saldo do movimento: 945 prisões, 461 deportações, 110 feridos e 30 mortos (Gazeta de Notícias, 17 de novembro de 1904 e 18 de novembro de 1904).

 

 

Segundo o historiador Jaime Larry Benchimol: Todos saíram perdendo. Os revoltosos foram castigados pelo governo e pela varíola. A vacinação vinha crescendo e despencou, depois da tentativa de torná-la obrigatória. A ação do governo foi desastrada e desastrosa, porque interrompeu um movimento ascendente de adesão à vacina”.

Apenas nove pessoas morreram por varíola em 1906 no Rio de Janeiro. Porém, dois anos depois, em 1908, uma violenta epidemia da doença ocorreu na cidade, causando mais de 6.500 casos.

 

 

Link para músicas sobre Oswaldo Cruz e também sobre as campanhas de combate à febre amarela, à peste bubônica e à vacinação obrigatória contra a varíola, publicadas na Biblioteca Virtual Oswaldo Cruz

 

Retrospectiva das pandemias do século XX e XXI

 

O mundo, ao longo dos séculos XX e XXI, enfrentou cinco pandemias: a Gripe Espanhola, em 1918, tema de uma recente publicação da Brasiliana Fotográfica, E o ex e futuro presidente do Brasil morreu de gripe…a Gripe Espanhola de 1918; a Gripe Asiática, em 1957; a Gripe de Hong Kong, em 1968, a identificação de um novo vírus da influenza do tipo A pandêmico que desencadeou a Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional, decretada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2009; e cerca de 11 anos depois, em 11 de abril de 2020, a OMS declarou uma pandemia do novo coronavírus, chamado de Sars-Cov-2, causador da Covid-19, surgido na cidade de Wuhan, na China, em fins de 2019.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

 

BENCHIMOL, Jaime Larry. Pereira Passos: um Haussmann Tropical. A renovação urbana na cidade do Rio de Janeiro no início do século XX. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Departamento Geral de Documentação e Informação Cultural, 1992.

BENCHIMOL, Jaime Larry. Reforma urbana e Revolta da Vacina na cidade do Rio de Janeiro. In: Jorge Ferreira e Lucilia de Almeida Neves Delgado (org.) O Brasil Republicano. O tempo do liberalismo excludente. Da proclamação da República à Revolução de 1930. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.

BIBEL, David J.; CHEN, T.H. Diagnosis of Plague: an Analysis of the Yersin-Kitasato Controversy. American Society for Microbiology, 1976.

Biblioteca Virtual Oswaldo Cruz

BRASIL. Ministério da Justiça. Relatório 1904 – 1905. Imprensa Nacional, Rio de Janeiro, 1905.

CARVALHO, José Murilo de: Os Bestializados – O Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo : Companhia das Letras, 1987.

COSTA, Zouraide; ELKHOURY, Ana; FLANNERY, Brendan; ROMANO, Alessandro. Evolução histórica da vigilância epidemiológica e do controle da febre amarela no Brasil, 2011.

CURY, Bruno da Silva Mussa. Combatendo ratos, mosquitos e pessoas: Oswaldo Cruz e a saúde pública na reforma da capital do Brasil (1902-1904). / Bruno da Silva Mussa Curry. – 2012. 160 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Programa de Pós-graduação em História, Rio de Janeiro, 2012.

Dicionário Cravo Alvim

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

Ministério da Saúde

MOURELLE, Thiago. A revolta da vacina. Arquivo Nacional: Que República é essa?, 21 de janeiro de 2020.

Nosso Século. São Paulo : Abril Cultural, 1980.

Portal Fiocruz – A trajetória do médico dedicado à ciência

Portal Fiocruz  – A Revolta da Vacina

Projeto Memória – Fundação Banco do Brasil

ROCHA, Oswaldo; CARVALHO, Lia de Aquino. A era das demolições Habitações Populares. Rio de Janeiro : Biblioteca Carioca, 1986

SEVCENKO, Nicolau. A Revolta da Vacina: mentes insanas em corpos rebeldes. São Paulo: Cosac Naify, 2010.

Site CPDOC

Site Multirio

Último dia do verão

Para celebrar o último dia do verão no hemisfério sul, a Brasiliana Fotográfica selecionou duas belas imagens de crepúsculos, segundo o poeta Paulo Mendes Campos (1922 – 1991) o “momento coagulado entre dia e noite”. Ambas foram produzidas em torno de 1920. Uma em Niterói, realizada pelo fotógrafo Braz e a outra, na avenida Niemeyer, com a Pedra da Gávea ao fundo, no Rio de Janeiro, pela Photo Lopes, do fotógrafo e paisagista free-lancer Lopes. Pouco se sabe sobre Braz e Lopes, mas ambos tinham boa parte de sua produção fotográfica distribuída pela Papelaria Rio Branco, propriedade do também fotógrafo José dos Santos Affonso (18? – 1921), negócio que a partir de 1921 foi administrado pela viúva de Affonso.

Lopes também distribuia suas imagens pela casa Belas Artes. Em 1921, a Photo Lopes anunciou que era fabricante exclusiva da Casa Affonso e que acabava de substituir com vantagem a Photo Bippus que até então se dizia único no fabrico de vistas de noite (Jornal do Brasil, 5 de março de 1921, quinta coluna).

 

 

A Photo Lopes, em 1922, localizava-se na rua Itapiru, 173, casa 4, no bairro do Rio Comprido (Jornal do Brasil, 16 de junho de 1922, última coluna). Em 1928, foi publicada uma fotografia do Convento dos Capuchinhos, assinada pela Photo Lopes (Revista da Semana, 21 de janeiro de 1928).

 

 

O estilo do fotógrafo e paisagista Braz era muito semelhante aos de Carlos Bippus (18? – 19?) e Lopes, mas sua produção foi, pelo que se conhece até o momento, bem menos numerosa.

 

 

De acordo com o Observatório Nacional, o verão 2019/2020 começou na madrugada do dia 22 dezembro, à 1h19 (Horário de Brasília), quando ocorreu o solstício de verão no hemisfério sul. Terminou hoje, dia 20 de março de 2020, à 0h49 (Hora de Brasília), quando teve início o outono.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

ERMAKOFF, George. Rio de Janeiro 1900 – 1930 – Uma crônica fotográfica. Rio de Janeiro: G. Ermakoff Casa Editorial, 2003.

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

Observatório Nacional

 

Leia aqui Crepúsculo: “a hora esquerda e torta”, de Elvia Bezerra, publicado em 4 de junho de 2020 no site do Instituto Moreira Salles. Segundo a autora, “O tema do crepúsculo na obra de Paulo Mendes Campos merece estudo abrangente, dadas as fartas menções ao fenômeno, não só em versos, como na prosa autobiográfica desse cronista de superior refinamento“.*

 

* Foi incluído em 6 de junho de 2020.

 

 

A Gruta da Imprensa

A Brasiliana Fotográfica destaca uma imagem da Gruta da Imprensa, localizada na Niemeyer, uma das mais bonitas avenidas do Rio de Janeiro. O registro foi produzido por Augusto Malta ( 1864 – 1957), fotógrafo oficial da prefeitura do Rio de Janeiro, de 1903 a 1937, e pertence ao Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, uma das instituições parceiras do portal. A Gruta da Imprensa foi inaugurada pelo prefeito Carlos Sampaio (1861 – 1930), dias antes do início da viagem dos reis da Bélgica ao Brasil, em 1920, e sua denominação foi uma homenagem do prefeito à imprensa carioca (Correio da Manhã, 19 de setembro de 1920, na segunda coluna e O Globo, 10 de março de 1926, sob o título “Loucura que passou”).

“Em meio dessa avenida, a comitiva fez alto para inaugurar a “Gruta da Imprensa”, delicada homenagem do Sr. Prefeito. Trata-se de uma gigantesca laje, que da margem da avenida se aprofunda no oceano, deixando , por um capricho da natureza, larga abertura, formando gruta, de fácil acesso, onde o mar irrompe violento sem, contudo, oferecer perigo. Uma longa escadaria com balaustrada foi construída levando a gruta à entrada da qual o Sr. Carlos Sampaio fez colocar em cimento o dístico: – Gruta da Imprensa” (Jornal do Brasil, 18 de setembro de 1920, na quinta coluna).

Tornou-se, na época, um concorrido ponto turístico. Em 1926, foi cogitada a construção de um bar no local, mas os técnicos responsáveis pelas vistorias alegaram falta de segurança na região e alertaram para o iminente desaparecimento da Gruta, devido à “fácil deterioração pela ação da água” (O Globo, 10 de março de 1926, sob o título “Loucura que passou”). Contrariando as previsões de destruição, a Gruta da Imprensa continua lá, mas já não é uma área de lazer utilizada pelos cariocas. Sua presença foi de novo notada na ocasião do desabamento da Ciclovia Tim Maia, justamente na altura da Gruta da Imprensa, em 21 de abril de 2016, cerca de três meses após sua inauguração.

Durante as corridas de automóveis do Circuito da Gávea ou Trampolim do Diabo, concorrido acontecimento social e esportivo que acontecia no entorno do Morro Dois Irmãos e da Avenida Niemeyer, entre os anos 1933 e 1954, e chegava a reunir até 300 mil espectadores, alguns jornalistas esportivos acompanhavam as provas apoiados na mureta da gruta. Em 1935, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) foi presenteada pelo pintor Álvaro de Almeida com um quadro retratando a Gruta da Imprensa. Na ocasião, o gesto foi saudado pelo conselheiro da ABI, jornalista Carlos Maul: “É um quadro que tem para nós dupla valia: a de ser uma obra de beleza e a de fixar um dos mais formosos aspectos da paisagem carioca em que um governo da cidade perpetuou o nome da nossa classe. Esse quadro avivará em nosso espírito a memória do símbolo que ele exprime: a resistência heroica a todas as tempestades” (O Globo, 27 de abril de 2016).

Andrea C. T. Wanderley

Editora-assistente e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

 

A viagem dos reis da Bélgica ao Brasil sob as lentes de Guilherme Santos

Nesse segundo artigo sobre a viagem dos reis da Bélgica ao Brasil em 1920, a Brasiliana Fotográfica conta um pouco dessa história e disponibiliza para seu leitores fotografias do acontecimento produzidas pelo fotógrafo amador Guilherme Santos (1871 – 1966), guardadas no acervo do Instituto Moreira Salles. No primeiro artigosobre o assunto, “Viagens do encouraçado São Paulo conduzindo os reis belgas em visita oficial ao Brasil“, publicado no último dia 19, foram destacadas as imagens da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha, insitituição parceira do portal.

 

 

A visita do rei Alberto I da Bélgica (1875 – 1934) ao Brasil, entre 19 de setembro e 15 de outubro de 1920, foi a primeira realizada por uma monarca europeu à América do Sul (A Noite, 2 de junho de 1920). Ele veio acompanhado de sua esposa, a rainha Elisabeth (1876 – 1965), e o filho do casal, o príncipe Leopoldo (1901 – 1983), futuro rei Leopoldo III, juntou-se a eles no princípio de outubro. Durante sua estadia no país, o casal real foi sempre aclamado pela população e os jornais comumente referiam-se ao soberano como o “rei herói” ou o “rei soldado”, devido à sua atuação na Primeira Guerra Mundial (Jornal do Brasil, 8 de abril de 1920).

Em artigo assinado pelo jornalista e escritor Gilberto Amado (1887 – 1969) foi ressaltada a capacidade do “grande rei católico” de conciliar em sua pessoa “o espírito democrático do nosso tempo com as tradições da velha casa dinástica” e sua visita ao Brasil seria, então, “um extraordinário acontecimento que representa uma honra para o Brasil e uma glória para o governo que o propicia” e uma oportunidade para o povo brasileiro “aclamar uma das mais belas figuras morais do mundo moderno” (O Paiz, 14 de junho de 1920). Segundo o primeiro-ministro belga, Léon Delacroix (1867 – 1929), a viagem teria como consequência uma estreita aproximação comercial entre os dois países (O Paiz, 4 de setembro de 1920). De fato, um dos frutos da viagem foi a criação da Companhia Belgo Mineira, em 1921.

O convite formal para a viagem dos reis da Bélgica foi feito pelo delegado do Brasil na Conferência de Versalhes, em 1919, Epitácio Pessoa. Foi precedida por vários preparativos como a reforma do Palácio da Guanabara (O Paiz, 27 de abril de 1920), o restabelecimento da Ordem do Cruzeiro – criada por Dom Pedro I, em 1822, e extinta com a proclamação da República (Gazeta de Notícias, 15 de junho de 1920) – , e a criação de um protocolo para recebê-los. Vários eventos foram programados para recepcionar os reis, desde festas públicas a jantares protocolares e visitas a instituições como ao Jardim Botânico e ao Instituto Oswaldo Cruz. Os soberanos também foram a São Paulo e a Minas Gerais.

 

Acessando o link para as fotografias da viagem dos reis da Bélgica ao Brasil em 1920, de autoria de Guilherme Santos e disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Reveja as fotografias do encouraçado São Paulo e de outros aspectos da viagem dos reis da Bélgica ao Brasil em 1920, do acervo da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha publicadas no post do dia 19 de setembro, Viagens do Encouraçado São Paulo conduzindo os reis belgas em visita oficial ao Brasil.

 

Cronologia da viagem dos reis da Bélgica ao Brasil em 1920

 

 

19/09 – Chegada dos reis da Bélgica, Alberto I e Elisabeth, ao Rio de Janeiro, a bordo do encouraçado São Paulo. Desembarcaram no cais Mauá e a população os  recebeu de forma “apoteótica”. Seguiram com o presidente da República, Epitácio Pessoa (1865 – 1942), pela avenida Rio Branco, até o Palácio Guanabara, onde alunas do Instituto Nacional de Música e do Liceu Francês cantaram o hino da Bélgica, La Brabançonne. Na avenida Rio Branco, senhoritas da Cruz Vermelha venderam mais de 3500 edelweiss e 1500 laços com as cores da Bélgica em favor da Cruzada Nacional contra a Tuberculose. Às 18h, realização do círculo diplomático, quando os reis foram apresentados a vários embaixadores. O casal real chegou ao Palácio do Catete, às 17:35, para a visita protocolar ao presidente da República. Voltaram para o Palácio da Guanabara e, à noite, foram a um jantar íntimo no Palácio do Catete. Estavam presentes além dos reis, do presidente e da primeira-dama, a senhorita Laurita Pessoa e a condessa de Chimay (Correio da Manhã, 20 de setembro de 1920).

20/09 – Às 11h, no Palácio da Guanabara, os reis da Bélgica receberam os representantes do Congresso Nacional e outras autoridades. Às 15h, o rei Alberto I foi recebido no Palácio Monroe, para onde foi acompanhado pelo presidente da República. Foi saudado pelo presidente do Senado, Antonio Azeredo (1861 – 1936), e pelo presidente da Câmara, Bueno Brandão (1858 – 1931). Às 16h, seguiu então para o Supremo Tribunal Federal. Foi saudado pelo ministro André Cavalcanti (1834 – 1927). À noite, realização de um banquete para os reis no Palácio do Catete (O Paiz, 21 de setembro de 1920).

21/09 – Pela manhã, o rei Alberto I foi tomar um banho de mar em Copacabana. Depois deu uma volta de carro pelo Centro, pela Glória e por outros pontos da cidade. Visitou a igreja da Candelária. A rainha Elisabeth também foi tomar um banho de mar em Copacabana. À tarde, em companhia do presidente da República e da primeira-dama, o casal real foi visitar a Escola Nacional de Belas Artes e o Instituto Histórico e Geográfico (O Paiz, 22 de setembro de 1920).

 

 

22/09 - Pela manhã, em horários diferentes, o rei e a rainha voltaram a Copacabana onde tomaram um banho de mar. O rei, depois, passeou pelo bairro. À tarde, o rei Alberto I foi ao Segundo Regimento da Cavalaria, onde montou a cavalo. Depois, a rainha Elisabeth chegou em companhia de Epitácio Pessoa. Foi realizada uma parada militar, quando o rei passou em revista as tropas, tendo sido aclamado pela multidão que assistia ao cortejo. À noite, foram ao Corcovado (O Paiz, 23 de setembro de 1920).

23/09 – Às 11h, os reis receberam no prédio da legação da Bélgica, em Botafogo, os membros da colônia belga residentes no Rio de Janeiro. Foi oferecido um cheque de 50 mil francos para as obras de caridade da rainha. Dois pescadores portugueses ofereceram ao casal um cherne de cerca dede 80 quilos. Acompanhados pelo ministro da Bélgica, uma comissão dos presidentes das associações francesas do Rio de Janeiro visitaram a rainha e ofertaram um cheque de 25 mil francos para a Obra de Beneficência Belga. À tarde, o rei foi visitar o Colégio Militar em companhia de Epitácio Pessoa. Foram recebidos pelo ministro da Guerra. Os alunos jogaram pétalas de rosas no rei. Suas majestades visitaram o Pão de Açúcar, onde foi servido um chá.  À noite, no salão nobre do Club dos Diários, realização de uma solenidade promovida pelas associações científicas e literárias em homenagem aos reis. Foram saudados pelo barão Ramiz Galvão (1846 – 1938), presidente do Conselho Superior de Ensino e reitor da Universidade, após ouvirem a protofonia do “O Guarany”. O presidente do Instituto Histórico e Nacional, Afonso Celso (1860 – 1938), ofereceu a sua majestade o título de presidente honorário da mencionada instituição. O rei Alberto I condecorou o sr. Ramiz Galvão com a Ordem de Leopoldo II (O Paiz, 24 de setembro de 1920). A congregação dos professores da Academia de Comércio do Rio de Janeiro, por proposta de seu diretor, Cândido Mendes de Almeida (1866 – 1939), aclamou o rei Alberto I professor honoris causa da instituição (O Paiz, 26 de setembro de 1920).

24/09 – O rei começou o dia com o usual banho de mar em Copacabana. Depois, a bordo de uma lancha, passeou pela baía de Guanabara. A rainha ficou no Palácio da Guanabara lendo sua correspondência. O rei foi, ainda pela manhã, passear pela Floresta da Tijuca. Almoçou com sua comitiva no Hotel do Itamaraty. Uma curiosidade: o rei apreciou muito o bacalhau à brasileira, um dos pratos servidos, que chegou a repetir. Continuou então o passeio, escalou o Pico da Tijuca e ficou entusiasmado com a beleza da natureza. Chegou ao Palácio da Guanabara, às 18h. O major Mario Coutinho, intendente do palácio do governo, e vários oficiais do encouraçado São Paulo foram condecorados pelo rei Alberto I com o oficialato do rei Leopoldo II. Noticiou-se que as negociações para a reabertura da Câmara de Comércio Belgo Brasileira estavam intensificadas. Em Bruxelas, foi aceita a proposta para a criação da cátedra de português na Universidade da Bélgica. Nos cinemas da capital da Bélgica, foram projetados filmes sobre o Brasil (O Paiz, 25 de setembro de 1920).

25/09 – O rei começou o dia com o usual banho de mar em Copacabana. No meio da manhã, foi para o Derby Club, onde a colônia belga havia preparado uma recepção para o soberano. Às 14h, Alberto I foi com o presidente Epitácio Pessoa visitar o Instituto Oswaldo Cruz (Manguinhos). Foram recebidos pelo doutor Carlos Chagas (1878 – 1934) e seus assistentes. Às 17h, a rainha Elisabeth foi visitar o Museu Nacional, tendo sido recebida pelo professor Bruno Lobo (1884 – 1945), diretor da instituição, que a presentou com um livro contendo os arquivos do museu ”ricamente encadernado”. O ministro da Marinha, Raul Soares (1877 – 1924), foi convidado para o almoço que os reis ofereceram no dia 26 na legação da Bélgica. O casal real foi visitado, no Palácio da Guanabara, por Max Fleuiss (1868 – 1943), Carlos de Laet (1847 – 1927), Ramiz Galvão (1846 -1938) e por Fontoura Xavier (1856 – 1922), embaixador do Brasil em Londres. A imprensa belga elogiou o Brasil e os brasileiros pela acolhida a seus soberanos (O Paiz, 26 de setembro de 1920).

26/09 - Apesar da chuva, os soberanos iniciaram o dia com um banho de mar em Copacabana. O rei foi seguido pelas senhoritas Zoraida Cavalcanti e Angelina Cock. Em seu passeio até o Leme, foi presenteado por uma caixa de charutos pela baiana Alva Leoni, filha do deputado baiano Arlindo Leoni (1869 – 1936). Às 9 horas, o casal assistiu à missa solene realizada no Palácio São Joaquim pelo cardeal Arcoverde (1850 – 1930). Almoçaram no Palácio da Guanabara, onde foram visitados por Hilário de Gouveia (1843 – 1923), sr. e sra. Bento Oswaldo Cruz, e pelo senador Irineu Machado (1872 – 1942). Moradores da estação do Encantado mandaram uma carta para o diretor da Estrada de Ferro Central do Brasil pedindo que o nome da estação fosse mudado para Sua Majestade Elisabeth. Com a presença de Epitácio Pessoa e do casal real, realização no Derby Club de um páreo com o nome de Alberto I (O Paiz, 27 de setembro de 1920). Cerca de 35 mil pessoas compareceram ao estádio do Fluminense para participar da homenagem aos reis belgas. Segundo a imprensa: “foi uma apoteose sem igual!”. Cerca de 1500 jogadores de futebol, dos clubes da Liga Metropolitana, desfilaram para o casal real. Realizou-se uma partida de futebol entre os times da zona norte e da zona sul da Liga Metropolitana. A zona sul venceu por 3 a 0 (O Paiz, 27 de setembro de 1920).

27/09 – O soberano belga começou o dia com seu habitual banho de mar em Copacabana. Às 11:15, o rei recebeu no Palácio da Guanabara a imprensa brasileira. Saudou os jornalistas e Raul Pederneiras (1874 – 1953), presidente da Associação de Imprensa, apresentou a ele cada diretor de jornal presente à cerimônia. Na sede da legação da Bélgica, na praia de Botafogo, o rei Alberto ofereceu um almoço ao presidente da República, Epitácio Pessoa. Depois foram juntos, acompanhados pelo prefeito do Rio, Carlos Sampaio (1861 – 1930), e por outras autoridades dar um longo passeio pela Tijuca. Voltaram pela Gávea e o rei inaugurou oficialmente a avenida Niemeyer. A rainha Elisabeth visitou o Instituto Oswaldo Cruz (Manguinhos). À noite, jantaram no Palácio da Guanabara (O Paiz, 28 de setembro de 1920). Abaixo, uma fotografia da Avenida Niemeyer, dias antes de sua inauguração.

 

 

28/09 –  Os reis belgas e a comitiva real foram para Teresópolis em companhia de Epitácio Pessoa e outras autoridades. Seguiram no vapor Presidente até a estação Piedade, onde passaram para um trem especial da Estrada de Ferro Teresópolis. O casal real ficou hospedado no palacete do sr. Sloper. Almoçaram no bosque da Caixa d´Água e depois visitaram o salto do Imbuhy e o bosque da residência do comendador Gonçalo de Castro. Jantaram na Villa Sloper  e foram saudados com um show de fogos de artifício (O Paiz, 29 de setembro de 1920).

29/09 – O grupo partiu pela manhã para Petrópolis, onde hospedou-se na residência da sra. Franklin Sampaio. Almoçaram no Palácio da Prefeitura e depois visitaram o Colégio São Vicente de Paula. Chegaram ao Arsenal de Marinha, no Rio de Janeiro, depois das 20h (O Paiz, 30 de setembro de 1920).

30/09 –  Após trocar de roupa no palacete Mackenzie, o rei Alberto tomou seu habitual banho de mar em Copacabana. A rainha Elisabeth foi visitar o Jardim Botânico e o rei Alberto foi ao reservatório do Trapicheiro, na Fábrica das Chitas. Também percorreu a Floresta do Andaraí. O casal real almoçou no Palácio da Guanabara. O rei Alberto recebeu em audiência especial brasileiros que haviam cursado universidades belgas. À tarde, o soberano visitou o Jardim Botânico, onde a pedido do diretor da instituição, Pacheco Leão, plantou uma árvore. A rainha Elisabeth recebeu um donativo das senhoras da Cruz Vermelha. O governo brasileiro ofereceu ao soberanos uma garden party nos jardins do Palácio do Catete, a partir das 16:30. Foram apresentados vários bailados executados pela companhia Bonetti. Os soberanos se retiraram às 19h. Foram ao Teatro Municipal onde foi realizado um concerto de gala em homenagem ao casal, sob a regência dos maestros Francisco Braga (1868 – 1945), Elpidio Pereira (1872 – 1961), Octaviano Gonçalves (1892 – 1962) e de Villa-Lobos (1887 – 1959). Depois do espetáculo, o rei foi passear na Tijuca, subindo pela Gávea, de onde retornou por volta das duas horas da madrugada (O Paiz, 1º de outubro de 1920).

01/10 – Para “encanto” da população, os reis belgas percorreram ruas do centro do Rio de Janeiro. Após o almoço, o soberano visitou a brigada policial. A rainha Elisabeth voltou ao Jardim Botânico. A congregação da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro decidiu dar o título de doutor honoris causa para o rei Alberto da Bélgica. Às 19:10, o casal real embarcou para Belo Horizonte, em Minas Gerais. O comboio real partiu da Estação Central do Brasil. Como de hábito, a comitiva real foi aclamada pela população. O filho dos reis belgas, o príncipe Leopoldo (1901 – 1983), futuro Leopoldo III, rei da Bélgica, chegou no Recife, a bordo do transatlântico belga Pays de Waes (O Paiz, 2 de outubro de 1920).

02/10 –  A chegada dos soberanos a Belo Horizonte foi marcada pela aclamação popular. Epitácio Pessoa, outras autoridades e a comitiva real também foram para a capital mineira. Recebidos por Artur Bernardes (1875 1955), governador de Minas Gerais, ficaram hospedados no Palácio da Liberdade, para onde foram após o cortejo pela cidade. Almoçaram no palácio e depois visitaram Artur Bernardes. Receberam diversas autoridades e depois, em companhia de Epitácio Pessoa e sua mulher, foram visitar o Conselho Deliberativo e o Tribunal da Relação. Na Praça da Liberdade, alunos de escolas públicas cantaram o hino belga. Foi noticiado que o rei havia recebido o título de “Cidadão Carioca” (O Paiz, 3 de outubro de 1920).

Link para imagens da visita do Rei Alberto I a Belo Horizonte.

03/10 -   Às 9:00, o rei Alberto, acompanhado por Epitácio Pessoa e Artur Bernardes , visitou o quartel da força pública de Belo Horizonte. Às 10:30, em companhia da rainha Elisabeth, assistiu à missa no Colégio de Santa Maria das Irmãs Dominicanas, celebrada pelo abade Nols.  Almoçaram no palacete Afonso Penna. Os reis visitaram a Lagoa Santa. A Assembleia Legislativa do estado de Mato Grosso fez uma sessão em homenagem aos reis. O príncipe Leopoldo desembarcou em Salvador, onde foi recebido pelo cônsul belga e por representantes do governador da Bahia. Às 13:30, o transatlântico zarpou com destino ao Rio de Janeiro (O Paiz, 4 de outubro de 1920).

04/10 - Às 8 horas, o grupo seguiu para São Paulo de trem. No caminho, visitou a mineração de ouro em Morro Velho, em Vila Nova de Lima. Foram recebidos na residência do superintendente da companhia, Dr. Chalmers, onde foi servido um café da manhã e, mais tarde, um almoço. Às 16h, seguiram para Raposos, onde se despediram do governador de Minas e de outras autoridades do governo mineiro (O Paiz, 5 de outubro de 1920).

05/10 - O comboio real chegou em Rezende, às 10:40, e foi recebido pelo prefeito da cidade, o Dr. Cotrim Filho. Chegou na Estação da Luz, em São Paulo, às 19:20h, onde foi recebido pelo governador do estado, Washington Luís (1869 – 1957), e por outras autoridades, em meio a uma grande aclamação popular. Foram executados os hinos do Brasil e da Bélgica e os soberanos seguiram em um cortejo até a Chácara do Carvalho, onde ficaram hospedados. Na entrada da chácara estava escrito: Gloire a vous Albert Premier, vainqueur de la bataille de Flandres, personification de l´honneur devant les générations. Foram recebidos pelo prefeito de São Paulo, Firmiano de Moraes Pinto (1861 – 1938). O presidente da República ficou hospedado no palacete Martinho Prado. No Tribunal do Juri, houve uma manifestação de “regojizo” pela visita dos soberanos a São Paulo. Chegada, às 20h, do príncipe Leopoldo ao Rio de Janeiro. Foi conduzido ao Palácio da Guanabara, onde ficou hospedado (O Paiz, 6 de outubro de 1920).

06/10 -  Às 9h, no Palácio dos Campos Elísios, o rei Alberto visitou Washington Luís, a quem entregou o cordão da Ordem de Leopoldo II. Às 10h, os soberanos assistiram, na avenida Tiradentes, a uma parada e desfile da força pública. Visitaram a escola de educação física da força pública, onde foram saudados por uma pirâmide humana. À tarde, o rei foi visitar o Palácio das Indústrias e percorreu vários pontos da cidade (O Paiz, 7 de outubro de 1920). O príncipe Leopoldo visitou o Corcovado, o Pão de Açúcar e a Tijuca. Foi visitado pelo senador Antonio Azeredo e pelos senhores Honório e Álvaro Guimarães, com quem havia estudado na Inglaterra. Recebeu também diversos embaixadores e ministros (Gazeta de Notícias, 7 de outubro de 1920).

07/10 - O príncipe Leopoldo chegou a São Paulo com sua comitiva. Os reis belgas, o presidente da República, e membros de suas comitiva visitaram o Instituto Butantan. Voltaram para a Chácara do Carvalho onde receberam ex-alunos da Universidades de Liège, membros das colônias francesa e belga da capital e de Santos, além de uma comissão da imprensa. Os soberanos foram muito presenteados e a rainha Elisabeth determinou que todas as flores que ela havia recebido fossem distribuídas pelos hospitais de São Paulo. À tarde, visitaram em companhia de Washington Luís, sua esposa e do príncipe Leopoldo, a Escola Normal, onde assistiram a um espetáculo musical e à uma demonstração de ginástica calistênica. Foram calorosamente saudados pelas alunas. Os soberanos se retiraram às 16:30 e voltaram para a Chácara do Carvalho. Às 19:30, partiram da Estação da Luz para a fazenda Guatapará. O comboio passou por Campinas e os soberanos jantaram em Rio Claro (O Paiz, 8 de outubro de 1920).

08 e 09/10 - Visita à Fazenda Guaratapá (O Paiz, 9 de outubro de 1920 e 10 de outubro de 1920).

10/10 – O rei Alberto iniciou o dia fazendo exercícios na piscina. Após o café da manhã, percorreu a propriedade em companhia do dr. Alves de Lima, diretor presidente da Companhia da Fazenda Guaratapá. No almoço só foram servidos pratos brasileiros. À tarde foi com Alves de Lima a Ribeirão Preto, onde assistiu a um jogo de futebol entre o Palestra e um clube local. Retornou por volta das 18h. A rainha Elisabeth e o príncipe Leopoldo , com a condessa Caraman Chimay e com o dr. Adolpho Lutz, fizeram um passeio de canoa pelo rio Mogi-Guaçu, onde pescaram e caçaram borboletas. Dois cinegrafistas da comitiva do rei fizeram um voo com o piloto Edu Chaves (O Paiz, 11 de outubro de 1920).

11/10 - O casal real, o príncipe Leopoldo e a comitiva voltaram a São Paulo. Chegaram na Estação da Luz por volta das 17:30 e seguiram para a Chácara do Carvalho. A Rainha Elisabeth foi então percorrer a avenida Paulista. De volta à chácara, ela, seu marido e seu filho passearam pelos jardins até a hora do jantar (O Paiz, 12 de outubro de 1920).

12/10 - O casal real, o príncipe Leopoldo e a comitiva visitaram a cidade de Santos, onde chegaram por volta das 12:10h. Seguiram em cortejo pela cidade, onde foram aclamados, e seguiram para o Parque Balneário, onde foi servido um banquete. À noite, partiram de São Paulo de volta ao Rio de Janeiro (O Paiz, 13 de outubro de 1920).

13/10 - Já no estado do Rio, na cidade de Pinheiros, os soberanos visitaram o Patronato de Menores e o Posto Zootécnico do governo federal. Chegaram ao Rio de Janeiro por volta das 16:30. Seguiram em cortejo para o Palácio da Guanabara. O casal foi nadar na praia de Copacabana, da onde retornaram por volta das 18:30 (O Paiz, 14 de outubro de 1920).

14/10 – Os reis foram ao Palácio do Catete, às 14h, de onde seguiram com o presidente da República e sua mulher para a Quinta da Boa Vista, onde assistiram à festa das crianças. Como lembrança da viagem ao Brasil, os reis belgas ofereceram ao presidente Epitácio Pessoa uma coleção de pratos de porcelana de Bruxelas com pinturas das principais cidades da Bélgica. À esposa de Epitácio Pessoa ofereceram um relógio pulseira e às filhas do casal pendentifs de platina e pedras preciosas. O presidente assinou um decreto dando cidadania brasileira ao rei Alberto e o tornando marechal do Exército nacional. Além disso, o decreto previa a construção de um monumento em homenagem à viagem dos belgas ao Brasil (O Paiz, 15 de outubro de 1920).

15/10 - Às 12h, o senador Rui Barbosa (1849 – 1923) chegou ao Palácio da Guanabara, onde almoçou com os soberanos belgas. À tarde, o rei visitou com o prefeito Carlos Sampaio o Campo de Santana. Foi presenteado com vários exemplares de palmeiras. Por ordem do presidente Epitácio Pessoa a legação da Bélgica foi elevada à categoria de embaixada. Os soberanos belgas receberam diversos presentes, dentre eles uma “rica e luxuosa encadernação de um volume da Constituição Brasileira e outra do Código Civil Brasileiro, acondicionada em uma bela caixa de veludo verde escuro guarnecida de ouro, tendo gravada na tampa as armas da República”, ofertada pelo diretor da Imprensa Nacional, sr. Castelo Branco. O casal presidencial jantou no Palácio da Guanabara com os reis belgas. Foi realizada na baía da praia de Botafogo a festa veneziana organizada pelo Conselho Municipal em homenagem aos reis da Bélgica, que compareceram com o príncipe Leopoldo e com Epitácio Pessoa e sua esposa. A festa teve a apresentação de um préstito de embarcações das sociedades de regatas associadas à Federação Brasileira das Sociedades de Remo, a execução de diversas músicas e fogos de artifício. A população lotou toda a enseada de Botafogo. Quando a festa terminou, os soberanos passearam pela enseada a bordo da lancha Internacional e se retiraram (O Paiz, 16 de outubro de 1920).

16/10 –  Às 10:30, o presidente Epitácio Pessoa e sua esposa, acompanhados de outras autoridades, chegaram ao Palácio da Guanabara, onde foram recebidos pelo casal real. Meia hora depois, o cortejo real partiu para a praça Mauá, passando pela rua Paissandu, e pelas avenidas Beira-Mar e Rio Branco. Foram aclamados por todo o trajeto, que contava com tropas de terra e de mar, sob o comando do general Luiz Barbedo. No cais Mauá, foram recebidos por várias autoridades. Embarcaram com o príncipe Leopoldo, com Epitácio Pessoa e sua esposa, e com mais algumas autoridades e membros de sua comitiva no galeão Dom João VI em direção ao encouraçado São Paulo. Demais membros da comitiva embarcaram na lancha Olga. Os soberanos foram recebidos no São Paulo pelo comandante Gomensoro e por toda a oficialidade. Foram para o salão de honra do navio, onde houve os últimos cumprimentos e a despedida. Às 14h, o encouraçado teve suas âncoras suspensas e iniciou a viagem de volta dos reis belgas (O Paiz, 17 de outubro de 1920).

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora-assistente e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

Para a elaboração dessa cronologia, a Brasiliana Fotográfica consultou diversos periódicos da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.